O universo é muito grande – enorme, para dizer a verdade – e está ficando cada vez maior. E o mais surpreendente: ele está crescendo cada vez mais rápido. Em vez de ‘pisar no freio’, como os cientistas esperavam, ele está ‘com o pé na tábua’.
Essa constatação, feita em 1998, rendeu o Prêmio Nobel de Física deste ano para os estadunidenses Saul Perlmutter, do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, na Califórnia; Brian P. Schmidt, da Universidade Nacional Australiana, em Weston Creek; e Adam G. Riess, do Instituto de Ciências do Telescópio Espacial, em Baltimore.
A descoberta foi muito questionada na época, mas o fato de ter sido feita por dois grupos independentes – Perlmutter e Schmidt lideravam equipes de pesquisa concorrentes, com Riess pertencendo à segunda – e ter resistido aos testes de vários cientistas mostrou sua robustez.
Para o cosmólogo Martín Makler, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio de Janeiro, o feito teve implicações profundas para a cosmologia, que recebeu um grande impulso desde então. “Hoje, há dezenas, senão centenas de institutos dedicados a esse campo da física”, afirma.
Segundo Makler, a constatação também colocou uma série de desafios aos cientistas da área. “Ela mostrou que os modelos estavam incompletos.”
Maior do que se imaginava
Até a década de 1920, acreditava-se que o universo era estável e do tamanho da nossa galáxia, a Via Láctea. Na verdade, o consenso era que só ela existia e que os outros agrupamentos espirais vistos no céu eram nuvens de gás.
Observações feitas nessa época mostraram que o universo era bem maior, que a Via Láctea era apenas uma entre muitas galáxias e que estas estavam se afastando de nós. Ou seja, o universo estava aumentando de tamanho.
O físico alemão Albert Einstein chegou a uma conclusão similar dez anos antes, enquanto trabalhava na teoria da relatividade geral: o universo deveria se expandir ou se contrair. Avesso à ideia, Einstein introduziu o conceito da constante cosmológica, uma força repulsora que neutralizaria a gravidade mantendo o universo estático.
Mais tarde, Einstein chamaria a constante cosmológica de um grande erro e se renderia ao conceito de um universo que não é estático. Segundo ele, havia três opções para o cosmos: ser aberto, fechado ou plano.
Em um universo aberto, a força da gravidade gerada pela matéria não seria suficiente para frear a expansão e ela continuaria. Em um fechado, a gravidade teria sucesso e o universo se contrairia até o colapso em um big crunch (grande implosão, em tradução livre). Finalmente, em um plano, o preferido dos cosmólogos, a expansão pararia, mas não haveria uma retração.
Em busca do universo plano
Medir a redução da expansão era o objetivo dos ganhadores do Nobel deste ano. Perlmutter organizou o Projeto de Cosmologia de Supernovas (SCP, na sigla em inglês) e Schmidt a Equipe de Busca de Supernovas de Alto-Z (HZP). Ambos usaram o mesmo método: medir o brilho de supernovas distantes.
Uma supernova é uma explosão que brilha mais que uma galáxia e que ocorre na fase final da vida das estrelas anãs brancas, as quais têm a mesma massa do Sol, mas o tamanho próximo ao da Terra.
Um subtipo específico do fenômeno, as supernovas Ia, é usado pelos cosmólogos para descobrir a distância de objetos longínquos. O método faz uso da intensidade do brilho desses eventos: quanto mais brilhante, mais próximo. O problema é que só ocorrem cerca de duas supernovas a cada mil anos em cada galáxia.
Para resolver esse problema, os dois grupos comparavam fotos de uma pequena parte do céu tiradas com três semanas de intervalo, logo após a lua nova, para evitar a interferência da luminosidade do satélite natural da Terra. O objetivo era encontrar pontos de luz que poderiam representar novas supernovas.
Os dois grupos, juntos, encontraram cerca de 50 supernovas cujo brilho era mais tênue do que o esperado, mostrando que a expansão não estava diminuindo; muito pelo contrário, estava acelerando.
Certo de novo
Mas o que causa a expansão acelerada do universo? A ideia mais aceita hoje é que a constante cosmológica, rejeitada por Einstein, é a responsável. Essa força oposta à gravidade é chamada de energia escura e acredita-se que seja responsável por mais de 70% do universo.
A energia escura teria ganhado força há aproximadamente cinco bilhões de anos, quando a primeira expansão do universo, iniciada com o big bang, estava perdendo força. A matéria existente no cosmos já havia se dispersado o suficiente para ‘diluir’ a força da gravidade, permitindo que a influência da energia escura se manifestasse e reiniciasse a expansão cósmica.
“Hoje há várias hipóteses, mas ainda não entendemos bem o que é a energia escura“, diz Makler. “Grandes projetos estão em andamento para caracterizá-la e certamente em 10 anos já saberemos mais, embora se acredite que o entendimento completo desse fenômeno vá demorar.”
Fred Furtado
Ciência Hoje/ RJ