Será que vai chover?

Meteorologistas são capazes de predizer as chuvas com uma confiabilidade razoável: os índices de acerto costumam girar em torno dos 70%. Mas isso não acontece em todas as regiões do país, pois há áreas em que a coleta de dados atmosféricos deixa a desejar. Essa deficiência nas previsões climáticas é um dos principais fatores associados ao desperdício de recursos hídricos pela agricultura no Brasil.

“As previsões são bastante precisas e feitas a cada seis horas; elas são confiáveis para os próximos três dias, mas, para além disso, mesmo quando feitas com os equipamentos mais sofisticados, o nível de acurácia decai bastante”, avisa o climatologista José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

É possível estimar onde choverá, mas é bem mais difícil estimar exatamente quanto vai chover. Mais difícil ainda é acertar previsões atmosféricas em áreas onde as estações meteorológicas não são muito bem distribuídas. “Isso reduz a capacidade de avaliação dos modelos meteorológicos”, explica Marengo.

É difícil acertar previsões atmosféricas em áreas onde as estações meteorológicas não são muito bem distribuídas

É exatamente o caso da região Centro-oeste do Brasil e da porção meridional da Amazônia. “Reconhecemos que, nessas duas regiões, a densidade de estações meteorológicas está aquém do necessário”, diz o diretor do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Antonio Divino Moura.

Há tempos os climatologistas e meteorologistas protestam por uma melhor distribuição de estações meteorológicas nessas regiões do país. O problema é que resolver tal questão não é tarefa das mais triviais.

Moura explica que não basta adquirir e instalar novos equipamentos – que são caros. Manutenção, correção de falhas em tempo hábil, continuidade de operação, segurança do patrimônio, estabelecimento de acordos técnicos de cooperação e parcerias para garantir o bom funcionamento da infraestrutura são algumas das dificuldades elencadas pelo diretor do Inmet para aprimorar a rede de monitoramento meteorológico no interior do Brasil.

Na maioria desses locais – entre fazendas que se perdem no horizonte e florestas densas de caminhos impenetráveis – é difícil manter uma logística confiável que possa garantir, satisfatoriamente, a operação de estações de coleta de dados atmosféricos.

“Vale lembrar, no entanto, que temos avançado muito desde 2007”, pondera Moura. Aproveitando a deixa, ele adianta uma boa notícia: a rede nacional deverá em breve ser adensada com a recente aquisição, por parte do Inmet, de mais 120 estações meteorológicas a serem distribuídas pelo território nacional – incluindo a região Centro-oeste.

Esperam-se, assim, melhoras para a meteorologia na região. “Mas ainda buscamos cooperação com o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, entre outros parceiros que tenham condições de garantir a segurança física das instalações, evitando-se roubos e vandalismos, que são tão frequentes”, diz Moura.

Estação meteorológica
Estação meteorológica em Porto Alegre (RS). Tais estações são equipadas com diversos tipos de sensores, que medem variáveis como temperatura local, umidade relativa do ar, velocidade dos ventos, nível de radiação solar, entre diversos outros fatores que podem ser decisivos para o bom desempenho da agricultura. (foto: Inmet)

Dados meteorológicos precisos em áreas rurais são particularmente importantes para o bom desempenho da agricultura. Munidos de informações acuradas acerca dos eventos atmosféricos iminentes, produtores podem controlar com mais racionalidade a quantidade de água que usarão em suas plantações.

Segundo Marengo, a meteorologia é fundamental não apenas por estar relacionada à segurança hídrica. Mas também por estar diretamente associada à segurança alimentar e energética do país.

Dados unificados: a utopia

Há uma pedra no sapato da comunidade científica. Por incrível que pareça, até hoje não existe no Brasil um banco de dados unificado que reúna informações de todas as centenas de estações meteorológicas espalhadas pelo país.

Até hoje não existe no Brasil um banco de dados unificado que reúna informações de todas as centenas de estações meteorológicas espalhadas pelo país

Explica-se: o Inmet tem sua própria rede; demais instituições, como universidades e centros de pesquisa, também mantêm as suas; e os próprios estados, da mesma forma, administram estações meteorológicas instaladas em seus territórios. Mas tudo isso é descentralizado. E o resultado é uma rede fragmentada de dados meteorológicos – o que é um problema e tanto para pesquisadores que queiram empreender estudos mais sofisticados sobre as condições atmosféricas reinantes no país.

“Essa unificação dos bancos de dados sempre foi uma demanda dos cientistas e pesquisadores que atuam na área”, afirma Marengo. Moura comenta: “De fato, a integração dessas redes otimizaria o sistema e reduziria custos; nossos esforços de coordenação interinstitucional, infelizmente, ainda não produziram efeitos.”

Este é o segundo texto da série especial ‘Terra e água’, publicada esta semana na CH On-line.

Henrique Kugler
Ciência Hoje On-line