Resgate da Alemanha de Weimar

Fim da Primeira Guerra Mundial. Com a Alemanha derrotada, a sociedade germânica se depara com a difícil tarefa de dar um perfil constitucional à sua recém criada república para que se mantenha a unidade do país. O fascínio que esse período desperta em muitos pesquisadores provém não do desfecho da reelaboração do sistema político nacional vigente, mas da efervescência intelectual na época em quase todos os campos da expressão e do saber.

Motivado por essas idéias, o jurista Gilberto Bercovici escreveu o livro Constituição e estado de exceção permanente ‐ atualidade de Weimar , no qual conta como a constituição elaborada na cidade alemã de Weimar condensou todas as tendências e forças políticas da época. Gilberto reconstitui o grande debate desse período a partir da ótica de alguns dos principais elaboradores da república de Weimar: Hermann Heller, representante das posições socialistas, e Carl Schmitt, defensor das correntes liberais positivistas que caminhariam para o nazismo. Outro personagem destacado é o economista Rudolf Hilferding do Partido Social Democrata (SPD).

Gilberto, que é professor associado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), relembra que, tanto na fase de redação do documento quanto nos 15 anos de vida do regime, a Europa passava por uma crise que encontrava na Alemanha sua expressão mais plena. A constituição seria então a responsável pela criação de uma ordem política moderna em uma sociedade dividida, empobrecida, desmoralizada e, no entanto, dotada de energias culturais, econômicas e políticas extraordinárias. Era preciso articular soluções políticas, jurídicas e econômicas para a construção do novo estado republicano.

O texto de Gilberto mostra como, na elaboração da Constituição de Weimar, esquerda e direita se opõem nos princípios defendidos para o novo estado alemão: o resultado foi um conjunto de leis que abarcava ao mesmo tempo um programa reformista para a sociedade e uma proposta conservadora na dimensão social e rupturista na institucional. Segundo o autor, o objetivo de seu trabalho é “buscar comparar as alternativas colocadas no debate de Weimar e suas perspectivas de concretização na conjuntura simultânea de crise econômica e de crise política”.

O jurista também aponta a atualidade dos temas em debate na Constituição de Weimar no último capítulo do livro. Gilberto mostra como as propostas de Carl Schmitt ajudam a entender uma série de questões contemporâneas ligadas à política, economia e direito internacional. Com isso, Gilberto faz uma reflexão sobre as nações situadas no “submundo do capitalismo” que passa por um processo de desestatização. “O que existe é um estado de exceção econômico permanente a que está submetida a periferia do capitalismo”, diz.

A leitura de Constituição e estado de exceção permanente não é complicada, mas exige muita concentração. A obra se dirige tanto ao leitor interessado quanto a pesquisadores, que vão encontrar 95 páginas de notas e referências bibliográficas. Fruto de um estudo minucioso, o livro de Gilberto tenta extrair lições do rico confronto de idéias do período tratado para entender o presente e a própria experiência constitucional brasileira. 

Constituição e estado de exceção
permanente – atualidade de Weimar

Gilberto Bercovici
Rio de Janeiro, 2004, Azougue Editorial
(fone: 2232-6374)
276 páginas – R$ 38

Renata Moehlecke
Ciência Hoje On-line
21/12/04