Os relâmpagos, fenômeno natural que ocorre na Terra desde seus primórdios, podem contribuir para o aumento da concentração na atmosfera de compostos que podem ser nocivos ao homem. Um estudo recente da agência espacial norte-americana (Nasa) revela que raios de verão nos Estados Unidos aumentam a quantidade de ozônio (O 3 ) e óxidos de nitrogênio (NOx) na atmosfera.
Cerca de 35 milhões de raios caem anualmente nos EUA (foto: M. Garay/Nasa)
Na troposfera (entre 5 e 13 km de altitude), a produção de O 3 e NOx pelos raios no verão aumenta a concentração dos óxidos de nitrogênio em 90% e do ozônio em mais de 30%. Esse incremento chega a superar a quantidade desses gases produzida pela queima de combustíveis fósseis — a principal fonte humana desses compostos nas altitudes estudadas.
A ação benéfica do ozônio ao ser humano é bem conhecida. Mas seu efeito nocivo ou favorável à vida na Terra depende da altitude em que ele se situa. A maior parte desse gás está na estratosfera (entre 13 e 40 km), onde funciona como escudo à radiação ultravioleta. Mais próximo da superfície, porém, o O 3 é um poluente que causa danos ao tecido pulmonar dos animais e prejudica a vegetação. Na troposfera, sua ação radioativa chega a afetar o clima.
Na troposfera o ozônio é formado quando moléculas de oxigênio (O 2 ) são divididas pela luz solar e os átomos livres desse elemento se ligam a outras moléculas de oxigênio. Próximo da Terra, o ozônio é formado pela reação do oxigênio com poluentes urbanos. Uma das explicações para os óxidos de nitrogênio gerados pela queima de combustíveis fósseis permanecerem próximos à superfície terrestre é que eles são consumidos rapidamente por reações químicas ao subir. Os raios, por outro lado, produzem óxidos de nitrogênio diretamente em toda a troposfera.
Os pesquisadores da Nasa realizaram medições antes e depois dos relâmpagos e comprovaram o acréscimo dos óxidos de nitrogênio e do ozônio. A produção desses elementos sobre os Estados Unidos é suficiente para atingir a troposfera de outras partes do globo, sobretudo a Europa.
Segundo Renyi Zhang, pesquisador da Universidade A&M do Texas e autor do estudo publicado em 18 de fevereiro na revista Proceedings of the National Acedemy of Sciences , “no total, os relâmpagos contribuem com cerca de 5% da produção anual de NOx nos EUA, e cerca de 14% em julho, no verão. No entanto, os raios ainda têm o mais importante papel na formação da composição química do ar”.
“No Brasil, onde cerca de 60 milhões de raios ocorrem todo ano, esse efeito deve ser ainda mais pronunciado”, afirma Osmar Pinto Júnior, coordenador do Grupo de Eletricidade Atmosférica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. “Estudos anteriores têm mostrado que tal efeito é mais pronunciado na região equatorial do planeta.”
O estudo da Nasa integra um projeto mais amplo que pretende investigar as causas primárias das mudanças climáticas na Terra. A meta específica foi compreender os motivos da poluição do ar mais próximo da Terra e na troposfera, seja pela queima de combustíveis, seja pela ação dos relâmpagos.
Denis Weisz Kuck
Ciência Hoje on-line
26/03/03