Pílulas filosóficas

Os habitantes do quintal estão cansados da matemática. O caracol lamenta carregar uma espiral nas costas o dia todo (“por que não um triângulo isósceles?”, questiona). A samambaia reclama de sua forma fractal, e a pinha, das sequências de Fibonacci usadas para explicar seu formato.

Eis que surge o anão de jardim pedindo calma e ponderando: “Essa questão de como a matemática, uma criação humana, explica tão bem o mundo natural é muito delicada.”

A cena faz parte de um vídeo produzido pela Universidade de Nancy, na França, que busca explicar, de forma lúdica e em poucos minutos, uma das questões mais intrigantes da ciência – levantada por Einstein e evocada pelo anão de jardim.

Pílulas científicas
‘Como é possível que a matemática, sendo produto da criação humana, independente da experiência, dê conta da realidade de forma tão admirável?’ A frase de Einstein é evocada pelo anão de jardim e resume a questão filosófica por trás de um dos vídeos da série ‘Filosofia em pedacinhos’. (foto: reprodução)

Este e outros três vídeos compõem a série intitulada ‘A filosofia em pedacinhos’ (La philosophie en petits morceaux, no original), criada para o 14º Congresso Internacional de Lógica, Metodologia e Filosofia da Ciência, a ser realizado em meados de julho na própria cidade de Nancy.

“Esses vídeos são destinados a um público amplo e pretendem dar uma ideia do que é a filosofia da ciência”, explica o documentarista e engenheiro Philippe Thomine, autor do conceito e realizador da série, em entrevista por e-mail à CH On-line.

Além da matemática da natureza, a série aborda outras questões instigantes, como a distinção entre uma teoria científica e a pseudociência, a relação entre causa e efeito e a mudança de paradigma científico.

“Escolhi o humor absurdo como tom geral porque as questões colocadas são difíceis e abstratas”

Parece difícil tornar compreensível para um público amplo questões tão abstratas e complexas. Para ajudar na dura tarefa, Thomine lançou mão do humor. “Escolhi o humor absurdo como tom geral porque as questões colocadas são difíceis e abstratas”, conta. “Esse humor pode levar o espectador a se perguntar ‘por que não seguir esse pensamento’? É meio maluco, mas é ao mesmo tempo engraçado e inteligente.”

Aliados às metáforas – consideradas pelo jornalista inglês John Walsh a única forma de explicar ciência para o “homem comum” –, o humor e a estética dos vídeos levam a um resultado bem divertido. E, diferentemente do que poderia parecer, as alusões a filósofos da ciência como Karl Popper (1902-1994) e Thomas Kuhn (1922-1996) não tornam os vídeos maçantes. Muito pelo contrário.

Assista ao vídeo da série ‘A filosofia em pedacinhos’, intitulado E então? É ciência ou não, com legendas em português


Isabela Fraga
Ciência Hoje/ RJ