Einstein e Picasso: será coincidência?

Les Demoiselles d’Avignon , tela de Pablo Picasso de 1907 considerada um marco inicial do cubismo

O físico norte-americano Arthur Miller, professor de história e filosofia da ciência da University College London, não considera obra do acaso o fato de o físico alemão Albert Einstein (1879-1955) e o pintor espanhol Pablo Picasso (1881-1973) terem tido seus períodos mais férteis de criatividade na mesma época. O momento de ruptura do início do século 20 teve impacto semelhante na arte e na ciência.
 
Em conferência apresentada na Reunião Anual da SBPC, Arthur Miller contou a história de como a Teoria da Relatividade de Einstein, que revolucionou o mundo da física, e o quadro Les Demoiselles d’Avignon de Picasso, ponto de partida do movimento cubista, foram concebidos na mesma época – 1905 e 1907, respectivamente.
 
“No início do século 20, havia um clima de mudanças no ar”, contou Miller. “Era um momento excitante, o conhecimento tradicional estava sendo questionado, havia um movimento de vanguarda… Einstein e Picasso foram arrastados juntos.”
 
Comparando as biografias do cientista e do artista mais importantes daquele período, Arthur Miller destacou uma série de similaridades que permearam suas trajetórias rumo a descobertas revolucionárias. Uma delas é o papel que suas mulheres desempenharam em suas obras. Mileva Maric e Fernande Olivier, cada uma a sua maneira, tiveram grande influência em seus companheiros e compartilharam momentos de crise no relacionamento durante seus picos de produção e criação.
 
Enquanto Einstein trocava regularmente idéias com seus colegas Conrad Habicht e Maurice Solovine na Olympia Academy, como decidiu chamar o grupo que naquela época discutia semanalmente física, filosofia, cultura e outros assuntos; Picasso se reunia quase diariamente com os intelectuais Max Jacob e André Salmon, membros da bande à Picasso , para falar sobre literatura, política, matemática, ciência e tudo o mais que interessasse. Além disso, Poincaré e seus estudos sobre a quarta dimensão despertaram grande interesse tanto Einstein quanto em Picasso.
 
“Naquela época, Einstein e Picasso ainda eram desconhecidos; eles estavam na faixa dos vinte anos, eram pouco valorizados, pobres, e propensos a meter-se em confusões”, ressaltou Miller. O fato era que ambos procuravam uma nova forma de representar o mundo, buscavam uma nova estética.
 

Capa do livro de Arthur Miller, ainda sem tradução no Brasil

Einstein achou na estética minimalista a resposta para o seu descontentamento com a concepção de tempo da física da época. “Para ele, a concepção deveria prevalecer sobre a percepção”, afirmou Miller. Já Picasso, que vivia o conflito entre a representação e a abstração, achou na geometria e nas formas multidimensionais as respostas para uma nova representação do espaço. Nesse contexto, os dois, sem nunca terem se conhecido e relacionarem suas produções, conceberam duas obras que marcaram uma ruptura na ciência e na arte.

 
Miller apontou, no entanto, algumas curiosas diferenças entre os dois: “Picasso nunca ligou para música, enquanto Einstein era apaixonado e dedicado a ela”. A outra é que, enquanto o sexo teve grande importância na vida criativa de Picasso, Einstein nutria, aparentemente, certa apatia pelas relações sexuais.
 

Fora isso, “as semelhanças são intrigantes”. Foram elas que atraíram Arthur Miller para a pesquisa mais profunda sobre as relações entre Einstein e Picasso, cujo resultado está no livro Space, time, and the beauty that causes havoc , lançado em 2001 pela editora norte-americana Perseus Books e indicado ao Pulitzer Prize.
 

Carla Almeida
Jornal da Ciência E-mail
21/07/05

Além da palestra em Fortaleza, Arthur Miller fará mais duas conferências no Brasil: em São Paulo, no dia 25 de julho, às 19h30, na Livraria Cultura; e no Rio de Janeiro, no dia 26 de julho, às 16h, no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. Os eventos são gratuitos, dispensam inscrição e terão tradução simultânea.