Explosão de biodiversidade explicada

A arte representa diversos conodontes, grupo de animais abundantes nos mares do Ordoviciano, há quase 500 milhões de anos. Em geral, esses animais não ultrapassavam 4 cm de comprimento (imagens: reprodução).

A história de nosso planeta foi marcada por vários momentos em que houve um notável aumento da biodiversidade. Um desses episódios ocorreu durante o período Ordoviciano, entre 490 e 443 milhões de anos atrás. Nesse momento, surgiram os principais grupos que dominaram os mares durante os 250 milhões de anos seguintes, como subgrupos de braquiópodos, equinodermas, trilobitas e corais.

Esse aumento da biodiversidade já era conhecido pelos pesquisadores, mas os fatores por trás dele ainda não eram bem compreendidos. Chegou-se a postular que a queda de um asteróide poderia ter influenciado esse fenômeno. Agora, o mistério – ou pelo menos parte dele – acaba de ser resolvido com um trabalho conduzido por Julie Trotter, da Universidade Nacional da Austrália (Canberra), e publicado na prestigiosa revista científica Science.

A conclusão veio de análises isotópicas realizadas em fósseis de um grupo de animais marinhos do Ordoviciano – os conodontes. A partir desse estudo, o grupo de Trotter concluiu que a temperatura dos mares teria diminuído dos cerca de 40ºC que havia há 490 milhões de anos até valores semelhantes aos atuais (entre 32 e 27ºC) entre 470 e 445 milhões de anos atrás.

Já no final do Ordoviciano (depois de 445 milhões de anos), houve um novo resfriamento dos mares (para menos de 26 ºC), o que desencadeou uma extinção em massa. Não custa lembrar que, naquele momento, os vertebrados eram escassos e ainda não haviam conquistado a terra firme, e que, nos mares, os conodontes eram o grupo mais comum.

Ilustres desconhecidos

A foto mostra diversos elementos microfósseis de conodontes. Na maior parte, trata-se de dentes com tamanho entre 0,25 e 2 mm. Por muito tempo, os paleontólogos tiveram dúvidas sobre a que grupo de animais pertenceriam esses fósseis.

Mas o que são afinal esses organismos? Talvez o leitor não acredite, mas ninguém sabia ao certo até há bem pouco tempo. O grupo Conodonta, muito abundante em depósitos marinhos do Cambriano ao Triássico, é conhecido desde 1856. Seu nome é derivado da união dos termos gregos kônos (= cone) e odontos (= dentes).

Até recentemente, esses vertebrados eram conhecidos apenas por pequenas estruturas compostas de apatita (fosfato de cálcio) assemelhadas a dentes (daí o nome), com tamanho entre 0,25 e 2 milímetros. Esses microfósseis têm sido estudados já há bastante tempo e funcionam como uma importante ferramenta na datação relativa de rochas sedimentares e na indústria do petróleo.

Por muito tempo, os pesquisadores debateram se os elementos conodontes pertenciam a vermes, moluscos ou mesmo a plantas. Para se conhecer a resposta, foi preciso esperar até 1983, quando foram encontrados os primeiros registros completos desses animais, mais precisamente de rochas do Carbonífero inferior (com cerca de 340 milhões de anos) da Escócia.

Esses achados estabeleceram que aquelas estruturas pertenciam a peixes bem primitivos, de corpo alongado semelhante ao de vermes, mas com notocorda, estruturas parecidas com barbatanas e um par de olhos bem desenvolvidos. Em geral, os conodontes possuem um tamanho em torno de 4 cm – quase um terço do comprimento de uma caneta esferográfica. Apesar de raros, espécimes completos também foram registrados nos Estados Unidos e na África. No Brasil, elementos conodontes são encontrados particularmente na bacia do Amazonas. 

Técnicas e equipamento precisos

O esquema mostra como os fósseis de dentes se encaixavam no corpo de um conodonte. O detalhe mostra uma vista dorsal da cabeça do animal.

Apesar do diminuto tamanho desses seres, a equipe de Julie Trotter conseguiu realizar os estudos isotópicos em mais de 100 exemplares coletados de 20 depósitos distintos, graças a técnicas e equipamentos cada vez mais precisos.

