Diabetes na mira

O diabetes é hoje um dos maiores inimigos da saúde pública. A doença afeta cerca de 250 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo 4% delas no Brasil, segundo dados da Federação Internacional do Diabetes. E estima-se que esse número aumente, devido ao envelhecimento da população e à maior prevalência de sedentarismo e obesidade.

Para ajudar a reverter esse quadro, pesquisadores do Brasil e da Itália desenvolveram terapias baseadas na manipulação genética e no uso de células-tronco para combater os dois tipos da doença. Testados em ratos e camundongos, os tratamentos foram capazes de reduzir os níveis de glicose no sangue dos animais.

O diabetes é uma doença crônica causada pela falta ou pelo mau funcionamento da insulina, hormônio produzido pelo pâncreas que regula o nível de glicose no sangue ao permitir que esta penetre nas células para ser usada como fonte de energia. Atualmente, o tratamento para o diabetes se restringe a controlar os níveis de glicose no sangue, por meio de dieta, exercícios e administração de medicamentos orais ou injetáveis e de insulina, para evitar complicações decorrentes da doença.

Agora pesquisadores italianos desenvolveram um mecanismo capaz de bloquear a destruição de células produtoras de insulina pelo sistema imunológico, problema característico dos portadores de diabetes tipo 1. O estudo, publicado na semana passada na Science Translational Medicine, usou terapia gênica para resgatar os níveis normais de glicose no sangue de ratos.

Fígado
A nova terapia gênica para diabetes tipo 1 baseia-se em levar para o fígado (na imagem) uma molécula capaz de induzir uma reação no sistema imune que impede a destruição das células beta, produtoras de insulina. (imagem: V. Altounian / Science Translational Medicine)

O tratamento consiste na injeção de doses de uma forma inofensiva de lentivírus (vírus capazes de transferir genes para suas células hospedeiras) modificado geneticamente para levar para o fígado uma molécula (um novo antígeno da insulina) que impede que as células beta do pâncreas sejam destruídas pelas células regulatórias T, do sistema imune.

Segundo uma das autoras do estudo, Maria Grazia Roncarolo, da Università Vita-Salute San Raffaele, na Itália, o antígeno defende as células beta dos ratos. “A presença do antígeno da insulina no fígado induz uma reação nas células regulatórias T que impede a destruição das células beta, que são as produtoras oficiais de insulina”, explica Roncarolo. “Com isso, a tolerância do sistema imunológico é restaurada”. Esse mecanismo para a progressão da doença e restabelece a glicose do sangue a níveis normais.

Os pesquisadores acreditam que essa terapia gênica tem potencial para restaurar a tolerância do sistema imunológico tanto em estágios iniciais quanto avançados de diabetes tipo 1.

Vencendo a resistência

Já o estudo brasileiro, realizado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e publicado em abril na revista Plos One, tem como alvo o diabetes tipo 2, que atinge cerca de 90% dos pacientes diabéticos. Nesse caso, fatores como obesidade, sedentarismo e maus hábitos alimentares dificultam a ação da insulina na regulação do açúcar no organismo (resistência à insulina) ou levam a uma produção insuficiente do hormônio pelo pâncreas (seja por disfunção ou morte das células beta).

O tratamento, testado em camundongos, usa células-tronco mesenquimais, capazes de se diferenciar em quaisquer células do corpo

O tratamento proposto por eles, testado em camundongos, usa células-tronco mesenquimais, aquelas retiradas da medula óssea e de outros tecidos, como o adiposo, de indivíduos adultos e que são capazes de se diferenciar em quaisquer células do corpo. Injetadas nos animais, essas células foram capazes de reduzir a morte de células do pâncreas.

Usando camundongos submetidos a uma dieta com 60% de lipídios durante oito semanas para se tornarem obesos, resistentes à insulina e hiperglicêmicos, os pesquisadores observaram uma redução relevante no nível de glicose no sangue dos animais tratados com as células-tronco.

“Embora hoje haja vários medicamentos para o tratamento do diabetes tipo 2, aproximadamente 70% dos pacientes não atingem o nível de controle glicêmico desejado. Esses pacientes desenvolverão complicações graves”, comenta a autora do estudo da UFSCar, Ângela Merice Leal. “Por isso, estamos motivados a buscar novas alternativas para os pacientes, que poderão se beneficiar futuramente.”

Valentina Leite

Ciência Hoje On-line