Quebra de simetria premiada

Da esquerda para a direita: Yoichiro Nambu, Makoto Kobayashi e Toshihide Maskawa (fotos: Scanpix / Kyodo-Reuters / Kyoto University).

O Nobel de Física deste ano vai para duas contribuições na área de física de partículas que permitiram compreender o mecanismo responsável pelo surgimento do universo. O norte-americano de origem japonesa Yoichiro Nambu descreveu a quebra de simetria na física subatômica. Os japoneses Makoto Kobayashi e Toshihide Maskawa ajudaram a explicar como ocorre a violação de um tipo específico de simetria.

Inicialmente, os físicos acreditavam que todas as interações existentes no universo obedeciam a regras de simetria. Mas, se essa premissa fosse verdadeira, quantidades iguais de matéria e antimatéria teriam sido geradas durante o Big Bang, há cerca de 14 bilhões de anos, e teriam aniquilado umas às outras, produzindo apenas radiação. Nesse caso, como seria possível explicar a origem do universo e de tudo o que existe nele – inclusive você, caro leitor?

A resposta para essa pergunta é que, por trás do surgimento do universo, estaria uma quebra de simetria, que se traduziu na existência de uma partícula extra de matéria para cada 10 bilhões de partículas de antimatéria, o que seria suficiente para originar galáxias, estrelas, planetas e a vida.

A descoberta do mecanismo de quebra de simetria na física de partículas elementares (os menores blocos formadores da matéria) foi feita por Nambu em 1960. Com base em sua teoria, postula-se que a simetria original entre as quatro forças que regem as interações no universo (gravitacional, eletromagnética, forte e fraca) teria sido destruída por um mecanismo – mais tarde denominado campo de Higgs – que também teria feito com que as partículas elementares adquirissem diferentes massas.

“A teoria de Nambu é a semente do mecanismo de Higgs, descrito quatro anos depois para explicar a origem das massas das partículas”, afirma o físico José Abdalla Helayël-Neto, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas.

A descrição matemática da quebra espontânea de simetria feita pelo físico norte-americano integra hoje o chamado modelo padrão, que unifica todas as partículas elementares conhecidas e três das quatro forças da natureza em uma única teoria para explicar as interações fundamentais da matéria. A gravidade ainda não foi incorporada à teoria.

“Talvez não haja área da física em que a quebra de simetria seja tão importante quanto na física de partículas elementares”, avalia o físico Carlos Alberto dos Santos, professor aposentado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e colunista da CH On-line.

Novas gerações de quarks

Uma quebra de simetria teria sido responsável pela predominância da matéria sobre a antimatéria na origem do universo (arte: Fundação Nobel).

Os estudos de Kobayashi e Maskawa, divulgados em 1972, ajudaram a explicar um outro tipo de quebra de simetria dentro do modelo padrão: a observada em interações que envolvem a chamada força fraca. Pesquisas anteriores haviam mostrado uma leve tendência à formação de maior quantidade de matéria do que de antimatéria nessas interações.

 

Para que essa violação de simetria fosse possível, os cientistas agora laureados previram a existência de pelo menos três gerações de pares de quarks (um dos dois elementos básicos que compõem a matéria, ao lado da ‘família’ dos elétrons). Na época, apenas o quark estranho havia sido experimentalmente comprovado.

 

As previsões de Kobayashi e Maskawa foram confirmadas posteriormente, com a detecção de três quarks de famílias diferentes em 1974, 1977 e 1994. A presença de duas dessas novas partículas poderia ter garantido a quebra de simetria que gerou a predominância da matéria sobre a antimatéria no universo.

 

Em 2001, os detectores de partículas BaBar, nos Estados Unidos, e Belle, no Japão, verificaram quebras de simetria independentemente. Os resultados foram exatamente iguais ao modelo previsto por Kobayashi e Maskawa quase três décadas antes.

 

As teorias premiadas estão sendo objeto de investigação no acelerador de partículas LHC (sigla em inglês para Grande Colisor de Hádrons), o maior empreendimento científico e tecnológico da atualidade, inaugurado recentemente na Suíça. “Acredito que o interesse que o LHC está suscitando pela física de partículas tenha motivado a revisão de grandes contribuições para esse campo”, diz José Helayël-Neto.

 

O LHC também irá tentar capturar o bóson de Higgs (partícula que origina a massa do universo). Segundo Carlos Alberto dos Santos, esse é o passo que falta para confirmar completamente o modelo padrão. “Prudentemente a Real Academia Sueca de Ciências garantiu o Nobel deste ano para os japoneses que previram as famílias de quarks, para deixar o do ano que vem para Higgs, depois que sua partícula for observada no LHC”, aposta. 

 

Pesquisadores:

 

Yoichiro Nambu nasceu emTóquio (Japão) em 1921 e é naturalizado norte-americano. Doutorou-se em1952 pela Universidade de Tóquio e é professor do Instituto EnricoFermi, na Universidade de Chicago (EUA).

 

Makoto Kobayashi nasceu em 1944 emNagóia (Japão). Doutorou-se em 1972 pela Universidade de Nagóia e épesquisador da Organização de Pesquisa do Acelerador de Alta Energia emTsukuba (Japão).

 

Toshihide Maskawa nasceu em 1940 noJapão. Doutorou-se em 1967 pela Universidade de Nagóia e é professor doInstituto Yukawa de Física Teórica, da Universidade de Quioto (Japão).

 

 

Thaís Fernandes

Ciência Hoje On-line

07/10/2008