O amarelo é a cor predominante nas ruas do centro do Rio de Janeiro. É notória a quantidade de táxis que circulam diariamente em qualquer parte da cidade, como se pode evidenciar em suas principais ruas e avenidas. E há passageiros dentro. Não tenho números, mas suponho que a taxa de crescimento desse meio de transporte experimentou aumentos constantes nos últimos anos. E isso parece bom, pois pode sinalizar uma mudança de interesses ou, simplesmente, refletir uma ação ajuizada de alguns, com prováveis vantagens coletivas. Um número maior de táxis pode ser associado a menos carros nas ruas, pois seus usuários não são tipicamente os mesmos dos meios de transporte de massa. O trânsito e o ambiente agradecem.
As vantagens que o táxi proporciona são evidentes, sobretudo quando você se cadastra em cooperativas e, com um simples telefonema, é ‘resgatado’ em qualquer lugar da cidade, de dia, à noite ou de madrugada. Você realmente pode ter um motorista particular. Um não, vários. Como se diz por aqui, gente fina é outra coisa. Mas e o custo disso? Será que temos ‘bala na agulha’ para bancar um táxi diariamente? Convido-o então a fazer a seguinte reflexão quali-quantitativa.
Um item de conforto que adquirimos assim que dispomos de algum dinheiro talvez seja um carro novo. Entre os jovens do sexo masculino então, o carro é uma verdadeira necessidade. Não fossem, entretanto, os prováveis aspectos utilitaristas desse objeto de desejo (principalmente para o gênero e a faixa etária citada), os concretos aspectos financeiros e operacionais, quando devidamente reconhecidos, deveriam nos fazer pensar duas vezes antes de tomar essa decisão.
Senão vejamos: quais os custos relacionados com a compra de um automóvel? (Para facilitar, nos limitaremos apenas aos novos.) A figura apresentada a seguir é um ‘exercício financeiro’ sob nove cenários possíveis: três valores de um carro novo (R$ 20 mil, R$ 40 mil e R$ 80 mil, tomados arbitrariamente), combinando-se com três possíveis níveis de uso do carro. Alguns proprietários usam pouco o veículo (andam cerca de 500 km/mês); outros o utilizam em um nível considerado intermediário, algo equivalente a trabalhar diariamente de carro e esporadicamente fazer passeios nos fins de semana (o que poderia significar 1.500 km/mês); e há os que usam muito o veículo. Para permitir algumas contas, vamos considerar, nesse caso, 3.000 km/mês.

Simulação de custos mensais (em reais) associados à compra de um carro novo. Os nove cenários possíveis envolvem três valores para o carro e três níveis de uso.
O mais importante, contudo, é reconhecer os custos diretos, indiretos e subjetivos associados à compra e ao uso do automóvel. Na mesma figura, sem a pretensão de ser exaustivo ou preciso, pode-se reconhecer entre os principais custos diretos (aqueles que sentimos no bolso) o combustível, o seguro, o IPVA [Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores], despesa com estacionamento e, também, custos imprevisíveis relacionados com a manutenção do veículo, dado que este está sujeito às intempéries do trânsito e do tempo de uso. Os valores apontados na figura para esses itens são ‘chutes’ que nos parecem razoáveis. Outros valores seriam perfeitamente aceitáveis, e o leitor está convidado a fazer sua própria simulação.
Outros itens de custo que dependem das condições e do estilo do proprietário são lavagens periódicas do veículo e pagamento de eventuais multas, pedágios e estacionamento noturno para quem não dispõe de garagem em casa. Na realidade, esse item (rotulado de ‘outros’ na figura) pode variar de zero até quantias bem altas. Para dar um exemplo razoável, vamos considerar um custo fixo aproximado de R$ 50, R$ 75 e R$ 100 por mês, para quem anda pouco, mais ou menos e muito, respectivamente.
No rol dos custos não imediatamente perceptíveis, podemos pensar naqueles que seriam rotulados de ‘indiretos’, ou seja, estão relacionados com o dinheiro envolvido na compra do carro. Basicamente, pensaríamos nos rendimentos oriundos de uma aplicação financeira, caso o leitor não tivesse adquirido o carro, e na sua depreciação (a dele, o carro, e não na sua). Por outro lado, se fizermos um exercício mental subjetivo, a sua ‘depreciação’ física e mental, por enfrentar um trânsito caótico em uma cidade agitada e violenta, poderia ser convertida em pecúnia. Isto é, quanto você estaria disposto a pagar para não perder tempo com avarias no veículo, pequenas batidas e estresse de origem diversa, como ‘flanelinhas’, congestionamentos, violência no trânsito, busca de vagas para estacionar, mecânicos etc., etc., etc.? Pensando nisso, arrisco a dizer que toparia desembolsar pelo menos uns R$ 200 mensais para evitar esses pequenos desgastes diários.
Todos nós proprietários sabemos que um carro sempre sai caro, e os custos totais relacionados na figura, embora não reflitam exatamente uma situação em particular, nos revela o quão caro pode nos sair esse confortável objeto de desejo. Na melhor das hipóteses representadas na figura, um custo de quase R$ 800 por mês não parece desprezível à luz da realidade nacional.
Por que então não hesitamos em comprar um carro na primeira oportunidade? Que alternativas temos? Se não estamos preocupados com contenção de gastos, então não há necessidade de encontrar alternativas: compremos nosso carro e ‘pé na estrada’. Arrisco a dizer que uma explicação possível talvez seja o sentimento de liberdade e poder que um belo carro confere. – “Viu o carrão do fulano?”
Lembra-se do táxi? Diante dos valores simulados na figura, parece que o aumento do número de táxis e de passageiros que os utilizam esteja refletindo, conscientemente ou não, a opção de muitos por essa boa alternativa. Quantas corridas cabem em pelo menos R$ 800? Usando a situação intermediária como referência (carro zero quilômetro de R$ 40 mil e um gasto mensal de R$ 1.500), o custo mensal é de aproximadamente R$ 1.600. No Rio de Janeiro, com cerca de R$ 20 vai-se do Centro à Zona Sul. Assim, no mínimo, 40 viagens mensais Zona Sul-Centro-Zona Sul estariam garantidas, o que significa, por exemplo, ir para o trabalho todos os dias de táxi, além de fazer passeios nos fins de semana, com todo o conforto e sem, é claro, as aporrinhações associadas ao carro próprio. Mas se você faz viagens mais longas com regularidade nos fins de semana, a compra do carro parece vantajosa. Por outro lado, dois ou mais carros para uma mesma família deve certamente implicar custos que poderiam ser evitados ou reduzidos.

Viu? Você pode ter um motorista particular e não sabia. Vamos então andar de táxi?

Ronir Raggio Luiz *
Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva,
Universidade Federal do Rio de Janeiro.

*O autor possui um carro mediano, raramente anda de táxi e não tem parente taxista (só um único amigo).

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