Chamada contra o aquecimento

A concentração de dióxido de carbono na atmosfera terrestre alcançou valores recordes em 2013, segundo relatório recente da Organização Meteorológica Mundial. O aumento de emissões de gases-estufa ameaça o cumprimento da meta da Organização das Nações Unidas (ONU) de conter o aquecimento global em pelo menos 2 ºC até 2100. Nesse cenário, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, convocou os países-membros da entidade, o setor privado e a sociedade civil a participar da Cúpula do Clima em Nova Iorque (EUA) no dia 23 de setembro.

O evento não faz parte do processo de negociação da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas, mas é uma tentativa de engajar os líderes mundiais na agenda do clima. A proposta é que o encontro seja um espaço para “trocar experiências e catalisar ações.”

A expectativa da ONU é que os governantes façam anúncios de medidas concretas para reduzir emissões e se mobilizem politicamente para assegurar um acordo climático em 2015, na próxima Conferência do Clima

A expectativa da ONU é que os governantes façam anúncios de medidas concretas para reduzir emissões e se mobilizem politicamente para assegurar um acordo climático em 2015, na próxima Conferência do Clima, em Paris. Desde a assinatura do não cumprido Protocolo de Quioto, em 1997, o mundo espera por um novo pacto global.

A Cúpula do Clima será a primeira ocasião, depois da conferência de Copenhague, em 2009, em que tantos líderes mundiais se reunirão para discutir a questão. Até o momento, foram confirmadas as presenças de 150 chefes de Estado, entre eles, Barack Obama, presidente dos Estados Unidos – segundo maior emissor de gases-estufa do planeta, atrás apenas da China.

Na pauta da reunião está a discussão sobre temas como energia sustentável, poluição atmosférica, cidades e transportes, desmatamento de florestas, agricultura e financiamento climático. O encontro vai durar apenas um dia, ao final do qual será lançado um documento com o resumo do que foi debatido, proposições de medidas e compromissos firmados. 

Pressão popular

Se seguir o padrão dos últimos encontros sobre clima da ONU, a Cúpula corre o risco de ficar apenas na retórica. Mas há os que acreditam que esse evento será diferente e poderá gerar bons frutos. A especialista em políticas climáticas Penny Davies, da Fundação Ford, aposta no diálogo entre o setor privado e a sociedade civil.

“Esse encontro vai ser muito diferente dos encontros tradicionais sobre clima, ele não será sobre negociações entre governos apenas”, diz. “A ONU está vendo que a solução está nas mãos de cidadãos e companhias privadas e, se houver uma chamada desses setores, os governos vão realizar mais ações.”

Durante a semana da Cúpula, a cidade de Nova Iorque vai receber diversos eventos paralelos relacionados ao clima. Haverá, por exemplo, conferências unindo empresas e indígenas para discutir o direito à terra e segurança climática. No próximo domingo (21/09), antes do evento da ONU, está programada ainda a Marcha do Povo pelo Clima, um protesto que pretende reunir milhares de pessoas para pressionar por ações nessa área.

Marcha pelo clima
Milhares de pessoas são esperadas em uma marcha pelo clima nas ruas de Manhattan, em Nova Iorque, no próximo domingo. (foto: Steve Rhodes/ Flickr – CC BY-NC-ND 2.0)

Comprometimento político

O especialista em manejo florestal Bruce Cabarle, diretor-emérito da ONG Forest Trends, não espera ver muita ação por parte dos governos, mas acredita que a existência do espaço para discutir a questão climática já seja um avanço. “Nesses eventos políticos, o que esperamos é comprometimento, as ações só acontecem com o comprometimento”, diz. “Quanto mais declarações políticas concretas conseguirmos, mais ações veremos. A sociedade só responde com ações se há declarações políticas fortes.”

Estudioso do desmatamento no Brasil, o cartógrafo Britaldo Soares Filho, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), deseja ver apoio financeiro ao país para deter o desflorestamento, uma das principais origens de emissões de gases-estufa no nosso território. “É preciso interesse internacional para dar apoio ao Brasil, sobretudo pela dimensão continental do país e seu patrimônio ambiental”, avalia.

Governos e empresas já sinalizaram a intenção de lançar fundos e acordos para capitalizar as ações de combate ao aquecimento global

O desejo do pesquisador é de provável concretização. Governos e empresas já sinalizaram a intenção de lançar fundos e acordos para capitalizar as ações de combate ao aquecimento global. Empresas também devem fazer anúncios de novas parcerias nesse sentido.

Ainda assim, Soares Filho ressalta a necessidade do comprometimento dos governos. “Com certeza o evento trará algum avanço, mas os passos são muito lentos e não terão força se os grandes países não priorizarem essa agenda”, diz. “Tanto a China quanto os Estados Unidos não querem limitar suas emissões e estamos à deriva no aquecimento global.”

O presidente da China declinou participação na Cúpula, mas vai enviar em seu lugar o vice-premier Zhang Gaoli. A Índia, que faz companhia à China e aos Estados Unidos na lista dos maiores poluidores atmosféricos do planeta, também não vai participar do evento.

A presidente Dilma Rousseff ainda não confirmou se vai ou não participar da Cúpula. Rousseff também é esperada na 69ª Reunião da Assembleia Geral da ONU, que acontece um dia depois do encontro do clima também na sede da organização, em Nova Iorque. A próxima semana promete grande movimentação política, pois a ONU vai receber ainda a Conferência Mundial dos Povos Indígenas, que deve reunir cerca de 9 mil indígenas de todo o mundo reivindicando direitos.

A Ciência Hoje On-line estará por lá para trazer ao leitor as novidades sobre o tema.

Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line