35 mil anos de idade a mais para o Homo sapiens

Uma nova análise dos fósseis de dois hominídeos encontrados em 1967 nas proximidades do rio Omo, em Kibish, na Etiópia, revelou que são eles os mais antigos Homo sapiens de que se tem notícia. Até o recente estudo – publicado em 17 de fevereiro na revista Nature –, acreditava-se que os ossos datavam de 130 mil anos atrás. Depois disso, fósseis de H. sapiens  com 160 mil anos foram encontrados, também na Etiópia. No entanto, testes recentes indicam que os hominídeos do rio Omo viveram há cerca de 195 mil anos.

Crânio dos dois hominídeos encontrados em 1967 nas proximidades do rio Omo, na Etiópia. Novas análises indicam que eles têm 195 mil anos de idade (fotos: Michael Day)

Os dois indivíduos encontrados – batizados pelos cientistas de Omo I e Omo II – têm algumas diferenças morfológicas, ainda que nenhum pesquisador desde 1967 tenha discordado a respeito do pertencimento de ambos à mesma espécie. A anatomia de Omo I é mais moderna do a que de Omo II. De acordo com John Fleagle, professor da Universidade Stony Brook (EUA) e um dos cientistas responsáveis pelo estudo, é comum que em tempos de grande efervescência evolutiva haja um aumento na diversidade anatômica. “No entanto”, diz o professor em entrevista à CH On-line, “é improvável que essa diversidade ainda exista. Somos uma espécie notavelmente uniforme em termos morfológicos”.

 
A camada do solo onde os fósseis foram encontrados continha, entre os sedimentos oriundos do rio Omo, cinzas de antigas erupções de vulcões próximos à região. As cinzas contêm um mineral chamado feldspato, que tem em sua composição pequenas quantidades de potássio-40 radioativo. Dentro de alguns milhares de anos, essa substância se transforma no gás argônio-40. Calculando a duração desse intervalo, os pesquisadores puderam determinar a idade do substrato onde foram encontrados os ossos e, conseqüentemente, a idade de Omo I e Omo II.

A essas evidências, somou-se a análise do sapropel, tipo de rocha sedimentar de origem fundamentalmente animal e vegetal, também presente nesse mesmo substrato. O resultado das análises apontou idades muito semelhantes – cerca de 195 mil anos – para as cinzas vulcânicas e para o sapropel. A datação anterior havia se baseado no decaimento do urânio-238 em ostras encontradas nas camadas rochosas de onde foram desenterrados os fósseis dos hominídeos.

 

Partes do esqueleto de Omo I mantidas no Museu Nacional da Etiópia. Na época em que foram descobertos, acreditava-se que eles datavam de 130 mil anos atrás. (foto: John Fleagle / Univ. Stony Brook)

De acordo com os pesquisadores, a principal implicação dessa descoberta é o aumento do intervalo entre o surgimento do homem moderno e o desenvolvimento do comportamento que caracterizaria essa espécie. As primeiras manifestações culturais do Homo sapiens já registradas por pesquisadores – desenhos, ferramentas e ornamentos corporais – têm no máximo 50 mil anos de idade. “São 150 mil anos sem qualquer indício de organização cultural moderna, desde o surgimento da espécie – 50 mil a mais do que se imaginava”, diz Fleagle.

A nova datação dos fósseis também aumenta em 60 mil anos o intervalo entre o surgimento de nossa espécie e a saída dos primeiros Homo sapiens da África, há cerca de 45 mil anos. Os humanos que povoaram progressivamente os outros continentes pareciam ter também, além do esqueleto moderno, um conjunto de manifestações culturais mais complexas. Além disso, os resultados são compatíveis com as datas sugeridas por estudos de geneticistas sobre a origem da nossa espécie.

Tiago Carvalho
Ciência Hoje On-line
16/02/05