Por uma ciência mais igualitária

Variações genéticas em nativos americanos. Códigos para resolver falhas na transmissão de informação por sistemas de comunicação. Formações de galáxias. As vencedoras da décima edição do prêmio nacional “Para Mulheres na Ciência”, anunciadas nesta segunda-feira (10/08), têm estudos bem diferentes e uma característica em comum: representam uma geração de talentos que lutam por igualdade de condições entre homens e mulheres na ciência brasileira.

Oferecido pela L’Oréal Brasil em parceria com a Unesco Brasil e com a Academia Brasileira de Ciências (ABC), o prêmio teve mais de 400 projetos inscritos em 2015. As sete ganhadoras receberão US$ 20 mil (convertidos em reais) como incentivo para seguir com seus estudos.

Premiada por um projeto que utiliza a matemática pura para estudar códigos corretores de erros, fundamentais na solução de falhas na transmissão de informação por sistemas de comunicação, como linhas telefônicas, Cecília Salgado diz que a conquista vai além da questão financeira. “Esse tipo de iniciativa é importante para dar visibilidade a pesquisas feitas por mulheres e mostrar que a mulher não tem uma forma diferente de fazer ciência. Muitas vezes o que falta é o estímulo – quase todos os grandes nomes da ciência são homens”, ressalta a matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que torce para que outros pesquisadores se interessem pelo seu campo de estudos a partir de agora.

Cecília Salgado, matemática da UFRJ
Cecília Salgado foi selecionada por sua pesquisa na área de ciências matemáticas. Ela estuda códigos corretores de erros, usados para resolver falhas em sistemas de comunidação. (foto: Acervo pessoal / Cecília Salgado)

Para Elisa Orth, do Departamento de Química da Universidade Federal do Paraná, o prêmio pode ser justamente um incentivo para que jovens do ensino médio e superior desejem se tornar cientistas, como ocorreu com ela mesma durante a graduação. “As mulheres vêm conquistando muito espaço e têm assumido cargos importantes na ciência brasileira. Prêmios como esse vão atrair cada vez mais mulheres para a pesquisa”, acredita a laureada, que trabalha com pesquisas no desenvolvimento de novos catalisadores que acelerem diversas classes de reações químicas, como enzimas artificiais que poderiam ser usadas para resolver problemas genéticos — relacionados a doenças como câncer, fibrose, mal de Parkinson, mal de Alzheimer, entre outras. Outro interesse de aplicação é destruir substâncias químicas nocivas à saúde humana, presentes em muitos agrotóxicos ainda utilizados no Brasil.

Segundo levantamento do chefe de gabinete da ABC, Fernando Veríssimo, as mulheres representam atualmente 13% dos membros da instituição. O número, pequeno, já foi muito menor: em 2005, primeiro ano do “Para mulheres na ciência”, elas eram apenas 8% do total. “Já houve melhora, mas esse contingente ainda é baixo. Podemos fazer mais que isso, temos mais mulheres que merecem ocupar esse lugar”, afirma Jacob Palis, presidente da ABC.

Se a lentidão das mudanças nos últimos dez anos ainda mostra que há muito a avançar, Orth argumenta que as novas gerações estão dispostas a provar que são capazes de mudar este quadro. “Eu acredito que esse número irá aumentar cada vez mais, visto que temos uma geração de muitas mulheres cientistas extremamente competentes. Claro que enfrentamos alguns preconceitos, mas só nós podemos provar o contrário: fazendo ciência de qualidade com ética e dedicação”, ressalta.

Conheça as vencedoras

Alline Campos, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, foi premiada por pesquisas sobre medicamentos mais efetivos e com menos efeitos adversos para tratar pacientes que sofrem de ansiedade e depressão.

Daiana Ávila, da Universidade Federal do Pampa, no interior do Rio Grande do Sul, foi reconhecida por liderar um estudo sobre uma nova terapia para a Esclerose Lateral Amiotrófica, doença genética, degenerativa e sem cura.

Elisa Brietzke, do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, estuda o envelhecimento precoce de pacientes bipolares para desenvolver e testar medicamentos capazes de bloquear o avanço da doença.

Tábita Hunemeier, do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, investiga as bases genéticas de características morfológicas dos nativos americanos (indígenas) para tentar encontrar variações que os diferenciam fisicamente das populações de outros continentes.

Cecília Salgado, pesquisadora de ciências matemáticas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, estuda códigos corretores de erros, fundamentais para consertar de falhas na transmissão de informação por sistemas de comunicação.

Elisa Orth, do Departamento de Química da Universidade Federal do Paraná, estuda como resolver problemas genéticos — relacionados a doenças como câncer, Parkinson e Alzheimer, entre outras — e destruir substâncias químicas nocivas à saúde, presentes em agrotóxicos ainda utilizados no Brasil.

Karin Menéndez–Delmestre, do Observatório do Valongo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, analisa a formação e a evolução das galáxias por meio de observações da Via Láctea e de universos distantes.

Atualização (12/08/2015)
A pedido de Elisa Orth, este texto foi atualizado para retificar o escopo de seu trabalho, descrito no quarto parágrafo: “(…) acredita a laureada, que trabalha com pesquisas no desenvolvimento de novos catalisadores que acelerem diversas classes de reações químicas, como enzimas artificiais que poderiam ser usadas para resolver problemas genéticos — relacionados a doenças como câncer, fibrose, mal de Parkinson, mal de Alzheimer, entre outras. Outro interesse de aplicação é destruir substâncias químicas nocivas à saúde humana, presentes em muitos agrotóxicos ainda utilizados no Brasil”.

Simone Evangelista
Especial para CH On-line