Ácaro predador

 

Uma criatura microscópica pode ser a salvação de plantações de tomate no mundo inteiro. Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) descobriram que um ácaro encontrado apenas na cidade de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, é o predador ideal para o Tetranychus evansi , ácaro que destrói tomateiros. O ácaro predador, cujo nome é Phytoseiulus longipes , foi enviado ao Quênia, na África, onde a praga vem causando prejuízo aos agricultores.

Tomateiro atacado pelo ácaro Tetranychus evansi . (Foto cedida pelo pesquisador).

 
Em parceria com o Centro Internacional de Fisiologia dos Insetos e Ecologia (Icipe, na sigla em inglês), sediado no Quênia, o Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP de Piracicaba, procurava desde 2000 o melhor inimigo natural para o ácaro do tomateiro. “Foi como encontrar uma agulha no palheiro”, diz o entomologista Gilberto José de Moraes, coordenador da pesquisa. Os outros predadores testados não conseguiam controlar a praga, porque sua ação era dificultada pela estrutura da planta, cujas folhas são cobertas por glândulas pegajosas. Somente após anos de trabalho o P. longipes foi encontrado e identificado como um eficiente predador. 
 
A espécie só vive na região urbana de Uruguaiana e ainda não foi localizada em outras áreas do Brasil. Diferentemente dos outros ácaros presentes em regiões urbanas, que provocam alergia em algumas pessoas, o P. longipes não oferece riscos à população. “Analisamos toda a literatura sobre esta e outras espécies da mesma família e nada é dito sobre riscos à saúde humana ou de outros animais”, explica Moraes. 
 

Santo de casa não faz milagre 

Desde 1980 são pesquisadas formas de combater o ácaro do tomateiro, que hoje é controlado com o uso de produtos tóxicos tanto no Quênia como em outros países. O próprio professor Moraes, durante seu doutorado, buscou um inimigo natural para a praga. “Na época cheguei a testar o P. longipes , que era encontrado em uma região da África, mas não tive sucesso”, conta. 
 
O entomologista diz que não se sabe por que o ácaro de Uruguaiana tem um comportamento diferente. A espécie também já tinha sido encontrada em outras espécies de plantas na Argentina e no Chile, mas não agia como predadora do T. evansi . “Tem sido constatado que populações diferentes de uma mesma espécie, encontradas em locais diferentes, apresentam comportamentos variados.” 
 
Ironicamente, o P. longipes não tem sido mais encontrado no sul da África, onde foi descoberto pela primeira vez. Os pesquisadores pretendem introduzir os exemplares brasileiros nas plantações quenianas. Uma leva do ácaro predador foi enviada ao Quênia em abril. “Esperamos que eles se adaptem ao clima da região, muito parecido com o do Brasil”, diz Moraes. O estudo também afastou a possibilidade de ocorrer um desequilíbrio ecológico no Quênia por causa da introdução da espécie. 
 
O ácaro do tomateiro não é motivo de dor de cabeça apenas para os agricultores do Quênia. Estados Unidos, Israel e países do mediterrâneo, como França, Itália, Portugal e Espanha, também são afetados pela praga. O Brasil é exceção, aparentemente devido à ação de predadores e de um fungo nocivo ao ácaro. Na verdade, pode ser que o fungo seja ainda mais eficaz que o P. longipes no combate à praga, mas ainda não se sabe quais impactos sua introdução pode causar aos ecossistemas locais. “Por isso, ele ainda está sendo mais bem estudado antes que possa ser transferido à África”, completa Moraes. 
 
 

Fernanda Alves 

Ciência Hoje On-line 
19/07/2007