Carona indesejada

Expedições espaciais podem levar micro-organismos da Terra para outros planetas e contaminá-los, com implicações éticas e biológicas que não devem ser desprezadas. Países e instituições que atuam na exploração espacial deve reforçar suas políticas de proteção para que a contaminação biológica seja reversível, caso aconteça.

O alerta é do cientista planetário Christopher P. McKay, do Centro de Pesquisas Ames, ligado à Nasa. Em artigo publicado na Science da última sexta, ele apontou algumas preocupações que deveriam ser levadas em conta em uma oficina a ser realizada este ano para discutir as implicações éticas da exploração de Marte.

Representação artística do jipe Spirit, enviado pela Nasa para explorar a superfície de Marte. Esse robô e seu irmão gêmeo, Opportunity, teriam levado centenas de milhares de bactérias para Marte, que certamente não sobreviveram às condições inóspitas do planeta (arte: Nasa/JPL /Cornell Univ.).

McKay discutiu o caso específico da política de proteção a Marte definida pelo Comitê de Pesquisa Espacial (Cospar, na sigla em inglês). Os primeiros artefatos terrestres a passar pelo planeta vermelho foram as sondas Vikinkg, em 1976 – ambas foram esterilizadas por calor. Depois disso, o Cospar determinou que a esterilização das naves não seria mais necessária, devido às condições inóspitas de Marte, a menos que a busca de vida naquele planeta fosse um dos objetivos da expedição.

Em 2003, o Cospar reviu sua orientação e estabeleceu medidas de proteção suplementares definidas em função do objetivo da expedição. Uma delas foi a instauração de “regiões especiais” em Marte, nas quais micro-organismos terrestres teriam condições para sobreviver e se multiplicar. “Para expedições nessas regiões, a esterilização por calor em todas tornou-se necessária em todas as naves”, conta o cientista planetário no artigo da Science.

A medida pode parecer exagerada. Porém, na eventualidade de se encontrar vida no planeta vermelho, é fundamental minimizar qualquer impacto possível sobre esses organismos. “A contaminação de Marte, por uma bactéria terrestre que seja, pode ser uma questão séria de ética ambiental”, ressalta McKay.

Centenas de milhares de bactérias
Bactérias terrestres já foram enviadas a Marte. Estima-se que os jipes Rover e Opportunity, lançados pela Nasa para explorar a superfície do planeta vermelho, tenham carregado consigo centenas de milhares de micro-organismos. No entanto, eles certamente não resistiram às condições de Marte e à exposição à radiação ultravioleta do Sol.

A contaminação feita até agora em Marte, segundo McKay, é reversível, pois as missões enviadas para o planeta foram todas de caráter superficial. Contudo, a eventual exploração de cavernas e aquíferos subterrâneos exigiria medidas de esterilização mais rigorosas, pois esses ambientes estão ao abrigo da radiação ultravioleta.

Na opinião de McKay, as discussões da oficina a ser realizada este ano devem se pautar pela precaução. “Proponho que o Cospar institua políticas para que todas as explorações em Marte – inclusive as humanas – sejam biologicamente reversíveis”, defende.

Isabela Fraga
Ciência Hoje On-line
09/02/2009