Cientistas desvendam ação do botox

A compreensão do funcionamento de uma técnica empregada por esteticistas para suavizar os sinais da idade pode ajudar a elaborar novos medicamentos contra doenças como o botulismo e o tétano. A técnica em questão é a aplicação das injeções de botox, freqüentemente utilizadas para combater as indesejáveis rugas por impedir a contração muscular. O princípio ativo dessa técnica é uma toxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum .

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A toxina botulínica é produzida pelas bactérias C. botulinum (foto: reprodução/CDC)

Ao invadir células nervosas, a toxina botulínica, como é conhecida, libera enzimas que se ligam a locais específicos de proteínas que atuam na sinapse neuromuscular e as divide em duas. Dessa forma, o músculo deixa de receber os sinais químicos para contração e relaxamento e seu movimento é impedido. Do ponto de vista estético, a substância atua como uma inibidora de rugas. A intoxicação involuntária e não controlada, porém, pode resultar em um sério comprometimento do sistema nervoso e até levar à morte.

 

A identificação da estratégia utilizada pela toxina botulínica para paralisar músculos – e acabar com rugas ou causar botulismo ou tétano, por exemplo – pode, portanto, ajudar cientistas a desenvolver novos métodos de combate aessas doenças e aos sinais da idade. A notícia foi dada por pesquisadores do Instituto Médico Howard Hughes (EUA) que desvendaram detalhes do funcionamento da toxina e publicaram na Nature

de 12 de dezembro de 2005 os resultados do estudo.

 

A neurotoxina age de forma extremamente seletiva – cada “enzima divisora” liberada por ela reconhece e ataca um ponto específico das proteínas. O que intrigava os cientistas até agora era saber como tal especificidade é possível – e isso é o que eles acabam de descobrir. Já se sabia que outras regiões da neurotoxina poderiam estar envolvidas no processo, mas a estrutura e a localização exata dessas regiões eram ainda desconhecidas – diversas tentativas de cristalizar a neurotoxina para poder estudá-la foram fracassadas, pois as amostras tornavam-se imediatamente inutilizáveis após a divisão da proteína.

 

Para resolver o problema, os pesquisadores provocaram duas mutações em uma das enzimas liberadas pela toxina botulínica, que inibiram sua função sem modificar sua estrutura. As alterações impediram a divisão da proteína pela enzima e a interação entre as duas pôde enfim ser observada.

 

O conjunto neurotoxina-proteína foi então estudado em laboratório e a análise por refração de raios-X permitiu que os cientistas determinassem sua estrutura atômica e identificassem o mecanismo que leva as enzimas a ‘cortar’ as proteínas em pontos específicos, de maneira a impedir que elas enviem sinais de contração e relaxamento muscular.

 

Para os pesquisadores, a descoberta do mecanismo utilizado pela neurotoxina para reconhecer seus alvos será fundamental para a futura produção de medicamentos capazes de bloqueá-la. Seria possível em princípio elaborar uma droga que impeça a divisão da proteína pela enzima e, portanto, a paralisação do músculo.


Isabel Levy 
Ciência Hoje On-line
01/02/05