O físico e educador francês Maurice Bazin defendia a concepção de um aprendizado mais livre e autônomo da ciência, por meio do contato direto com o experimento científico. A experiência de Modesto Tamez, membro do Instituto de Professores do museu Exploratorium, localizado em São Francisco, nos Estados Unidos, parece mostrar que a premissa, além de verdadeira, pode e deve ser colocada em prática.
Tamez, que conviveu com Bazin quando este também integrava o instituto, foi um dos destaques do II Encontro Internacional de Divulgadores da Ciência – 30 anos de divulgação científica no Brasil, realizado na semana passada no Rio de Janeiro. Para apresentar o Exploratorium, que inaugurou sua nova sede no início do ano, o divulgador trouxe um pouco do próprio museu ao evento: antes de sua apresentação, espalhou pelo auditório kits com alguns itens curiosos – um papel com uma pintura anamórfica e outro revestido com alumínio. “Quis trazer a vocês um pouquinho do que nossos visitantes encontram ao chegar ao Exploratorium”, explicou, ainda misterioso, em seu simpático ‘portunhol’.
Seguindo suas instruções, os participantes enrolaram o papel prateado, formando um cilindro. Depois de prendê-lo com pedaços de fita crepe (previamente colados nos braços das cadeiras), posicionaram a peça em um círculo ao lado da pintura. O desenho torto do papel ganhou, então, nova forma na superfície espelhada do cilindro, revelando um copo de bebida com uma azeitona dentro.
É esse espírito de descoberta que estimula e desafia o visitante do Exploratorium a desvendar, aos poucos, as 600 instalações espalhadas pelo lugar, segundo Tamez. “Lá, tentamos deixar uma pergunta suspensa: quem é o cientista e quem é o artista?”, instigou. Em uma das instalações do museu, por exemplo, os visitantes passam por uma ponte periodicamente tomada por uma intensa neblina, o que desperta sua curiosidade. “Os experimentos são complementados com uma equipe afinada de monitores, sempre disposta a interagir e a provocar as percepções do público”, afirmou.
Além de promover a vivência do mundo científico na prática, a nova casa do museu, que data de 1920, foi toda adaptada para funcionar de forma sustentável – o espaço utiliza, por exemplo, equipamentos de captação de energia solar.
Caminhos para a divulgação científica
Seguindo a mesma linha, Federico Abrile acredita que a ciência deve se aproximar da população por meio da arte. “As pessoas precisam enxergar a ciência como cultura, informação e divertimento”, defendeu o coordenador do Centro Interativo de Ciências da Universidade de La Punta, na Argentina. Lá, o intuito é oferecer experimentos sobre noções científicas de física, química e energia renovável.
Uma boa forma de modificar a visão sobre ciência é, para Abrile, recuperar sua relação histórica com a arte. Para tanto, o centro criou, entre outras iniciativas, um festival de teatro e ciência que chegou à sua quarta edição este ano.
Segundo ele, ciência e arte caminham juntas desde as primeiras descobertas sobre as pinturas rupestres, passando pelos famosos desenhos do pintor e grande pensador italiano Leonardo da Vinci. “Num determinado momento, os cientistas foram fazer ciência, e os artistas, outras coisas”, lamentou o argentino. “Por que ainda existe essa separação que tanto prejudica uma verdadeira promoção da cultura científica?”, indagou.
No Brasil, existem iniciativas voltadas a fazer essa aproximação dentro da própria área acadêmica. Uma delas foi destacada pela médica Tânia de Araújo-Jorge, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz): as Oficinas de Ciência e Arte do IOC, que envolvem práticas teatrais, cursos de quadrinhos, literatura e ficção científica. “A pessoa sai transformada de um de nossos cursos. Chega tímida, vai conhecendo essa relação, muito por conta própria e, no final de sua evolução, se descobre voando”, ilustrou a cientista.
Ação política
Araújo-Jorge acredita, porém, que a atuação na esfera artística não basta: os cientistas deveriam atuar fora da academia para influenciar as políticas públicas. “Não vamos fazer isso apenas escrevendo artigos”, afirmou. Ela falou sobre o trabalho que realiza no âmbito do Plano Brasil Sem Miséria (PBSM), que teve início com uma reportagem publicada no jornal Correio Braziliense sobre doenças ligadas à pobreza, as chamadas doenças negligenciadas.
“O tema acabou incluído entre as diretrizes do plano, bem como a educação popular como ferramenta de combate a essas doenças e promoção da saúde”, comemorou. Desde então, a pesquisadora integra expedições de educação e ciência promovidas pela Fiocruz pelo Brasil. A intenção é aproximar da ciência profissionais da saúde, assistentes sociais, gestores públicos, professores, alunos e a população em geral, como forma de melhorar sua qualidade de vida e a interação com o mundo ao seu redor.
Renata Fontanetto
Ciência Hoje On-line