Sobrevivência em jogo

O poder de destruição da bomba atômica, que devastou as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial, fez surgirem profundas preocupações sobre a era nuclear. A grave situação gerada pela criação da bomba atômica e as medidas que poderiam evitar novas ameaças são tema de uma coletânea de artigos escritos por cientistas responsáveis pelo desenvolvimento da tecnologia nuclear e outras autoridades no assunto.

Publicado originalmente em 1946, poucos meses após o lançamento das bombas atômicas no Japão, o livro Um mundo ou nenhum foi recebido com curiosidade e em pouco tempo entrou para a lista dos mais vendidos. Agora, a obra é relançada pela primeira vez em décadas, em um momento marcado por ameaças terroristas e acusações de que países como Irã e Coréia do Norte estariam investindo em arsenais nucleares.

O 15 artigos que compõem o livro tentam ajudar os leitores a entender melhor as pesquisas que desencadearam a era nuclear e as implicações dessa nova realidade mundial. Os autores – entre eles, cinco ganhadores do Nobel, como o físico alemão Albert Einstein (1879-1955) e o físico norte-americano Robert Oppenheimer (1904-1967) – discutem de maneira franca a ameaça de destruição da civilização humana diante dos estragos da bomba atômica.

Além de demonstrarem preocupação em relação ao uso da tecnologia nuclear, os artigos explicam, em uma linguagem simples, a física por trás do desenvolvimento de uma bomba atômica. O texto acessível ao público leigo também é usado para responder possíveis dúvidas dos leitores, como o surgimento da energia nuclear.

Testemunha ocular
O físico norte-americano Philip Morrison (1915-2005), que participou do projeto da bomba atômica, visitou Hiroshima para investigar os efeitos do uso do dispositivo na cidade. Em seu artigo, Morrison relata o desespero das pessoas ao saberem que um único avião poderia lançar uma bomba capaz de destruir uma cidade inteira. “Uma compreensão mais clara e mais verdadeira só é possível se imaginarmos a bomba caindo em meio a prédios e pessoas que conhecemos bem”, avalia.

Já o físico norte-americano Edward Condon (1902-1974), que foi um dos pioneiros da mecânica quântica e participou do desenvolvimento das armas nucleares na Segunda Guerra Mundial, propõe uma reflexão em tom incisivo: “Se seu país está engajado em uma corrida de armamentos atômicos, você seria capaz de olhar com tranquilidade o grande mar de telhados em torno de sua casa, em sua cidade?”. Antes mesmo de conhecer o significado do terrorismo, Condon já avaliava as consequências de uma guerra nuclear.

Entre os destaques do livro está o artigo de Albert Einstein, que ganhou o Nobel de Física em 1921 e cujo trabalho teórico possibilitou o desenvolvimento da energia atômica. Einstein discute os perigos de se investir em guerras e faz questão de apontar ações que poderiam levar a uma solução para a segurança mundial.

Para o físico alemão, a primeira providência a ser tomada seria a realização de inspeções mútuas da produção de armas ofensivas entre as grandes potências militares e o intercâmbio de descobertas técnicas e científicas na área. O objetivo dessa medida preliminar seria a total desnacionalização do poderio militar, o que diminuiria o medo e a desconfiança entre as nações.

Um mundo ou nenhum traz ideias otimistas a respeito de tratados contra a proliferação do arsenal nuclear e apoia a criação de um sistema global de contenção nuclear, deixando sempre clara a valorização da vida humana. Ao divulgar de forma eficiente as implicações geradas pelo início da era nuclear, a obra se consolida como um primeiro passo rumo a um debate público e contribui para a construção de uma opinião sensata sobre o tema.

Um mundo ou nenhum: um relatório ao público
sobre o pleno significado da bomba atômica
Dexter Masters e Katharine Way (orgs.)
(trad.: Patricia de Queiroz Carvalho Zimbres)
São Paulo, 2008, Editora Paz e Terra
232 páginas – R$ 45,00
Tel.: (11) 3337-8399

Juliana Marques
Especial para a CH On-line
02/02/2009