Passada as provas do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem, gostaria de fazer algumas considerações.
É ótima a ideia de se utilizar uma prova única como meio de entrada no ensino superior. A possibilidade de frequentar boas instituições de ensino superior infelizmente ainda está restrita unicamente a estudantes que podem se inscrever em cursinhos caríssimos, estando, portanto, distante da imensa maioria dos cidadãos brasileiros. Assim, o ingresso no ensino superior – talvez a única forma de ascensão social e econômica de pobres como eu e a imensa maioria dos brasileiros – acabava sendo mais uma das formas de discriminação social presentes em nosso país.
A ideia de se fazer um exame único, aplicável em todo o território nacional e com questões que enfatizam o raciocínio lógico e a interdisciplinaridade tem uma série de vantagens: econômicas para as instituições de ensino superior, que não terão mais de gastar quantias vultosas em seus vestibulares, e para os vestibulandos, que não terão mais que se deslocar para outras cidades para prestar seus exames. A preparação dos estudantes ficará muito mais fácil, pois não será mais necessário investir tempo e neurônios em preparações específicas para a universidade A ou B. Além disso, os estudantes poderão fazer a escolha da universidade em que ingressarão de acordo com o seu desempenho.
Contudo, essa ideia de democratização do acesso ao ensino superior deve estar incomodando muita gente. Alguns donos de cursinho podem estar pensando que uma prova que avalie menos a ‘decoreba’ e mais a associação de ideias e conhecimentos pode levá-los a perder no futuro parte de sua clientela. Alguns alunos acostumados ao sistema tradicional de ensino e que, por isso, tenham uma certa ‘preguiça de pensar e raciocinar’ também devem estar insatisfeitos. O mesmo pode estar acontecendo com pessoas que não gostam de novidades, sejam elas boas ou ruins, e uma certa classe de brasileiros que acha que o ensino superior não deve jamais se prestar ao povão. Mas, principalmente, devem de estar descontentes os opositores do atual governo.
Quando essa excelente ideia foi posta em prática, uma série de deslizes acabaram fornecendo munição a toda essa gente contrariada que acabei de citar. É difícil, por exemplo, compreender os motivos que levaram à substituição do consórcio que havia feito os outros exames do Enem por um novo grupo que não possuía experiência para isso. Também é difícil entender como uma iniciativa dessa importância pode ser maculada por um bando de larápios que roubaram provas para depois entregá-las à imprensa. Isso realmente eu, um simples professor universitário, não consigo entender: como algumas pessoas podem se arriscar a ir para a cadeia simplesmente para entregar uma cópia da prova à imprensa? E, para termos um ‘fechamento de ouro’, ao menos por enquanto, houve ainda a descoberta de um erro nas provas que poderia – mas não foi – comunicado antecipadamente aos estudantes e a divulgação de um gabarito errado.
O número excessivo de perguntas, os enunciados longos e assim como a duração das provas podem ser corrigidos (e serão). Contudo, resta saber se o governo vai continuar em relação ao Enem como aquela vaquinha do ditado que produziu uma quantidade enorme de leite, mas depois deitou o pé no balde. Resta, portanto, perguntar ao nosso ministro da Educação: os funcionários encarregados do Enem são incompetentes ou apenas estão jogando contra o patrimônio?
Jerry Carvalho Borges
Departamento de Medicina Veterinária
Universidade Federal de Lavras