Cores do século passado

Cartazes antigos costumam ser identificados menos como material de estudo acadêmico e mais como objetos da iconografia pop. No entanto, cada foto, traço ou ilustração presente nesses anúncios serve – e muito – para entender a história e o contexto sociocultural de determinadas épocas.

Prova disso é o portal recém-lançado Poster gallery: utopian constructions (‘Galeria de pôsteres: construções utópicas’, em português). A página, criada pela Universidade Tecnológica de Nanyang, em Cingapura, digitalizou em alta resolução mais de 3.100 cartazes de diversos lugares do mundo que trazem à tona os movimentos políticos, sociais e culturais do século 20.

Por meio da ótima ferramenta de pesquisa do site, é possível investigar o modo como a publicidade dos cartazes foi usada para falar em nome de uma causa.

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‘Vamos melhorar toda a economia nacional com tecnologia moderna!’, diz o cartaz norte-coreano. (foto: reprodução/ webposters.adm.ntu.edu.sg)

A maioria dos cartazes é de propaganda de regimes socialistas, como a antiga União Soviética, a China e a Coreia do Norte. “O portal é parte da pesquisa sobre como a mídia representou […] propostas de criação de novas sociedades”, disse ao Boletim da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) o professor brasileiro Heitor Carpuzzo, um dos coordenadores do projeto no país asiático.

Uma das seleções mais interessantes de cartazes é destaca no texto introdutório do portal. Segue a tradução do trecho (toda a página está em inglês).

É interessante testemunhar as metamorfoses diversas na representação das mulheres. Se no início do século 20 as mulheres eram geralmente retratadas como objetos de contemplação e beleza, durante as revoluções e guerras, uma nova imagem feminina surge, dessa vez capaz de substituir ou complementar os homens no trabalho ou na defesa nacional.

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Cartaz norte-americano de 1942. (foto: reprodução/ webposters.adm.ntu.edu.sg)

É, portanto, extremamente interessante saber que cartazes – alguns, hoje em dia, famosos – foram criados, indiretamente, para servirem como propaganda de guerra. O pôster ao lado, por exemplo, não era um estímulo à ‘revolução feminina’, mas sim um incentivo bastante conveniente para que a mulher assumisse certas funções que o homem, distante, não seria capaz de exercer.

No site, a ‘aula de história’ continua: “Após as guerras e revoluções, em algumas sociedades burguesas, a mulher volta ao papel de dona de casa, dessa vez operando eletrodomésticos sofisticados.”

21 cartazes brasileiros digitalizados no portal. Os pôsteres contemplam temas dos mais variados, como peças de teatro, filmes e protestos sindicais

Além da qualidade e quantidade de cartazes, chama a atenção no portal o excelente sistema de busca, que funciona por palavras-chave, categorias, cor do cartaz e cruzamento de todas essas informações.

Mesmo para quem não é interessado em política, cultura e história, vale a visita apenas para contemplar a diversidade estética entre os pôsteres.


Thiago Camelo

Ciência Hoje On-line