A foto e o físico

Saí há pouco da sala de Cássio Leite Vieira, editor de internacional da CH, com a folha reproduzida na ilustração acima. Ele havia acabado de me explicar, em linhas gerais, como funciona a detecção de partículas com as chamadas emulsões nucleares.

Mas não se engane: apesar dos diagramas aparentemente complexos, foi bastante fácil entender esse processo, uma espécie de fotografia de partículas subatômicas.

Sim, porque trata-se apenas disto – “um tipo especial de fotografia em preto e branco”, mostra Cássio, com a caneta vermelha.

Cássio defendeu ano passado sua tese de doutorado em história das ciências e das técnicas e epistemologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O tema? As emulsões nucleares.

A tese mostra como os físicos foram importantes para a história da fotografia

Nosso jornalista – que por pouco não se formou em física na Universidade de São Paulo (USP) – explicou, pacientemente, como uma partícula ionizante invade a gelatina coberta por brometo de prata e revela sua identidade, assim como a luz refletida pelos objetos registra o negativo na câmera fotográfica analógica.

“Se fosse definir minha tese em poucas palavras, diria que é sobre como os físicos foram importantes para a história da fotografia”, explica Cássio.

“Modesto, barato e charmoso”

De fato, o método fotográfico aplicado à física (nome anterior da “emulsão nuclear”, que ganhou esse título só após a 2ª Guerra Mundial) começou, para valer, em 1910, quando o microscópio somou-se ao processo.

Na década de 1960, o método perdeu força, dando lugar a novos (e mais avançados) meios de se detectar partículas. Mas a emulsão – “procedimento modesto, barato e charmoso”, diz Cássio – tem valor guardado na história da ciência. E é isso que procurou mostrar a tese do nosso editor de internacional.

Foi com a ajuda desse método que Cesar Lattes identificou o méson pi nos Andes em 1947

“Até onde tenho notícia, não há nenhum estudo amplo sobre o tema. E, para o Brasil, especialmente, a emulsão tem papel importante”, conta.

Cássio tem razão. Foi com a ajuda desse método que Cesar Lattes (1924-2005), o físico mais famoso do país, identificou em 1947 nos Andes bolivianos o méson pi, partícula cuja existência havia sido sugerida anteriormente pelo físico japonês Hideki Yukawa (1907-1981) – ele levou o Nobel de Física de 1949 por isso.

Como Cássio me explicou, o méson pi, entre outras propriedades, é a partícula que faz com que os prótons e nêutrons não se repilam – o que proporcionaria, ‘apenas’, a destruição do núcleo do átomo e, bom, nesse caso nem estaríamos por aqui.

Depois da descoberta da Lattes (e a reboque dela), instituições como o CBPF, CNPq e Inpe instalaram-se no Brasil. A tese de Cássio mostra, assim, como as emulsões nucleares tiveram papel importante na própria institucionalização das ciências no Brasil.

Tese para baixar

Tudo acima (e mais tantas outras histórias que não caberiam aqui) está na tese de Cássio, que pode ser baixada – já num palatável formato de livro – na CH On-line. O jornalista ainda pretende imprimir cem exemplares e distribuir para cientistas e instituições interessadas. Vale a pena.

 

Baixe aqui a tese de doutorado de Cássio Leite Vieira sobre emulsões nucleares.

Thiago Camelo
Ciência Hoje On-line