Premiada teoria sobre inflação e desemprego

Edmund S. Phelps, vencedor do Nobel de Economia em 2006. (Foto: Columbia).

O pesquisador norte-americano Edmund S. Phelps, da Universidade de Columbia (Estados Unidos), foi o premiado deste ano com o Nobel de economia por uma análise sobre a relação entre inflação e desemprego que revolucionou o pensamento econômico. A teoria, desenvolvida no fim dos anos 60, desmontou a idéia vigente de que os governos seriam capazes de regular a taxa de desemprego, ainda que à custa de inflação. Desde então, as políticas econômicas da maior parte dos países se baseiam na hipótese de que quem controla a taxa de desemprego é o mercado.

A macroeconomia dos anos 60 se apoiava na chamada curva de Phillips, que sustentava que havia uma relação empírica inversa e previsível entre inflação e desemprego: quando a taxa de desemprego é alta, a inflação é baixa, e vice-versa. “Essa curva nos dava a idéia de que o governo tinha sempre a opção de diminuir o desemprego às custas de alguma inflação. Esse era o dilema”, explica o economista Franklin Serrano, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Essa concepção influenciou as políticas econômicas de muitos países desenvolvidos até os anos 70. Posteriormente, muitos governos abandonaram a teoria keynesiana (que defendia que o Estado poderia e tinha a obrigação de controlar a taxa de desemprego) e passaram a adotar a visão – até hoje polêmica e contestável – de que o desemprego é regulado apenas pelo mercado. Essa mudança de paradigma foi muito influenciada pelos estudos de Phelps e do também economista Milton Friedman, que originaram a chamada curva de Phillips ‘aumentada por expectativas’ ou curva de Phillips de Friedman-Phelps, substituta da curva de Phillips original. “Friedman ganhou o Nobel em parte por esse estudo em 1976. Dar o prêmio para Phelps agora foi de certa forma corrigir uma injustiça”, comenta Serrano.

Para os dois economistas, a relação entre desemprego e inflação seria alterada pelas expectativas de inflação. “Segundo eles, se o governo tentasse diminuir o desemprego aumentando a inflação, essa inflação inicial seria incorporada às expectativas de inflação permanentemente. E se o governo continuasse tentando estimular a economia, a inflação seria cada vez maior para a mesma taxa de desemprego”, explica Serrano. “No final, a tentativa de baixar a taxa de desemprego falharia ou levaria à hiperinflação.”

Logo após o surgimento dessa tese, os países desenvolvidos ingressaram em um período de alta de inflação com alto desemprego, o que colaborou para a grande aceitação da teoria de Phelps e Friedman. “Esse modelo é altamente influente até hoje. É só analisar, por exemplo, o governo Lula, que, apesar de ser de um partido de esquerda, tem metas apenas para a inflação e não tenta fazer nada quanto ao desemprego”, diz Serrano. Ele completa: “É irônico que o americano Phelps ganhe o prêmio agora, depois que a teoria de que o governo não consegue baixar a taxa de desemprego sem a inflação aumentar tenha falhado tão espetacularmente nos Estados Unidos nos anos 90.”

A regra de ouro da poupança
A escolha de Phelps para o Nobel deveu-se também à sua contribuição em relação ao problema normativo de qual seria a taxa desejável de poupança para um país maximizar o consumo per capita da população ao longo do tempo. Segundo Serrano, dentro da visão ortodoxa de que o mercado sozinho garante o uso eficiente do capital e do trabalho, poupar pouco significaria consumir mais hoje e ampliar menos o consumo no futuro, pois o investimento e o estoque de capital disponível seriam reduzidos. “Ao mesmo tempo, nessa teoria, o aumento do estoque de capital por trabalhador teria rendimentos marginais decrescentes, o que significa que esforços adicionais de poupança geram acréscimos futuros de consumo cada vez menores” explica Serrano.

Phelps calculou a chamada ‘regra de ouro’, que mostraria a taxa de poupança ideal para aumentar ao máximo o consumo no futuro, sacrificando ao mínimo o consumo no presente. Ele mostrou ainda que o mercado não necessariamente determinaria essa taxa de poupança ótima, o que sugeria que o governo deveria usar o sistema tributário para induzir o público a poupar no montante adequado.

Em seus demais trabalhos, Phelps deu continuidade às linhas de pesquisa abertas por essas duas principais contribuições. Ele tentou determinar precisamente os fatores que interferem na taxa de desemprego persistente determinada pelo mercado e incorporou os efeitos de investimentos em pesquisa e desenvolvimento ao modelo de crescimento em longo prazo.

Juliana Tinoco
Ciência Hoje On-line
09/10/2006