Vá e seja careta

A expressão em inglês be there or be square – algo, em português, como “vá ou seja careta” – nunca foi tão adaptada como agora. Atualmente, a moda nos Estados Unidos é o be there and be square. E quem mais mandaria ir a algum lugar e ser careta senão aqueles que sempre tiveram fama de antiquados?

Sim, os nerds – há algum tempo – contra-atacaram. O tal be there and be square, por exemplo, é lema da Nerd Nite, uma noite nerd promovida, há cerca de quatro anos, em Nova Iorque, no Galapagos Art Space, um espaço inicialmente destinado a eventos com pessoas descoladas do meio artístico.

Regra dos eventos: aproveitar a distância do etos acadêmico para falar, sem medo de ser feliz, sobre ciência

Uma matéria recente do New York Times deu destaque não apenas ao Nerd Nite, mas a vários eventos que estão ocorrendo simultaneamente pela cidade estadunidense. O jornal trata como “um fenômeno” o crescimento vertiginoso das noites científicas acontecendo em bares, restaurantes e centros culturais – enfim, fora do ambiente acadêmico.

Mas o que exatamente rola nesse tipo de evento?

O conteúdo varia mais do que a forma. Em geral, um palestrante escolhe um assunto de sua predileção e fala, às vezes informalmente e muitas vezes com ajuda do bom e velho Power Point, sobre o assunto que lhe convier, contanto que haja – claro – alguma ligação com o conhecimento científico.

A regra: aproveitar a distância do etos acadêmico para falar, sem medo de ser feliz, sobre ciência.

“As pessoas podem nem saber que têm interesse em determinado assunto até ouvir falar sobre ele”, diz ao NYT Margareth Mittelbach, escritora e editora que criou o Clube Secreto da Ciência, que acontece há cinco anos no Bell House, um bar da cidade.

“As pessoas não têm nada a perder”, completa.

É possível achar no Youtube vídeos de cientistas falando, informalmente e para uma plateia animada – a cerveja é permitida durante as palestras –, sobre o funcionamento do Grande Colisor de Hádrons e os mistérios que envolvem o bóson de Higgs.

Rende muito também assuntos da cultura pop. Basta ver o vídeo (abaixo) da palestra sobre a psicologia na série Crepúsculo, que aconteceu durante um evento da Nerd Nite e tentou responder, de modo menos científico que bem-humorado, por que a humana Bella não pode resistir ao vampiro Edward.

O NYT cita outros eventos de ciência pouco usuais que vêm ocorrendo ao redor de Nova Iorque. Todos com essa tática inteligente de apostar no meio termo entre cultura pop e ciência de fronteira. Se um dia a investigação é sobre “métodos não balísticos para se matar zumbis”, o outro guarda palestra sobre a astrofísica e cosmologia nos dias de hoje.

Esse tipo de evento que visa desmistificar o fazer científico e sua divulgação acontece, há anos, em vários países. Na Inglaterra, por exemplo, há o Cafe Scientifique, que conta com dezenas de ‘filiais’ ao redor do mundo.

Poucos eventos no país

O Brasil, por meio do Conselho Britânico, promove, bem esporadicamente, Cafes Scientifiques, mas de modo um tanto formal para nós brasileiros – naturalmente mais informais que os ingleses – e pouco descontraído, dentro de instituições, à semelhança de uma exposição em sala de aula.

Temos notícia de outras iniciativas bem-intencionadas, porém bissextas, que ocorrem no país, como o Chopp Científico, promovido no Rio de Janeiro por pesquisadores e professores da Fiocruz e da UFRJ, e o Cachaça Científica de Florianópolis, organizado pela mesma equipe da Fiocruz e por membros da UFSC.

A mesma turma da Fiocruz ainda organizou entre 2010 e 2011 o Sarau Científico, uma série de eventos que misturou arte e ciência para falar a um público jovem de assuntos polêmicos, como células-tronco e transgênicos.

No Rio de Janeiro, cidade-sede do Instituto Ciência Hoje, frequentamos alguns eventos promovidos pela Casa da Ciência, como o cineclube Ciência em Foco e o ciclo de debates Ciência para Poetas,  além da série de palestras acessível e menos formal organizada pela SBPC – o Ciência às Seis e Meia.

Faltam no Brasil mais eventos com essa leveza e informalidade trazida pela dupla “bar + ciência”

Perguntamos aos leitores em nossas redes sociais se eles tinham conhecimento de algum evento similar aos descritos no NYT – consagrado e com periodicidade definida – em suas cidades. Não tivemos muito retorno, com exceção de um evento que não conhecíamos e pareceu interessante: o conjunto de palestras Conversa ao pé do físico, promovido pelo Instituto de Física da UFRGS, que acontece há dois anos na Fnac de Porto Alegre.

Porém, notoriamente faltam no país mais eventos com essa leveza e informalidade trazida pela dupla “bar + ciência”. As duas palavras na mesma sentença fazem uma alegoria difícil de superar.

Se o leitor souber de algo assim acontecendo pelo Brasil, conte para a gente. A caixa de comentário está aberta.

Thiago Camelo
Ciência Hoje On-line