Se você está familiarizado com RPGs (role-playing games ou jogos de interpretação, e não reeducação postural global), talvez saiba que existe uma modalidade chamada livro-jogo, na qual uma história é dividida em seções numeradas. Ao fim de cada seção, há uma escolha que remete o jogador à outra seção e assim por diante.
Normalmente, os temas desses livros envolvem dragões, magos, naves espaciais ou super-heróis, mas o pessoal do Núcleo de Divulgação do Programa de Oncobiologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) resolveu inovar.
Em Encruzilhadas: o jogo da sua vida, um livro-jogo voltado para adolescentes, o jogador ‘vive’ o último ano do colégio e o primeiro da faculdade (se passar no vestibular).
À medida que vai fazendo escolhas, ganha pontos nos atributos do seu personagem, coisas como conhecimento (o que aprende na escola), energia (sua disposição física) e popularidade (o quanto seus amigos e conhecidos gostam de você). Em algumas seções, os pontos acumulados nesses quesitos dizem se você teve sucesso em determinadas ações.
Há outros atributos que medem sua exposição a fatores de risco, como ponto etílico (alcoolismo), nuvem de fumaça (tabagismo) e safadeza – calma, é apenas uma medida de relações sexuais seguras e não um sinal de que o conteúdo do livro é para maiores de 18 anos.
No fim do livro, há textos que analisam as decisões tomadas com base nos pontos acumulados. A ideia do Núcleo de Divulgação é usar uma abordagem lúdica para fazer com que os adolescentes entrem em contato com esses conceitos de uma maneira menos rígida e ‘careta’ e percebam que os hábitos adquiridos na juventude podem ter repercussões no futuro.
Altos e baixos
Dá para imaginar que um projeto desses pode assumir um tom professoral e chato, mas o texto consegue escapar disso, embora aqui e ali dê uma ‘escorregada’. Em algumas seções, o livro dita algumas ações, em vez de permitir a escolha, e declara resultados que não necessariamente se dariam daquela maneira na vida real.
Essa simplificação é normal, devido a uma questão de espaço e de fluidez da história, mas pode acabar levando a um desinteresse do leitor. Pelo menos o jogador não vai se deparar com algo como ‘você morreu’, frase comum em alguns livros-jogos de fantasia.
Achei curioso que, apesar de sempre escolher não beber álcool, ainda assim acumulei pontos etílicos. Embora possamos ser afetados pelo tabagismo dos outros como fumantes passivos, até onde sei, ainda não existe alcoolismo passivo. Pode ser uma tentativa de incluir o tema de qualquer maneira, ou simplesmente algo que pode ser melhorado em uma segunda edição.
Outro detalhe é que a história de Encruzilhadas parece direcionada a um público de classe média. Até aí, tudo bem, já que muitos jovens dessa faixa estão expostos a esses riscos, mas fica a dúvida se o livro terá o mesmo apelo para adolescentes de outros níveis econômicos. A resposta deve vir no futuro próximo, já que o jogo será distribuído gratuitamente entre alunos e escolas da rede pública de ensino.
De qualquer maneira, novas iniciativas de divulgação são sempre bem-vindas e Encruzilhadas prima por tentar alcançar o público jovem de uma forma mais prazerosa. Quem dera outros seguissem o exemplo.
Para finalizar, gostaria de registrar que passei no vestibular e consegui um estágio ‘maneiro’ em uma grande empresa. Tudo isso com baixo risco de tabagismo e médio risco de bronzeamento (exposição demasiada ao sol) e safadeza.
Já a Isabela, minha colega de redação… Bom, vamos dizer assim: não vou vê-la na empresa e quando a encontrar na faculdade, ela vai cheirar a fumaça de cigarro e estar mais para lá do que para cá, mas ainda assim muito culta (teve mais pontos de conhecimento do que eu).
Fred Furtado
Ciência Hoje/ RJ
