72 minutos

 

Comparação entre um nevo normal (acima) e um nevo precursor de melanoma (abaixo). Observe que o segundo apresenta bordas irregulares, coloração variável e assimetria (fotos: NYU School of Medicine / JAMA ).

O número de pessoas que morrem a cada ano em decorrência um câncer de pele conhecido como melanoma tem crescido de forma assustadora nos últimos anos. Nos Estados Unidos, por exemplo, a cada ano essa neoplasia é diagnosticada em cerca de 43 mil novos pacientes e ocorrem 7300 mortes associadas com esse câncer. Isso significa uma morte a cada 72 minutos, ou um caso em cada grupo de 70 americanos. Além disso, a capacidade de o melanoma surgir em jovens tem tornado essa neoplasia uma das principais causas de morte de pessoas entre 25 e 40 anos em diversos países.

Esse câncer acomete os melanócitos, células que habitam a porção basal da epiderme e que são produtoras de melanina, substância responsável pela pigmentação de nossa pele. Os melanócitos são cercados por um grande número de células conhecidas como queratinócitos que, além de produzirem a queratina que auxilia na impermeabilização de nossa pele, também estão associados com a captação da melanina por fagocitose dos prolongamentos celulares dos melanócitos.

Um sinal de alerta para o surgimento do melanoma é a presença de nevos ou pintas na pele de aspecto e cores irregulares, que podem estar associados a coceira e dor. Nesses locais podem estar presentes células e estruturas teciduais com características alteradas (displasia) resultantes do processo de formação do tumor.

Durante o início de progressão do melanoma, os melanócitos geneticamente alterados permanecem restritos à pele. Inicialmente, essas células ocupam na camada superior desse tecido, conhecida como epiderme. Posteriormente, os melanócitos deslocam-se para a camada inferior da pele (derme) e, após algum tempo, invadem os vasos sangüíneos e linfáticos, migrando para outros locais no organismo. Grande parte das mortes decorrentes do melanoma estão relacionadas à formação de metastáses, existindo apenas uma probabilidade muito pequena – cerca de 5% – de sobrevida de pacientes com melanoma metastático por um período de cinco anos.

Sinalizador molecular

Melanócito visto em imagem de microscopia de fluorescência. Os melanossomos, as organelas celulares que transportam melanina, estão indicados em verde (foto: NIH).

Uma molécula de sinalização celular conhecida como fator básico de crescimento de fibroblastos ou bFGF desempenha um papel-chave para a sobrevivência e multiplicação dos melanócitos transformados. Enquanto os melanócitos estão confinados aos nevos, parece que os queratinócitos estão envolvidos na produção de bFGF para as células malignas. Após alcançarem a derme, os melanócitos tornam-se capazes de produzir essa substância e, assim, adquirem a capacidade de invadir outros locais.

Uma série de outras moléculas tem a sua expressão aumentada à medida que ocorre a progressão do melanoma. Por outro lado, algumas moléculas utilizadas para reconhecimento celular têm sua produção diminuída. A capacidade de inibir a expressão dessas moléculas é essencial para a progressão dos tumores, pois estas poderiam “denunciar” ao sistema imune a presença das células transformadas, o que poderia levar à sua eliminação.

Uma estratégia possível para combater o melanoma seria justamente encontrar um meio de “capacitar” o sistema imune para reconhecer as células transformadas. E é justamente isso que fizeram Cientistas do Instituto Nacional do Câncer (Bethesda, EUA) liderados por Steven Rosenberg. Em uma pesquisa publicada na semana passada na revista científica Science , esses pesquisadores descrevem testes feitos com 17 voluntários que apresentavam melanoma metastático em estágio avançado.

Linfócitos T
A estratégia de Rosenberg e colaboradores se baseia em pesquisas anteriores que haviam utilizado linfócitos dos próprios pacientes para combater as células tumorais. Nessas pesquisas, os linfócitos T eram retirados, multiplicados externamente e reintroduzidos nos pacientes. Porém, esse procedimento experimental mostrou-se pouco eficiente, pois dependia da presença de linfócitos previamente capacitados para reagir contra as células tumorais. Algo que, considerando-se o número de linfócitos circulantes, é extremamente raro, similar a se encontrar uma agulha no palheiro (ou um político honesto!).

Em sua pesquisa, Rosenberg e colaboradores retiraram linfócitos dos pacientes com melanoma e modificaram essas células para se tornassem capazes de reconhecer melanócitos transformados. Para isso, os pesquisadores introduziram na membrana plasmática desses linfócitos receptores capazes de identificar especificamente células de melanoma. Os linfócitos foram, então, multiplicados e novamente introduzidos nos pacientes que haviam sido previamente imunossuprimidos.

Análises posteriores indicaram que os linfócitos modificados permaneciam no organismo dos pacientes por um período prolongado. Contudo, apenas dois dos 17 pacientes testados se livraram totalmente do melanoma. Apesar dessa baixa eficiência (cerca de 11%), os resultados indicam que no futuro, após serem feitas modificações que aumentem a eficácia dessa metodologia, ela poderá ser uma arma valiosa no combate a esse tipo de câncer. 

Jerry Carvalho Borges
Colunista da CH On-line
08/09/2006