Vem aí o genoma do mosquito da malária

Está praticamente concluído o sequenciamento do genoma do Anopheles darlingi, mosquito vetor da malária na Amazônia. O trabalho, realizado por um consórcio de pesquisadores de mais de 30 universidades e centros de pesquisa das cinco regiões do Brasil, marca a entrada do país na era do sequenciamento de genomas de alto desempenho.

“Já temos 90% do genoma sequenciado e montado e o trabalho deve estar concluído até o mês que vem”, contou a bióloga Ana Tereza de Vasconcelos, pesquisadora do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC) e uma das coordenadoras do projeto.

“Vamos publicar em breve um rascunho do genoma com uma qualidade muito boa e devemos conseguir anotar a maior parte das proteínas,” anunciou a pesquisadora, ao apresentar os resultados do projeto na 61ª reunião anual da SBPC.

O Anopheles darlingi é o mosquito que carrega o protozoário do gênero Plasmodium causador da malária, a doença parasitária que mais provoca prejuízos econômicos no mundo – ela ameaça 3,3 bilhões de pessoas, segundo a Organização Mundial da Saúde. Os dados gerados pelo consórcio brasileiro serão comparados com as sequências do Anopheles gambiae, vetor da doença na África, que teve um rascunho de seu genoma publicado em 2002 por uma equipe internacional.

Essa comparação já está sendo feita com o auxílio do Sabiá, software desenvolvido no Brasil para a anotação de genomas (o nome é a sigla em inglês para Sistema para anotação integrada bacteriana automatizada). “Dos 18 mil grandes pedaços do genoma [contigs] do Anopheles darlingi que temos hoje, 13 mil são parecidos com os do A. gambiae”, antecipa Vasconcelos. “Conseguimos identificar proteínas que provavelmente pertencem às duas espécies e algumas outras – provavelmente as mais interessantes – devem estar nos outros contigs.”

Novo capítulo para a genômica brasileira

O sequenciador de alto desempenho 454 FLX, usado para decifrar o genoma do Anopheles darlingi. Os dados obtidos foram complementados por sequências geradas com máquinas da geração anterior (foto: Roche).

Boa parte do trabalho foi realizada com um sequenciador de alto desempenho fabricado pela empresa norte-americana 454 Life Sciences, do modelo FLX, com uma nova tecnologia chamada de sequenciamento por arranjos cíclicos.

 

Essa nova geração de sequenciadores permite “ler” as bases nitrogenadas que compõem o genoma de forma muito mais rápida que os aparelhos da geração anterior, usados até então no Brasil – a máquina é capaz de sequenciar 500 milhões de pares de bases de DNA em apenas dez horas. “Este é um novo capítulo para a genômica brasileira”, comemora Vasconcelos.

 

As sequências do Anopheles

foram os primeiros dados gerados pelo aparelho, instalado no LNCC, em Petrópolis (RJ). O sequenciador, comprado no ano passado por R$ 2,1 milhões pelo Ministério da Saúde, é o primeiro do tipo a gerar dados no Brasil (há um outra máquina do gênero na Universidade de São Paulo, que ainda não produziu dados).

 

O sequenciador de nova geração foi posto em operação em janeiro deste ano e já está sendo usado para diversos projetos. Um dos mais importantes é o sequenciamento de genes de células tumorais de mama e de células normais de uma mesma paciente, que deve ajudar a entender as alterações genéticas envolvidas no surgimento do câncer.

 

Outro projeto que envolve o novo sequenciador é a análise do genoma de microrganismos capazes de realizar a fixação biológica de nitrogênio, como a bactéria Rhizobium tropici.

A descrição de genes envolvidos nesse processo pode ter aplicações industriais de grande interesse, pois o nitrogênio necessário para culturas como a de soja é todo proveniente da fixação biológica.

 


Bernardo Esteves

Ciência Hoje On-line

16/07/2009

 

Confira a cobertura completa da 61ª Reunião Anual da SBPC