A fuga de cérebros da Alemanha nazista

Quando Adolf Hitler chegou ao poder em 1933, ele queria levar a Alemanha a uma nova era de glória. Ele resgatou a segurança e prosperidade do país, o exército alemão — orgulho nacional — foi recriado e seu programa de obras públicas era invejado em vários países. Mas após três meses como chanceler, cego pelo seu anti-semitismo, ele comete um erro: promulga as leis de ‘reconstrução da administração pública’, que proibiam pessoas de origem não ariana de trabalhar no serviço público. Cerca de 25% dos cargos em universidades públicas eram ocupados por judeus.

Sem poder continuar suas pesquisas, milhares de cientistas e acadêmicos buscam refúgio em outros países, sobretudo Grã-Bretanha e Estados Unidos. Em O presente de Hitler , a editora Jean Medawar e o médico David Pyke narram a história de alguns desses homens e mulheres, muitos dos quais construíram em ‘território aliado’ carreiras de sucesso.

É possível traduzir em números a perda do material humano: até 1932, a Alemanha havia ganho 33 dos 100 prêmios Nobel de ciência; nos 27 anos seguintes, esse número se reduziria a oito. Até então, a supremacia germânica era indiscutível: conjugava força militar e eficiência econômica, tendo a pesquisa científica como base para a indústria. Mas a ciência alemã sofre um grande golpe com o nazismo. Seu antiintelectualismo ditava que a universidade devia priorizar a ciência militar, além de formar a vontade e o caráter dos estudantes.

Apenas no primeiro ano de governo, cerca de 2.600 acadêmicos saíram do país. Diante das medidas alemãs, esforços para receber refugiados foram iniciados na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos. Associações de auxílio foram criadas, custeadas por doações, principalmente de judeus, pois uma das condições para os ‘salvamentos’ era que eles não gerassem custos adicionais ao Estado e às instituições que os recebiam.

 

A queima de livros em praça pública em 10 de maio de 1933 simboliza o antiintelectualismo do regime de Hitler

 

A fuga em massa de cérebros tirou da Alemanha alguns dos mais brilhantes nomes da ciência do século 20, como os físicos Erwin Schrödinger e Max Born ou o bioquímico Hans Krebs. O mais célebre de todos, porém, é o criador teoria da relatividade, Albert Einstein.

Quando Hitler assumiu, Einstein — que era judeu e pacifista — estava nos Estados Unidos e por lá ficou. Passou a trabalhar no novo Instituto de Estudos Avançados da Universidade de Princeton, onde seu único dever era pensar. O irônico é que sua contribuição não foi científica, mas política. Suas descobertas mais notáveis haviam sido feitas na juventude, ainda na Suíça e na Alemanha. Mas ao renunciar à cidadania alemã e à Academia Prussiana de Ciência, Einstein virou um símbolo mundial de oposição e desprezo ao nazismo.

Baseados em pesquisas e entrevistas, os autores retratam com fidelidade a história de coragem de pessoas que não tiveram outra opção a não ser deixar tudo para trás. Muitos reconheceram que os recursos dos países que os acolheram foram imprescindíveis para suas descobertas.

Iniciados no meio científico terão mais facilidade para reconhecer os nomes e teorias citados na obra. Mas o texto claro e fluido torna a leitura agradável, recomendada para quem quiser conhecer um outro lado da Segunda Guerra Mundial.

 

O presente de Hitler – cientistas que
escaparam da Alemanha nazista

Jean Medawar e David Pyke
(trad.: Antônio Nogueira Machado)
Rio de Janeiro, 2003, Record
308 páginas – R$ 42,00

Rafael Barifouse
Ciência Hoje On-line
06/02/04