Aquecimento global pode escassear furacões

 

As previsões costumavam citar o aumento da freqüência de furacões e tempestades tropicais como um dos impactos do aquecimento global. No entanto, um estudo norte-americano acaba de apontar o contrário: esses eventos climáticos podem se tornar mais escassos nos próximos anos no Atlântico Norte. Por outro lado, a intensidade das chuvas associadas a esses fenômenos tende a aumentar.

Essas foram as conclusões de pesquisadores da NOAA, agência estatal norte-americana voltada para o estudo dos oceanos e da atmosfera. A equipe desenvolveu um modelo de previsão diferente dos adotados atualmente, adaptado para o monitoramento do Atlântico Norte. Os resultados foram publicados esta semana na revista Nature Geoscience.

O modelo leva em consideração a interação do Atlântico Norte com os demais oceanos localizados em áreas tropicais. De acordo com o meteorologista da NOAA Thomas Knuston, um dos autores do artigo, a principal causa do recente aumento do número de furacões e tempestades tropicais foi o maior aquecimento do Atlântico Norte em relação às demais bacias oceânicas.

Knutson conta que essa área é propícia para o surgimento de furacões devido à formação de zonas de baixas pressões – áreas com temperatura mais alta para onde convergem os ventos das altas pressões. “Como a temperatura dos demais oceanos é menor que a dessa porção do Atlântico Norte, a circulação dos ventos se intensificou, o que causou um aumento no número desses fenômenos”, explica ele.

Para os próximos anos, o modelo elaborado pela equipe do NOAA aponta que o aquecimento do planeta também causará o aumento da temperatura das demais bacias oceânicas. Com isso, a diferença de pressão tenderá a se reduzir, o que dificultará a formação de sistemas de baixa pressão como os furacões e as tempestades tropicais.

Outro fator importante para o desenvolvimento de um furacão é a grande diferença de pressão do ar entre a superfície marinha e as grandes altitudes, o que possibilita uma circulação intensa de ventos na vertical. “No modelo gerado em nosso trabalho, constatamos que o aumento da temperatura do planeta torna essa diferença de pressão menor, o que enfraquece a circulação”, acrescenta Knutson.

“Contudo, isso não significa que esses fenômenos perderão intensidade. Devido à temperatura mais elevada da superfície do mar, seu poder de destruição será cada vez maior”, alerta o pesquisador. “Vale lembrar que são as altas temperaturas na superfície do mar que fornecem umidade para ‘alimentar’ o furacão. Por isso o furacão se dissipa ao atingir o continente, pois perde sua fonte de energia”, esclarece.

Catarina e o Atlântico Sul

Imagem do Catarina, que muitos pesquisadores consideram o primeiro furacão conhecido no Atlântico Sul, que atingiu o sul do Brasil em 2004 – a fotografia, em cores naturais, foi obtida pelo satélite Terra (foto: Nasa).

Questionado sobre o Catarina, ciclone extratropical com características de furacão que atingiu a costa sul brasileira em abril de 2004, Knutson afirma que o seu método de análise não é capaz de solucionar as dúvidas que permanecem até hoje sobre a natureza do fenômeno. Mas ele reconhece a importância de se criar modelos que esclareçam a formação de ciclones no Atlântico Sul.

Knutson explica à CH On-line que a região onde o Catarina se formou pode se tornar uma área propensa para o desenvolvimento de tempestades mais intensas e até de furacões. “Essa é uma questão muito fascinante e ainda pouco esclarecida, que requer muitos estudos”, avalia. “Por isso ainda não é possível afirmar que o aquecimento global ou os fatores humanos influenciaram na formação do Catarina.”

Muitos cientistas admitem que o Catarina pode ter sido um furacão de categoria dois, com ventos entre 154 e 177 quilômetros por hora – um tipo de fenômeno que os especialistas não imaginavam ocorrer no Atlântico Sul. A peculiaridade desse fenômeno foi que ele se iniciou como um ciclone extratropical, muito comum no sul do Brasil, e, em vez de se deslocar para leste no Atlântico Sul, mudou sua trajetória em direção ao continente, a oeste.

Evidências mostram que a temperatura da superfície do mar nessa área, que costuma ser de menos de 24 graus, estava maior do que o normal. Isso pode ter contribuído para aumentar ainda mais a energia desse sistema, que causou prejuízos para diversas cidades litorâneas. Para saber mais o Catarina, o Katrina e a relação entre furacões e aquecimento global, leia o artigo de capa da CH 221 .

Andressa Spata
Ciência Hoje On-line
19/05/2008