Embora seus poderes não sejam tão valorizados, o ‘rei dos mares’ tem habilidades na água mais impressionantes do que as de outros super-heróis em terra ou no ar, especialmente sob as lentes da física.

O Aquaman tem incríveis habilidades aquáticas, derivadas do relacionamento de seus pais: a rainha de Atlântida, Atlanna, e o humano Tom Curry.

Por mais tecnológica que nossa sociedade atual seja, estamos longe de dominar os oceanos como dominamos a terra e até o ar. Por essa perspectiva, o Aquaman é o herói não alienígena que mais tem poder e conhecimento sobre coisas que nós não temos. É claro que isso nunca impediu que ele fosse menosprezado, tanto pelos personagens das histórias em quadrinhos quanto pelas pessoas no mundo real.

Apesar de não ser tão poderoso em terra firme, o Aquaman tem habilidades aquáticas mais surpreendentes do que as habilidades de muitos outros super-heróis em terra ou no ar, principalmente se as analisarmos do ponto de vista da física.

Existem diferentes histórias para a origem do Aquaman, mas é consenso que os poderes do jovem Arthur Curry derivam do relacionamento de seus pais: a rainha de Atlântida, Atlanna, e o humano Tom Curry. Assim, além de herdar o trono, o ‘protetor dos oceanos’ herdou de sua mãe poderes, como superforça, super-resistência, destreza, capacidade de respirar dentro e fora da água, ‘comunicação’ com seres marinhos e supervelocidade. E é este último poder que iremos analisar.

 

Os desafios de se mover na água

Em uma das revistas da Liga da Justiça, é dito que o Aquaman é capaz de atingir a enorme velocidade de 3 mil metros por segundo quando está nadando. Essa velocidade já representa quase nove vezes a velocidade do som no ar. Você poderia pensar que isso não é um grande poder, já que outros heróis se movem mais rápido em terra. Mas um fator importante a considerar é que ele se move com essa velocidade na água!

Para se mover, você precisa retirar toda a camada de ar que está na sua frente para que seu corpo ocupe aquele espaço. O ar, além de ocupar espaço, possui massa. Por isso, quando um corpo se move em um lugar que possui ar, ele sofre uma força chamada ‘resistência do ar’ ou ‘força de arrasto’. É graças a essa força que, por exemplo, um paraquedista chega em segurança ao chão, pois o ar freia o paraquedas, diminuindo sua velocidade. É também essa força que faz com que papéis ou outros objetos leves caiam bem lentamente.

A força de arrasto é proporcional ao quadrado da velocidade do corpo. Isso significa que, se você resolve correr duas vezes mais rápido, essa força de resistência do ar fica quatro vezes maior.

O arrasto também é proporcional à densidade do meio onde a pessoa se move. Ou seja, se você se mover na água (que é mil vezes mais densa que o ar), sofrerá uma força de resistência mil vezes maior do que se estivesse fora d’água. Imagino que isso você já tenha observado: é muito mais difícil andar dentro de uma piscina do que fora dela.

Com essas informações, já fica claro que o desafio enfrentado pelo Aquaman para se mover rapidamente na água é muito maior do que o de super-heróis terrestres ou que voam.

Mas há ainda outro elemento que podemos analisar: a energia gasta pelo Aquaman durante seu nado. Existe uma grandeza física chamada potência, que mede a quantidade de energia gasta por um objeto a cada segundo. A potência necessária para vencer a força de arrasto aumenta com o cubo da velocidade, ou seja, se você resolver correr com o dobro da velocidade, não vai gastar o dobro da energia, vai gastar oito vezes mais!

Consegue imaginar qual potência o Aquaman gastaria para se mover à velocidade de 3 mil quilômetros por segundo, superando a força de arrasto? Pelos cálculos do divulgador de ciência norte-americano Kyle Hill, o ‘rei dos mares’ gastaria uma potência de um trilhão de watts! Isso equivale a quase 240 milhões de quilocalorias gastas a cada segundo.

Nem a monstruosa dieta de 12 mil calorias por dia do nadador norte-americano e recordista mundial Michael Phelps seria suficiente para sustentar sequer um milésimo de segundo de nado do Aquaman.

