A verdadeira origem das orquídeas

Um grande passo foi dado para desvendar a verdadeira história da evolução das orquídeas, que formam a maior de todas as famílias botânicas, com 24 mil espécies espalhadas atualmente pelo mundo. A análise de parte de uma orquídea que estava ligada a um fóssil de abelha encontrado na República Dominicana em 2000 revela que essas complexas plantas surgiram há mais tempo do que imaginavam os biólogos. O estudo, publicado esta semana na revista Nature , indica que as orquídeas podem ter coexistido com os dinossauros.

“Esse foi o primeiro fóssil inequívoco de orquidácea já encontrado”, afirma em entrevista à CH On-line um dos autores do artigo, o biólogo argentino Rodrigo Singer, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Singer, que fez parte do estudo junto com pesquisadores da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e da Universidade Leiden, na Holanda, foi um dos responsáveis pela interpretação morfológica, taxonômica e funcional da espécie de orquídea fóssil.

O fóssil encontrado consiste em um polinário, isto é, um pacote de pólen aglutinado, a forma pela qual a maior parte das orquídeas libera seu pólen. Esse polinário está ligado à região dorsal (mesoscutelo) de uma abelha fóssil da espécie extinta Proplebeia dominicana . Ambos estão preservados em âmbar e datam do período Mioceno (entre 20 e 15 milhões de anos atrás).

Fóssil de abelha carregando parte de uma orquídea – o polinário – preservado em âmbar. À direita, é possível ver as unidades de pólen aglutinadas no polinário. (Crédito: Nature ). 

A análise do polinário permitiu inferir alguns atributos morfológicos das flores e a forma como eram visitadas e polinizadas pelos insetos. O fóssil de orquídea foi descrito com o nome científico Meliorchis caribea , pertencente à subtribo Goodyerinae, agrupamento que ainda tem representantes vivos na flora atual.

Singer ressalta que as orquidáceas têm alto grau de especialização. Trata-se do grupo mais diversificado de angiospermas (plantas com flores). Segundo ele, a maior parte das orquídeas apresenta seus órgãos reprodutores masculinos e femininos fusionados em uma estrutura chamada coluna. Além disso, têm uma pétala mediana geralmente maior e mais colorida ou destacada, chamada de labelo, cuja função principal é atrair e direcionar os polinizadores.

A evolução dessa interação entre orquídeas e agentes polinizadores, fundamental para a dispersão das plantas, ainda era desconhecida dos biólogos. A descoberta do fóssil de abelha associado ao polinário de uma orquídea permitiu demonstrar a antiguidade dessa relação. “Desde a época de Darwin, os biólogos evolucionários foram fascinados pelas adaptações da polinização por insetos exibidas pelas orquídeas”, diz Santiago Ramírez, pesquisador do Museu de Zoologia Comparada de Harvard e também autor do artigo.

Segundo Ramírez, a descoberta é de grande importância, pois é muito difícil obter o registro fóssil dessas plantas. Elas não florescem freqüentemente e estão concentradas em áreas tropicais, cuja umidade impede o processo de fossilização. Além disso, seu pólen só é disperso por animais – e não pelo vento – e se desintegra em contato com o ácido usado para extraí-lo das rochas.

A equipe também comparou a idade da orquídea com a de fósseis de outras plantas monocotiledôneas para investigar suas relações evolutivas e montar a árvore filogenética do grupo Orchidaceae. Os resultados indicam que o ancestral comum mais recente das orquídeas existentes viveu no período Cretáceo posterior, entre 84 e 76 milhões de anos atrás. “Devido à complexidade da estrutura morfológica das orquídeas, acreditava-se que elas tinham se desenvolvido mais recentemente, em uma época contemporânea à do homem. Diante da idade desse fóssil, percebemos que as orquídeas surgiram muito antes, no período dos dinossauros”, conta o biólogo.

Segundo os pesquisadores, a família das orquídeas era razoavelmente jovem na época da extinção dos dinossauros, há 65 milhões de anos. Eles acreditam que a grande diversificação das orquídeas tenha ocorrido logo após esse evento de extinção em massa que dizimou muitas das espécies do planeta no período entre o Cretáceo e o Terciário.

Fabíola Bezerra
Ciência Hoje On-line
29/08/2007