Ciência: uma paixão nacional?

Nem esporte nem política. O brasileiro se interessa mesmo é por meio ambiente e saúde. É o que indica a pesquisa de percepção pública promovida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) envolvendo mais de 2 mil pessoas, entrevistadas em meados de 2010 em diversas partes do país.

Na enquete – que já havia sido realizada em 2006 pelo mesmo grupo de pesquisa e em 1987 pelo CNPq –, 83% dos entrevistados afirmam ter interesse por temas relacionados ao meio ambiente. Quando o assunto é medicina, esse valor é 81%. A ciência e a tecnologia de maneira mais ampla despertam o interesse de 65% das pessoas ouvidas.

Todos esses percentuais aumentaram desde 2006, mas a questão ambiental foi a que mais conquistou adesões. Na última pesquisa, o tema cativava o interesse de 58% dos entrevistados.  

Gráfico assuntos de interesse
O gráfico mostra que os assuntos relacionados à ciência são os que despertam mais interesse entre os brasileiros. (fonte: MCT)

“O brasileiro talvez seja o povo que mais declara interesse pelo meio ambiente e preocupação com as mudanças climáticas”, afirma um dos coordenadores da pesquisa, o físico Ildeu de Castro Moreira, diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia (DEPDI) do MCT. 

O nível de interesse declarado por ciência e tecnologia em geral cresce progressivamente. Em 1987, somente 20% dos entrevistados na pesquisa promovida pelo CNPq alegavam se interessar pelo tema; em 2006, essa percentagem passou para 41%. 

Os dados refletem a presença que a ciência conquistou no cotidiano do brasileiro

Segundo Moreira, esses dados refletem a presença que a ciência conquistou no cotidiano do brasileiro. “Esse aumento de interesse é consequência de um momento econômico de ascensão vivido pelo país e também do maior acesso à informação através da internet e da TV”, explica Moreira.

Por outro lado, a enquete mostra a maioria dos entrevistados não frequenta espaços científicos e culturais, como museus, zoológicos, jardins botânicos e bibliotecas. Quando se trata de centros e museus de ciência, 92% afirmam que não visitaram sequer uma instituição do tipo nos 12 meses anteriores à pesquisa. As justificativas mais recorrentes entre os consultados são a inexistência desses espaços na região em que vivem e a falta de tempo. 

Ainda assim, o número de visitas a centros e museus de ciências dobrou desde 2006 (de 4% foi para 8,3%). Para o físico, esse fenômeno pode ser explicado pelo aumento do número de museus espalhados pelo Brasil e pelas novas políticas de apoio à divulgação científica.

Otimismo exacerbado

A maioria dos consultados (42,3%) acredita que a ciência traz mais benefícios para sociedade do que malefícios, sendo que 38,9% dizem que a ciência traz apenas benefícios. “O brasileiro é muito otimista em relação à ciência”, declara Moreira. “Na China, na Europa e na Argentina esse índice é bem menor.”

Assim como em outros itens da enquete, as respostas às questões relacionadas aos benefícios e malefícios da ciência são influenciadas pelo nível de instrução dos entrevistados. “Dentre a população que tem somente ensino fundamental, percebemos que há muito menos questionamentos sobre as questões éticas da ciência”, pondera Moreira.

Também nas classes mais pobres, o religioso é uma figura de credibilidade, enquanto que, entre os mais ricos, o cientista, principalmente de instituição pública, tem mais autoridade como fonte de informação. 

O médico fica acima de todos como o profissional que mais inspira confiança, seguido do jornalista

Já em termos absolutos, o médico fica acima de todos como o profissional que mais inspira confiança, seguido do jornalista. Esses dados demonstram a importância que os meios de comunicação têm na divulgação da ciência. 

Dentre os entrevistados, 52% se disseram satisfeitos com a maneira como a TV divulga os avanços científicos. Esse percentual é de 46,3% em relação aos jornais. A maior razão para insatisfação é a pequena quantidade de matérias disponíveis sobre o assunto.  

Gráfico avaliação da mídia
O brasileiro está parcialmente satisfeito com a divulgação da ciência nos meios de comunicação (fonte: MCT)

Esses dados devem ser analisados com cuidado, pois, segundo Moreira, a mídia passa uma imagem muito idealizada e pouco realista da ciência. “As matérias poderiam ser mais interessantes e de mais qualidade se houvesse mais discussão sobre as questões da ciência.”

O Brasil e o mundo

Na pesquisa, 49,7% dos entrevistados consideram que o Brasil ocupa posição intermediária no campo das pesquisas científicas em relação à ciência desenvolvida em outros países, percentual que era de apenas 25% em 1987, quando 52% acreditavam que o Brasil estava atrasado na área. 

Um estudo recente divulgado pela revista britânica The Economist confirma a ideia de que a ciência no Brasil avança e revela que o país tem se tornando um destino cada vez mais atraente para a realização de pesquisas científicas e acadêmicas.

A população não conhece a ciência do seu próprio país

Em contraste com esse e outros dados, a enquete mostra que a população não conhece a ciência do seu próprio país. Apenas 12% dos entrevistados foram capazes de citar o nome de algum cientista brasileiro e somente 18% conseguiram mencionar de cabeça uma instituição científica nacional. Dentre os cientistas mais lembrados estão Oswaldo Cruz, citado por 118 pessoas, e Carlos Chagas, mencionado por 85.

Mais uma vez, esse dado varia de acordo com a situação econômica e educacional dos entrevistados. Entre os que citaram algum nome, a maioria faz parte da parcela mais rica da população e tem ensino superior.

A pesquisa ‘Percepção Pública da Ciência e Tecnologia no Brasil – 2010: O que o brasileiro pensa da C&T?’ foi coordenada pelo DEPDI/MCT e pelo Museu da Vida/Fiocruz.

 

Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line

Errata: Ildeu de Castro Moreira entrou em contato com a CH On-line para retificar um dado do seguinte trecho da matéria: “Por outro lado, a enquete mostra que 92% dos entrevistados não frequentam espaços científicos e culturais, como museus, zoológicos, jardins botânicos e bibliotecas.” A porcentagem representa apenas aqueles que não frequentam museus e centros de ciências. “Pelo contrário, a visitação a jardins zoológicos (22%) e a jardins botânicos e parques ambientais (22%) é alta”, acrescentou. Obrigada, Ildeu, o erro já foi corrigido.