Então poderíamos nos indagar: de onde vem tanta energia? De alimento, somente, com certeza não é! Seria magia?

 

Como Aquaman se move na água?

Uma maneira muito usada para se movimentar na água é por meio de propulsão. Ao bater os pés, Michael Phelps está movimentando massa de água para trás. Pela lei da ação e reação, do físico e matemático inglês Isaac Newton (1643-1727), o nadador recebe da água a mesma força que aplicou nela, só que para o lado contrário. Assim, ao empurrar água para trás, ele é impulsionado para frente. Helicópteros e foguetes funcionam também com base na propulsão de matéria.

Mas, em nenhum filme ou história em quadrinhos, vemos o Aquaman batendo as pernas para nadar. Portanto, ou ele bate as pernas na água com tanta velocidade que não conseguimos perceber, ou ele utiliza outras técnicas.

O físico sueco Hannes Alfvén (1908-1995) fez várias descobertas nos anos 1960 e 1970 que levaram ao surgimento de uma área da física chamada magneto-hidrodinâmica (MHD). Seus estudos, além de lhe renderem um prêmio Nobel, foram fundamentais para a descoberta do fenômeno da propulsão magneto-hidrodinâmica.

Essa técnica, que já vem sendo testada em veículos aquáticos pelos cientistas, é parecida com a boa e velha pernada. A diferença é que quem impulsiona a água para trás são campos eletromagnéticos.

O único problema da propulsão MHD é que, embora ela economize a energia que seria gasta nas pernadas, há um gasto muito alto de energia elétrica.

Existe ainda outra técnica que poderia justificar a altíssima velocidade do Aquaman e minimizar muito o seu gasto energético.

Se você já viu uma turbina girando dentro da água, provavelmente reparou nas bolhas que se formam. Isso acontece porque, quanto mais rápido um líquido se move, menor é a sua pressão. Quando a água está rápida e sua pressão diminui, suas moléculas ficam ‘mais livres’ e tendem a se separar. Com isso, uma pequena quantidade de água evapora e sobe para a superfície na forma de bolhas.

Esse fenômeno – denominado cavitação – foi logo aproveitado pelos cientistas. Na década de 1960, a União Soviética começou a desenvolver um torpedo chamado VA-111 Shkval. O grande diferencial dessa arma eram os gases quentes ejetados na parte da frente do torpedo, intensificando o processo de cavitação. O resultado era uma grande quantidade de água virando vapor antes mesmo de tocar na carcaça do torpedo. Com isso, o projétil podia viajar dentro da água protegido por uma bolha de ar, ou seja, sem sofrer a enorme força de arrasto que a água proporcionaria

Projétil em supercavitação. Uma grande quantidade de água vira vapor devido à emissão de gases quentes, fazendo com que o projétil viaje na água protegido por uma bolha de ar, ou seja, sem sofrer a força de arrasto.

Essa técnica, denominada supercavitação, vem sendo usada desde então na indústria bélica e de veículos aquáticos. Hoje, alguns países já declararam possuir torpedos e até munição para pequenas armas que operam com supercavitação, atingindo velocidades inimagináveis na água, como o torpedo russo capaz de atingir uma velocidade de 370 Km/h.

A maior velocidade que um objeto com supercavitação já atingiu, até onde pude apurar, foi registrada por uma pesquisa publicada pelo Instituto Americano de Física em 2016. Os cientistas conseguiram disparar um projétil que atingiu uma velocidade de 1.590 metros por segundo dentro da água! Algo assustadoramente rápido, mas ainda longe da velocidade de 3 mil metros por segundo do Aquaman.

Você imaginava que esse meio atlante, meio humano tinha poderes fisicamente tão surpreendentes? Conversar com os peixes não é nada perto da sua supervelocidade aquática. Mas não pare por aqui. Que tal usar a física e outras áreas da ciência para tentar responder à pergunta: quão poderoso é esse subestimado super-herói?

Lucas Mascarenhas de Miranda

Físico e divulgador de ciência
Universidade Federal de Juiz de Fora

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