Com isso, foi possível obter uma melhor avaliação da variação da temperatura do mar durante o Ordoviciano. Agora é necessária uma amostragem mais ampla que mostre se a variação foi global ou se há regiões que divergem e como isso se refletiu na biodiversidade.

Como se pode perceber com esse estudo, a vida nos diferentes períodos geológicos era bem distinta. Mesmo que os conodontes tivessem tamanho minúsculo, a contribuição científica que eles trouxeram para o entendimento das variações que ocorreram no nosso planeta pode ser considerada gigantesca! Em resumo, nem só de dinossauros vive o paleontólogo…

Alexander Kellner
Museu Nacional / UFRJ
Academia Brasileira de Ciências
05/08/2008

Paleocurtas
As últimas do mundo da paleontologia

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A descrição de novos exemplares do crocodilomorfo Stratiotosuchus maxhechti foi publicada por André Pinheiro, do campus de Rio Claro da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e por colaboradores. Procedente de rochas da Formação Adamantina, com entre 82 e 72 milhões de anos de idade, a espécie pertence a um grupo chamado de Baurusuchidae. Esses animais possuíam dentes serrilhados, semelhantes aos dos dinossauros carnívoros, e provavelmente competiam com eles durante o Cretáceo. O novo material foi descrito na Revista Brasileira de Paleontologia e acrescenta detalhes anatômicos até então desconhecidos para essa espécie.
Na próxima quarta feira, este colunista falará sobre o tema “Dinossauros: personagens da evolução” no ciclo de palestras Ciência às Seis e Meia, promovido pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC/RJ). A idéia é promover uma discussão em linguagem simples e direta sobre a importância e os avanços realizados no estudo de fósseis, inclusive dando oportunidade para o público tirar dúvidas sobre a pesquisa dos organismos extintos. O evento tem entrada franca e acontece no auditório do CBPF, situado à rua Xavier Sigaud, 150 em Botafogo, no Rio de Janeiro (RJ). Mais informações pelo telefone (21) 2541-7100.
Um novo estudo publicado na Palaeontology procurou quantificar a capacidade de vôo de dois répteis extintos. A equipe de Koen Stein, do Instituto de Paleontologia em Bonn (Alemanha), estudou as formas Kuehneosuchus e Kuehneosaurus de depósitos triássicos da Inglaterra, ambas com costelas das vértebras dorsais bem desenvolvidas, que suportariam uma membrana alar. O grupo concluiu que o Kuehneosuchus teria capacidade de planar, enquanto o Kuehneosaurus efetuava o pára-quedismo.
A exposição Dinossauros da China fica em cartaz até o fim de setembro no Museu de Ciências de Miami (EUA). Com mais de uma dezena de esqueletos de grande porte e cinqüenta outros objetos – incluindo fósseis originais, todos pertencentes ao Museu de História Natural de Beijing –, a mostra apresenta um pouco das principais descobertas realizadas recentemente na China, incluindo os famosos dinossauros com penas de Liaoning. Mais informações na página da exposição.
Tecidos moles do dinossauro T. rex preservados dentro dos poros de ossos foram reanalisados pela equipe de Thomas Kaye, do Museu de História Natural de Burke, em Seattle (EUA). Anteriormente, acrescentava que esse material incluía restos de vasos sangüíneos, com potencial para preservação de biomoléculas. O novo estudo, publicado na prestigiosa PLoS One, questiona essas conclusões e reinterpreta o material como uma concentração de bactérias – também chamada de biofilme – que teria se formado dentro dos poros dos ossos, “imitando” os vasos sangüíneos. Este certamente será um grande ponto de discussão entre os pesquisadores nos próximos anos.
Acaba de ser publicado o livro Ciência & criança – A divulgação científica para o público infanto-juvenil. Editado pela colega Luisa Massarani, do Museu da Vida, ligado à Fundação Oswaldo Cruz, a publicação reúne textos de profissionais que militam na área de divulgação da ciência jovens em geral. Uma versão digital em formato PDF do livro está disponível para download na página do Museu da Vida.