A queda de um meteorito de 17 metros de comprimento em fevereiro na cidade russa de Chelyabinsk chamou a atenção do mundo por deixar mais de 1.500 feridos e muita gente assustada. Agora que as pessoas já iam se esquecendo do acontecido, um novo estudo mostra que eventos semelhantes podem ser de duas a dez vezes mais comuns do que se pensava.
Nosso planeta recebe aproximadamente 100 toneladas de material cósmico todos os dias, entre eles, pequenos asteroides e fragmentos liberados por cometas. A maior parte dessa ‘chuva’ é formada por partículas muito pequenas que não vencem a entrada na atmosfera.
Até hoje, estimava-se que cerca de 500 asteroides por ano conseguiam ultrapassar essa barreira e chegar à Terra, como pequenos meteoritos. Segundo as estatísticas, só muito de vez em quando, a cada 150 anos, algum meteorito de maior impacto, como o de Chelyabinsk, cairia por aqui.
Mas, depois de comparar os registros sobre queda de meteoritos dos últimos 20 anos com informações de telescópios e dados de sensores de infrassom espalhados pelo mundo todo, uma equipe internacional de pesquisadores que estudava o meteorito russo viu que a conta está defasada.
Assista à queda do meteorito russo
Os sensores de infrassom, usados para detectar atividade nuclear na atmosfera e prevenir ataques bélicos, servem também para identificar a onda sonora provocada pela passagem de meteoritos pela atmosfera.
Os dados desses sensores mostram que, nas últimas duas décadas, cerca de 60 asteroides entre 10 e 20 metros de comprimento colidiram com a atmosfera terrestre. Segundo os pesquisadores, provavelmente os objetos não foram vistos porque se consumiram antes de chegar ao solo ou caíram em áreas remotas ou no oceano, que cobre 2/3 da Terra.
“Quando olhamos para esses dados e extrapolamos, vemos que eventos como o de Chelyabinsk podem ocorrer a cada 30 anos aproximadamente, muito mais frequentemente do que imaginávamos”, diz o físico Peter Brown, pesquisador da Universidade do Oeste de Ontário (Canadá) e líder do estudo, publicado na Nature.
Mais duas pesquisas sobre o meteorito de Chelyabinsk foram publicadas simultaneamente: uma delas, também na Nature, apresenta uma possível origem para o meteorito; a outra, na Science, analisa o impacto do objeto na cidade russa.
‘Pequena’ ameaça
Os asteroides de maior porte, acima de 50 metros de comprimento e com capacidade para destruir cidades inteiras, estão bem mapeados. São conhecidos mais de 10 mil próximos à Terra e nenhum deles apresenta risco elevado de colisão conosco.
Mas os de menor tamanho, como o de Chelyabinsk, ainda são mal conhecidos. Pouco mais de mil foram detectados e tiveram sua órbita estudada, enquanto a previsão é de que existam cerca de 20 milhões. “Há um número impensável de objetos com cerca de 10 metros perto da Terra, sem órbita determinada, que suspeitamos que sejam asteroides”, pontua Brown.
- Os pesquisadores analisaram os dados de sensores de infrassom espalhados pelo mundo capazes de detectar o rastro sonoro deixado pela onda de choque de meteoritos. (foto: Nikita Plekhanov)
Embora sejam potencialmente numerosos e perigosos, não há como saber quais desses ‘pequenos’ asteroides sobreviveriam à entrada na atmosfera terrestre e se tornariam meteoritos. A astrônoma Elizabeth Zucolotto, do Museu Nacional/ UFRJ, explica que, mesmo que fosse possível prever a queda de um desses objetos, seria impossível avaliar todas as variáveis envolvidas.
“Depende de muitos elementos, como o seu tamanho, constituição, velocidade, forma e ângulo de entrada na atmosfera”, diz. “Se ele vem com uma velocidade menor, vai sendo freado pelas camadas atmosféricas e pode chegar ao solo.” E continua: “Já se tiver formato aerodinâmico e vier com maior velocidade, vai se desgastar e pode se consumir antes disso. O material também importa: um asteroide rochoso se fragmenta mais facilmente que um metálico, por exemplo.”
Monitorar e prever
Peter Brown alerta para a urgência de monitorar esses asteroides de menor porte. “Identificar todos eles levaria muito tempo, mas podemos pensar em sistemas que detectem sua aproximação e nos deem alguns dias para nos prepararmos”, diz.
Algumas iniciativas com esse objetivo já estão programadas. Uma delas é o projeto Atlas, desenvolvido por astrônomos da Universidade do Havaí (EUA), com o apoio financeiro na Nasa, para construir uma rede de vigilância de asteroides.
Prevista para ser implantada em 2015, a rede vai ser constituída de oito telescópios com câmeras de alta resolução que varrerão o céu duas vezes por noite em busca de ameaças.
Segundo a página projeto, ele será capaz de detectar com antecedência de um dia a colisão de um asteroide de 30 quilotons de energia (o equivalente a uma bomba atômica) e até uma semana antes a chegada de um asteroide com 5 mil quilotons (dez vezes mais energético que o de Chelyabinsk).
Zucolotto também ressalta a necessidade de mais estudos sobre meteoritos no Brasil. A astrônoma defende a implantação de uma rede nacional de câmeras AllSky, que monitoram o céu noturno e detectam a entrada de meteoritos. “Não temos observação precisa, ninguém fica olhando para o céu dia e noite para ver se vai cair um meteorito ali”, diz. “Com essas câmeras, podemos estudá-los melhor e descobrir o local exato onde vão cair.”
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line