Brasileiros publicam genoma de bactéria amazônica

Na mesma semana, a genômica brasileira emplacou em importantes periódicos científicos mundiais artigos que relatam o seqüenciamento do DNA de dois seres vivos. Em 15 de outubro, a revista britânica Nature Genetics publicara a descrição de 92% dos genes do verme Schistosoma mansoni , assinada por cientistas paulistas. No dia 18, foi a vez da revista americana Proceedings of the National Academy of Science ( PNAS ) antecipar em seu site a publicação do artigo que esmiúça o código genético da Chromobacterium violaceum .

A C. violaceum , que teve seu genoma decifrado, é abundante no rio Negro, na Amazônia (foto: Márcia Attias / UFRJ)

O seqüenciamento completo do genoma dessa bactéria, que ocorre no Rio Negro e tem importante interesse medicinal e industrial, havia sido concluído em dezembro de 2001, mas faltava compartilhar os resultados com a comunidade científica. E foi isso que fizeram os membros do Consórcio Nacional Brasileiro para o Seqüenciamento de Genomas, uma rede de 25 laboratórios espalhados por todo o país.

O artigo da PNAS tem seis páginas e é assinado por 109 pesquisadores. O autor principal é o geneticista britânico Andrew Simpson, do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, que coordenou o trabalho em rede dos laboratórios. Além de oferecer um panorama geral das 4,75 milhões de ‘letras’ que compõem o genoma da bactéria, o artigo procura compará-lo com o DNA de outros microrganismos já seqüenciados.

A análise mostra que ela tem similaridade de 17,4% com a bactéria fitopatógena Ralstonia solanacearum e de quase 10% com a Neisseria meningitidis ou a Pseudomonas aeruginosa , que podem provocar doenças e infecções no homem.

A C. violaceum é conhecida pela ciência desde o fim do século 19, mas os estudos feitos sobre ela se limitavam à violaceína. Esse pigmento produzido pela bactéria tem grande potencial de uso na medicina: ele apresenta ação antibiótica contra microrganismos como Mycobacterium tuberculosis , Trypanosoma cruzi ou Leishmania sp. Suspeita-se ainda que ele tenha ação antiviral e anticancerígena.

No entanto, quase nada se sabia sobre a C. violaceum em escala genética e molecular. Daí a importância de se seqüenciar seu genoma. O trabalho, afirmam os cientistas brasileiros no artigo, “revelou um retrato detalhado da complexidade molecular necessária para a versatilidade do organismo”.

É essa versatilidade que explica “sua habilidade para tolerar uma variedade de condições ambientais relativamente severas, que inclui a escassez de nutrientes, altas temperaturas, altos níveis de radiação e concentrações elevadas de agentes tóxicos”. Resta esperar agora que os resultados do seqüenciamento sirvam logo de base para novos estudos que permitam explorar essa habilidade.

Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line
22/09/03