“Você está ficando relaxada…”

O destaque de capa da CH de novembro será uma longa reportagem sobre o uso clínico e os fundamentos científicos da hipnose. Para prepará-la, nossa repórter Isabela Fraga topou ser hipnotizada, no melhor estilo do jornalismo gonzo.

Como um aperitivo para a próxima edição, conversamos com a repórter sobre a sessão de hipnose à qual ela se submeteu. Confira como foi essa experiência no bate-papo abaixo.

 

CH On-line: Qual será o mote da matéria?

Isabela Fraga: A matéria é sobre hipnose, seus usos clínicos e seus embasamentos científicos. Dei um foco especial sobre o que se sabe da atuação da hipnose no cérebro. Esses estudos neurocientíficos ainda são relativamente recentes (se comparados com a própria hipnose, cujo início formal tem séculos).

O que é feito nesses estudos: os cientistas dão uma ideia de quais regiões cerebrais são ativadas ou desativadas durante os vários estágios da hipnose e de acordo com as sugestões feitas ao paciente. Acho que a ideia principal da matéria é tentar desvincular a hipnose da imagem que ela tem no imaginário comum – uma prática de palco, relacionada à mágica e misticismo, em que as pessoas imitam galinha e fazem coisas bizarras.

E como se deu a escolha de um profissional para hipnotizar você?

Bom, eu precisava de um hipnoterapeuta do Rio [onde funciona a redação da CH] e que fosse ligado a alguma universidade (requerimento básico da revista). A Célia Cortez, nome escolhido, é uma das poucas cariocas que estudam hipnose e fazem consultas de hipnoterapia. Ela é da Uerj [Universidade do Estado do Rio de Janeiro] e tem um consultório em Ipanema. Ela foi recomendada por alguns pesquisadores de São Paulo e participa de vários congressos sobre o tema.

Como foi a experiência de ser hipnotizada?

Ela é uma hipnoterapeuta. Então, antes de tudo, perguntou o que eu queria tratar – algum traço na minha personalidade que me atrapalhava e incomodava. Sem hesitar falei que, por ser tímida, tinha dificuldade para falar em público. Sentei-me numa poltrona reclinável que virava praticamente um divã, ela ligou uma musiquinha calma, dessas de relaxamento, e começou a falar um dos únicos clichês da hipnose que permanecem numa sessão real: “Você está ficando relaxada… você está ficando relaxada…”. Ela usou então uma técnica chamada relaxamento progressivo, que consiste em me fazer focar a atenção (mesmo de olhos fechados) em partes do corpo, de baixo para cima: pés, pernas, quadril, abdômen, tórax, ombros, pescoço, rosto etc.

E deu certo?

No início, fiquei um pouco cética, porque a voz calma demais me fazia ter vontade de rir. E eu não conseguia relaxar de fato. Depois de um tempo, resolvi pagar pra ver – a curiosidade foi maior. Fiquei bem relaxada nessa primeira parte. Ela começou a usar metáforas para aprofundar meu relaxamento: “Imagine que você está vendo uma escada rolante para um andar abaixo na sua frente. Você pisa nela.”

Com isso, ela me fez descer três andares. E pediu que eu me lembrasse de situações da minha infância que tivessem relação com público. Lembrei-me de quando eu tinha 12 anos. Ela me pediu que fosse ainda mais atrás. Lembrei-me de quando tinha uns oito, nove. Ela pediu para que eu recuasse mais. Aí lembrei-me – meio vagamente – de uma peça de que participei na escolinha quando tinha uns cinco anos.

Ela pareceu satisfeita e começou a tentar mudar minha imagem em relação com aquela situação (e com as outras): por que eu sentia vergonha de público? Tinha errado em alguma coisa? Sido criticada?

E assim foi. Depois disso, ela me ‘fez’ andar num ambiente calmo (uma praia) e, depois, subir os três lances de escada, respirar profundamente e abrir os olhos. Quando abri, a sensação foi como se eu tivesse acabado de acordar, mas claro que não estava dormindo.

Mas você se lembra de todo processo ou em algum momento ‘apagou’?

Fiquei bastante consciente de tudo, e não me pareceu nada mágico ou fantástico. Mas me senti muito relaxada, acho que foi isso que ficou. Como se estivesse quase dormindo, os olhos pesados. Não acho que ter lembrado de quando tinha cinco anos tenha sido algo incrível que só a hipnose consiga fazer, mas sem dúvida estar relaxada ajudou.

Depois de ser hipnotizada, você mudou alguma ideia prévia que tinha sobre o método?

Quando comecei a fazer a matéria, me dei conta de que hipnose não é nada do que eu – e a grande maioria das pessoas, creio – pensava. Não é nada místico, fantástico ou mágico. Não imitei uma galinha, não pulei de um prédio e nunca teria feito isso.

Thiago Camelo

Ciência Hoje On-line