Imagine que você, leitor, está participando do famoso jogo de auditório conhecido como Monty Hall. Nele, você deve escolher uma de três portas. Atrás de uma delas, há um prêmio especial – por exemplo, um carro, um aparelho de DVD ou, melhor ainda, uma assinatura da Ciência Hoje . Nas outras duas, nada. Primeiramente, você escolhe uma porta, que permanece fechada. Em seguida, o apresentador abre uma das duas outras – importante: ele sabe onde está o prêmio e sempre abre uma porta que não tem nada atrás. Nesse momento, o cenário é o seguinte: uma porta aberta (pelo apresentador) e duas fechadas (a de sua escolha e a outra). E, agora, vem a parte decisiva e emocionante: o apresentador pergunta para você “Quer ficar com a que você escolheu ou quer mudar de porta?”
 
O que fazer diante desse dilema? Trocar ou não trocar? Para tomar a melhor decisão, você olha para baixo, murmura algumas palavras para si mesmo, enquanto faz um rápido raciocínio matemático: “Bem, ele abriu uma porta não premiada. Assim, a assinatura da Ciência Hoje tem que estar atrás da minha porta ou daquela outra, também fechada. Quer dizer, ou aqui, ou ali. Então, que diferença faz mudar? Humm… a probabilidade de estar aqui ou ali é 50% para cada lado. Portanto, não faz diferença mudar!”
 
Muito bem. Raciocínio impecável. E, com base nele, você decide não trocar. Só um problema: o raciocínio está errado! Nesse jogo, a melhor coisa a fazer é trocar de porta. Surpreso? Não se preocupe. O Monty Hall, apesar de simples, deixou muita gente de cabelo em pé – até matemáticos profissionais! Vejamos por que a troca é a melhor opção.
 
O problema que você tem que resolver é de cálculo de probabilidades. A idéia básica do cálculo de uma probabilidade é simples: é a razão do número de resultados ‘desejados’ pelo número de resultados ‘possíveis’. Por exemplo, qual a probabilidade de obtermos ‘cara’ em um lance de moeda? Apliquemos a regra para o cálculo de probabilidades: o número de resultados desejados é um (cara), e o número de resultados possíveis é dois (cara e coroa). Assim, a probabilidade de tirar cara é 1/2 (ou 50%) Simples, não?
 
Um exemplo mais elaborado: qual a probabilidade de tirarmos um número par ao jogarmos um dado comum? Nesse caso, o número de resultados desejados são três: 2, 4 ou 6. E o número de resultados possíveis são seis: 1, 2, 3, 4, 5 ou 6. Conclusão: a probabilidade de tirarmos um número par é 3/6, que é igual a 1/2 (ou 50%). Ultimo exemplo: qual a probabilidade de tirarmos um múltiplo de 3 ao jogarmos um dado? Possibilidades vencedoras: 3 ou 6. Total de possibilidades: seis, como no exemplo anterior. Portanto, a probabilidade é 2/6, que é igual a 1/3 (ou cerca de 33%).
 
Agora, voltemos ao problema inicial. O que há de errado no raciocínio que, parágrafos acima, atribuímos – sem sua autorização – a você, leitor?
 
O erro foi termos usado probabilidades simples. Para analisar o problema corretamente, deveríamos ter aplicado a noção de probabilidade condicional, que é um cálculo de probabilidades no qual se usa a informação precedente. Vejamos como isso influencia no jogo. Sua escolha inicial é arbitrária. Se, em seguida, o apresentador resolvesse abrir as três portas, suas chances de ganhar o prêmio seriam de 1/3, ou seja, um resultado desejado (prêmio) e três possíveis (número de portas). Pura probabilidade simples.
 
Mas o jogo não é assim. Em vez de abrir as três portas, o apresentador abre apenas uma (não premiada). E essa informação deve ser levada em conta. Quando você escolhe uma das portas sem prêmio, isso ‘força’ o apresentador a abrir a outra porta que não tem nada, deixando, como alternativa para você, a porta com o prêmio. Mas, quando você escolhe a porta premiada, o apresentador tem duas escolhas de portas para abrir. As tabelinhas a seguir devem ajudar a visualizar esses dois cenários.
 
Vamos admitir que você escolheu a porta 1, mas não mudou de opção.
 

Neste caso, o leitor escolhe a porta 1 e decide não mudar de opção. Suas chances de ganhar o prêmio são de um terço.

Note que, nesse caso, você tem uma chance em três de ganhar. Se, por exemplo, repetíssemos o jogo 999 vezes e em todas elas você não mudasse de porta, você ganharia, em média, 333 vezes (1/3) e perderia no restante (2/3).

 
Agora, analisemos a situação em que você muda sua opção – vamos supor que sua escolha inicial tenha sido novamente a porta 1.
 

Neste caso, o leitor inicialmente escolhe a porta 1, mas resolve mudar de opção. Suas chances de ganhar dobram.

Veja como suas chances dobram! No primeiro caso (sem mudar de porta), você tinha apenas uma em três. Agora, com a mudança, passou a ter duas. Ou seja, se repetíssemos o jogo 999 vezes, você ganharia, em média, 666 vezes (2/3) e perderia em 333 delas (1/3).

 
Se ainda resta em você, leitor, aquela impressão de estar sendo ‘enganado’, façamos, então, uma ‘pequena’ variação do Monty Hall: em vez de três portas, suponhamos que o programa – em uma versão exagerada e sem muito futuro – use mil portas. Você escolhe uma delas, e o apresentador, agora, abre 998 portas sem prêmio, e pergunta, com cara de quem está dando prejuízo aos patrocinadores do programa: “Quer trocar?”
 
Aquele participante lá do segundo parágrafo provavelmente diria: “Não faz diferença!” Já o leitor dos parágrafos seguintes – que teve aqui reciclados os conhecimentos básicos sobre probabilidades – certamente responderia com um “É claro!” Nesse caso, fica bem mais evidente por que trocar é melhor: suas chances de escolher a porta certa no início são remotas: 1/1000. Mas, depois de o apresentador ter aberto 998 portas sem nada, você pensa: “É muito, muito provável que o prêmio esteja naquela porta que ele não abriu!”. Você muda de porta, ganha o prêmio – nesse caso, seria muito azar não ganhar, pois suas chances são altíssimas – e volta para casa feliz da vida com uma assinatura da Ciência Hoje , para acompanhar, entre tantos outros assuntos interessantes, a coluna do mês que vêm…
 
Desafio
Suponha que o apresentador não achou o cartão que diz onde está o prêmio e abriu uma das duas portas restantes ao acaso (vamos imaginar que a porta aberta não tenha nada atrás, caso contrário o jogo terminaria). Nesse caso, seria melhor mudar de porta? A resposta você confere na seção “Qual o problema?” de CH 219.

Marco Moriconi
Instituto de Física,
Universidade Federal Fluminense

 

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