400 km com um litro de combustível

Que tal percorrer os 429 km que separam Rio de Janeiro e São Paulo gastando menos de R$ 3 de gasolina? Pode parecer ficção, mas a II Maratona da Economia, realizada em julho, em São Paulo, mostra que não é bem assim. A competição reuniu 18 carros de milhagem – protótipos construídos em universidades com o objetivo de desenvolver tecnologias para otimizar o desempenho dos veículos. Cada um deles foi abastecido com aproximadamente 200 ml de combustível: o vencedor seria aquele que completasse quatro voltas na pista (cerca de 17 km) com o menor consumo. Destacaram-se na competição o Evolution , modelo da bicampeã Universidade Presbiteriana Mackenzie, e o da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), segundo colocado, que trouxe importantes inovações tecnológicas.
 

As equipes responsáveis pelo  desenvolvimento dos  veículos da Universidade Mackenzie (esq.) e da UFMG (dir.) posam diantedos protótipos. (fotos: www.projcom.com.br

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Os dois modelos são muito leves (32 kg o paulista e 35 kg o mineiro), têm motor de cerca de 1 cv movido a gasolina e carenagem de fibra de vidro. Ambos utilizam rodas como as de bicicletas de corrida, mas o Evolutionusa aros especiais, com 12 raios, ao invés dos 24 ou 36 usuais, o que representa uma diferença de cerca de 2 kg. O protótipo da UFMG emprega pneus especiais, que geram menos atrito e deformações, e se destaca pela arrojada aerodinâmica (possui uma área frontal de apenas 0,5 m 2). Os dois foram desenvolvidos com participação intensa dos alunos dos cursos de engenharia das faculdades, responsáveis por tudo, desde o planejamento até a pintura dos carros.

 
Em provas como a Maratona da Economia, os carros de milhagem devem desenvolver uma velocidade média de pelo menos 30 km/h. A tática mais comum é a de acelerar até um pouco além dessa média e desligar o motor, reiniciando-o somente ao atingir uma certa velocidade mínima. O protótipo da UFMG foi o único a utilizar mecanismos automáticos para comandar esse procedimento, manualmente controlados no Evolution e nos outros 16 veículos.


Os carros da UFMG (esq.) e Mackenzie (dir.) se preparam para a Maratona da Economia.

Apesar disso, o campeão acabou sendo o Evolution , com 396 km rodados com um litro de gasolina – novo recorde brasileiro –, contra 227 km do modelo de mineiro. “Estávamos atentos a detalhes de engenharia que às vezes passam despercebidos”, explica o engenheiro mecânico José Pucci, professor do Mackenzie e coordenador do projeto vencedor. O engenheiro mecânico Paulo Iscold, professor da UFMG e coordenador do projeto dessa universidade, atribui em parte o segundo lugar à inexperiência da equipe, que pela primeira vez participou da competição. Ele aponta, ainda, um erro de cálculo. “Nosso veículo consumiu mais porque acelerava rápido demais”, explica.

 
Os planos para o próximo ano das duas equipes envolvem mudanças na carenagem e modificações nos motores. “Faremos, também, modificações no sistema medição de velocidade, que teve problemas esse ano”, afirma Pucci. Já Iscold aposta na introdução de um sistema inteligente de aceleração. “Pretendemos ser os primeiros a ultrapassar os 1000 km por litro no Brasil”, afirma, otimista.
 
Há décadas provas com carros de milhagem movimentam milhões na Europa. Envolvem, também, parcerias com grandes empresas privadas e estatais para desenvolvimento de tecnologias de ponta, desde pneus exclusivos a células combustíveis movidas a hidrogênio para movimentar os carros – uma tecnologia limpa, que tem como subproduto apenas água quente. Não surpreende, portanto, o extraordinário recorde mundial de 5.385 km rodados com um litro de combustível, muito acima das possibilidades dos grupos brasileiros.
 

As provas com carros de milhagem servem de laboratório para o desenvolvimento de tecnologias, muitas delas já utilizadas em alguns veículos de passeio, como sistemas de injeção eletrônica inteligentes que controlam o fluxo de combustível e o funcionamento do motor. “No próximo ano teremos uma surpresa que vai mostrar como essas tecnologias estão mais próximas dos carros comuns do que parece”, promete Iscold.

Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line
16/08/05