Uma bactéria capaz de sobreviver em ambientes contaminados com metais pesados acaba de ganhar uma nobre função graças à engenharia genética. A Cupriavidus metallidurans CH34 foi modificada geneticamente para fixar em sua membrana inúmeros metais, como chumbo, zinco e cádmio, os mais tóxicos encontrados no ambiente, e ajudar assim na despoluição de efluentes industriais.
Em seu estado natural (à esquerda), a CH34 agrega pouca quantidade de metais – como o chumbo (nas fotos) – em sua membrana. Modificada geneticamente (à direita), a bactéria é capaz de manter os íons metálicos na sua superfície em níveis muito superiores aos do micro-organismo selvagem (imagens: Ronaldo Biondo).
Para conferir essa nova característica à CH34, o engenheiro químico Ronaldo Biondo, que desenvolveu a pesquisa no Programa de Pós-graduação em Biotecnologia da Universidade de São Paulo (USP), produziu em laboratório um gene sintético que codifica uma proteína que tem alta afinidade por metais pesados.
Por meio de técnicas de engenharia genética, o pesquisador fez com que a proteína passasse a ser produzida na bactéria, onde é transportada até a membrana e se mantém ligada à superfície, passando a retirar os metais do ambiente. “A proteína sintética não alterou o desenvolvimento da bactéria, que permanece saudável durante o processo”, diz Biondo, que há quatro anos estuda a CH34, micro-organismo ainda pouco conhecido no Brasil.
Com a modificação genética, a bactéria consegue agregar e manter na sua superfície os íons metálicos do ambiente em níveis muito superiores aos da bactéria selvagem. Em seu estado natural, a CH34 também aglutina metais, mas, devido a sistemas naturais de resistência, em pouco tempo eles são expulsos novamente para o ambiente. “Além de não ser patogênica, a CH34 modificada geneticamente passa a ser biorremediadora”, destaca o pesquisador.
Testes realizados em laboratório comprovaram a eficiência da CH34 na remoção de metais pesados de efluentes. “A bactéria poderá recuperar metais de efluentes contaminados provenientes de indústrias e até mesmo do esgoto doméstico”, diz Biondo.
Reaproveitamento dos metais
Atualmente, a equipe trabalha no cultivo das bactérias transgênicas em um recipiente fechado chamado biorreator, que permite a passagem de líquidos e funciona como um filtro. “Alimentamos o biorreator com efluente contaminado e, ao mesmo tempo, procuramos manter uma concentração adequada de bactérias, para que o resíduo saia com níveis aceitáveis de metais, de acordo com o estabelecido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente [Conama],” explica Biondo.
Depois que a capacidade das bactérias de fixar os íons metálicos se esgota, é preciso descarregar o biorreator para incinerá-las e evitar sua dispersão no ambiente. Dessa forma, os metais retirados do efluente podem ser separados e reaproveitados.
A bactéria modificada está sendo patenteada e em breve deve começar a ser usada por uma mineradora, que financiou o estudo. “A CH34 será um importante instrumento para a despoluição de efluentes”, aposta Biondo, que já recebeu dois prêmios científicos pela pesquisa.
Juliana Marques
Ciência Hoje On-line
23/01/2009