Terapia gênica contra o glaucoma

Pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) obtiveram resultados preliminares animadores com o uso de terapia gênica para tratar o glaucoma, doença neurodegenerativa que atinge cerca de 70 milhões de pessoas no mundo e é a principal causa de cegueira bilateral. Em experimento feito com um rato em que o glaucoma foi simulado por meio da lesão do nervo óptico, a técnica impediu a degeneração de um tipo de célula da retina, processo associado à doença.

Na primeira fase do estudo, iniciado há oito anos, o grupo do neurofisiologista Rafael Linden, chefe do Laboratório de Neurogênese do Instituto de Biofísica da UFRJ, analisou as causas da vulnerabilidade dessas células da retina – chamadas ganglionares – após sofrerem uma lesão no nervo óptico. A sobrevivência dessas células depende, segundo o pesquisador, de suas conexões com alvos no nervo óptico. “Verificamos que a lesão no nervo faz com que o fator de transcrição Max, um dos que regula a expressão gênica da célula, seja excluído precocemente do núcleo celular e vá para o citoplasma”, conta.

Em seguida, a equipe avaliou, por meio de testes in vitro , se a morte das células ganglionares era provocada pela ausência do fator de transcrição Max no núcleo celular e se a superexpressão desse fator poderia impedir o processo. Os pesquisadores usaram então a técnica da terapia gênica para introduzir e aumentar a expressão do fator Max no núcleo das células.

“A taxa de degeneração de células extraídas da retina após a lesão do nervo óptico foi reduzida à metade”, conta Linden. Sem a introdução do fator Max, elas morriam após um dia.

Esses resultados levaram a equipe a testar o procedimento em um rato com glaucoma simulado por lesão do nervo óptico. Segundo Linden, a degeneração das células da retina do animal foi reduzida em 100%, ou seja, não houve morte celular. Além disso, os vetores usados para introduzir o fator Max nas células se mostraram seguros, pois permaneceram por cerca de um ano e meio no organismo do animal sem gerar qualquer resposta inflamatória ou provocar efeitos no sistema imune.

“Esses são resultados muito preliminares”, reforça o pesquisador. “Eles nos permitem perguntar se o emprego do fator de transcrição Max com vetores seguros poderá constituir uma nova abordagem de terapia gênica para glaucoma e outras neuropatias ópticas hereditárias.” Linden conta que atualmente há várias cirurgias para tratar o glaucoma, mas elas só são recomendadas em casos específicos, quando existe aumento de pressão intraocular.

Os próximos passos
Segundo o pesquisador, agora é preciso testar o procedimento em outros modelos: a indução do glaucoma por grande aumento da pressão intraocular e a introdução de glaucoma crônico em animais. “Sabe-se que a morte das células ganglionares se inicia com a lesão no nervo óptico, mas não sabemos se há outros fatores”, justifica. E completa: “Só poderemos dizer se a terapia é bem sucedida caso os resultados sejam bons também nesses modelos.”

Linden destaca que, para impulsionar as pesquisas em terapia gênica no Brasil, desde o estágio mais básico até os ensaios clínicos, foi criado em 2005 o Instituto do Milênio – Rede de Terapia Gênica. A rede, coordenada por ele, reúne 14 laboratórios de três estados (São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro) que trabalham em diversas áreas. Além desses grupos, apenas outros dois fazem pesquisa com terapia gênica no país.

Para o pesquisador, esse número é muito pequeno em comparação com o de outros países, mas os avanços conquistados são importantes. “É uma estrada longa e tortuosa, mas estamos seguindo, usando a associação entre grupos de pesquisa para tirar o máximo proveito dos resultados.”

Thaís Fernandes
Ciência Hoje On-line
13/07/2007