Uma das grandes questões que permeiam debates entre os paleontólogos é a origem e a diversificação dos mamíferos. Para responder essa questão de forma satisfatória, somos obrigados a examinar os restos de formas extintas preservadas nas camadas geológicas da Terra.
E aí está o problema: justamente na era Mesozoica, quando surgiram os primeiros mamíferos, existe uma escassez enorme de vestígios desses animais com pelos. Para se ter uma noção, fósseis de mamíferos são mais raros do que fósseis de dinossauros!
Felizmente, de vez em quando, alguém descobre exemplares mais completos. Justamente é o que Guillermo Rougier, da Universidade de Louisville (Kentucky, Estados Unidos) e os seus colaboradores acabam de fazer. Eles encontraram restos cranianos quase completos de uma nova espécie de mamífero de 95 milhões de anos, cujo estudo foi destaque da prestigiosa Nature.
Mamíferos atuais
De uma forma simplificada, podemos afirmar que hoje existem três grandes grupos de mamíferos: monotremados, marsupiais e placentários. Entre as principais distinções desses grupos está a maneira pela qual nascem os seus filhotes.
Os mais primitivos são os monotremados, representados por poucas espécies que vivem sobretudo na Austrália e na Tasmânia, como o ornitorrinco. Esses animais, apesar de terem as características típicas dos mamíferos – como pelos, glândulas mamárias e outras feições –, ainda botam ovos, que é uma característica bastante primitiva.
Os marsupiais, atualmente encontrados nas Américas e na Austrália, se diferenciam, entre outros aspectos, por possuírem uma espécie de bolsa (chamada de marsúpio) na região abdominal das fêmeas. Estas dão à luz filhote muito pequeno, pouco desenvolvido e com os membros anteriores relativamente grandes, usados para se agarrar a um mamilo. O filhote fica protegido dentro da bolsa e apenas depois de muitos meses – que varia dependendo da espécie – terá crescido o suficiente para abandoná-la. Gambás e cangurus são exemplos de marsupiais.
Por último, temos os placentários, cujo feto permanece dentro do útero e é alimentado via placenta até o nascimento. Esse é o grupo predominante nos dias de hoje, representado, entre outros, pelos elefantes, camundongos, baleias, morcegos e primatas, incluindo a nossa própria espécie.
Registro fóssil
De uma forma geral, podemos dizer que o registro fóssil dos mamíferos não é tão pobre. São conhecidos milhares de exemplares pertencentes a formas que viveram durante o Pleistoceno (há cerca de 12 mil anos), particularmente as que integram a megafauna, cujo nome deriva do grande tamanho alcançado por algumas espécies.
Porém, à medida que se avança no tempo geológico, o registro tende a escassear. Justamente durante a era Mesozoica, quando os mamíferos se originaram, os achados são bem limitados. Quando presentes, tendem a se resumir a dentes isolados e ossos muito incompletos.
Para que os leitores da coluna tenham uma noção, em todo Brasil existe apenas um único registro de mamífero mesozoico publicado! E os pesquisadores estão procurando – e muito – por mais evidências, mas simplesmente o registro desses animais é raro.
Também é importante salientar a existência, no passado, de diversos outros grupos de mamíferos que não sobreviveram até os dias de hoje. Um desses chama-se Dryolestoidea. Acredita-se que ele esteja bem proximamente relacionado aos mamíferos ancestrais dos marsupiais e dos placentários – daí a sua importância. Mas o material disponível desse grupo é bastante limitado, o que o tornou um tanto enigmático para os pesquisadores.
Tamanho de uma avelã
O material encontrado por Rougier e colegas vem da Formação Candeleros, tida como Cenomaniana – ou seja, formada há aproximadamente 95 milhões de anos. Essas camadas afloram na província de Rio Negro, mais especificamente em uma localidade chamada La Buitrera, famosa pela ocorrência de dinossauros e também vertebrados de pequeno porte. Mas, em termos de mamíferos, a descoberta dos colegas argentinos é a primeira.
A nova espécie, que recebeu o nome de Cronopio dentiacutus, foi descrita com base em três exemplares: dois crânios e uma mandíbula. Diversas características demonstraram que essa espécie pertence ao grupo dos Dryolestoidea, particularmente aspectos dos dentes mandibulares.
Mas Cronopio também tem características diferentes: o focinho é muito comprido e fino e os dentes caniniformes são muito longos. Como a grande maioria dos mamíferos da era Mesozoica, a cabeça é bem pequena: em torno de 20 milímetros – tamanho de uma avelã!
O principal – e surpreendente – aspecto desse achado está nas características especializadas do crânio (alongado e estreito) e da presença do canino bem desenvolvido.
Esses traços eram inesperados, pois demonstram que Cronopio e possivelmente outros animais do seu grupo já possuíam uma notada especialização que foge ao padrão dos demais mamíferos primitivos.
Ou seja, ficou bastante claro que a história evolutiva dos primeiros mamíferos, em especial daqueles que antecederam a dicotomia entre placentários e marsupiais, é bem mais complexa do que se supunha.
Agora, os pesquisadores de diferentes países precisam continuar trabalhando bastante para ajudar a completar esse enorme e complexo quebra-cabeças que é a evolução dos mamíferos.
Alexander Kellner
Museu Nacional/UFRJ
Academia Brasileira de Ciências
Paleocurtas
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Entre 1 e 3 de dezembro será realizada a Paleominas, que se encontra em sua décima edição. Pela primeira vez na cidade de Caratinga (Minas Gerais), o evento, aprovado pelo Fundo Municipal de Cultura de Caratinga e organizado pelo Grupo Fossilis nas Faculdades Integradas de Caratinga, contará, além de trabalhos científicos, com palestras, exposições e minicursos. Inscrição gratuita pelo site do Paleominas.
Uma nova fauna de insetos do grupo Chrysopidae acaba de ser descoberta em rochas do Cretáceo Inferior do sul da Inglaterra. James Jepson (Universidade de Manchester) e colegas descreveram na Cretaceous Research uma dúzia de novas espécies de distintos grupos do calcário de Purbeck, aumentando sobremaneira a diversidade desses invertebrados fósseis do Cretáceo da Inglaterra, cujos representantes recentes tendem a viver em regiões tropicais.
Está em cartaz no Museu de História Natural Americano (Nova York) até janeiro de 2012 a exposição ‘Os maiores dinossauros do mundo’. A mostra, muito bem produzida, procura mostrar aos visitantes o que está por traz dos estudos desses gigantes e como os cientistas acreditam que eles tenham conseguido adquirir as suas grandes proporções. Mais informações no site do museu.
Casulos atribuídos a vespas foram encontrados em um ovo de dinossauro da Patagônia, na Argentina. O estudo, publicado na Palaeontology e coordenado por Jorge Genise, do Museu Argentino de Ciências Naturais (Buenos Aires), levanta a possibilidade de as vespas terem atacado outros insetos que estavam se alimentando do ovo em decomposição.
O colega Castor Cartelle (PUC-MG) lançou o livro O homem do abismo. Publicado pela Editora Gomes com o apoio da universidade, a obra se passa em dois momentos: o atual, em que cientistas estudam uma caverna e tentam desvendar uma história que ocorreu há milhares de anos, e a do passado, quando o homem convivia com animais gigantes. Essa mistura de ficção e realidade é uma boa maneira de popularizar a ciência. Vale a pena conferir.
Hukam Singh e colegas do Instituto de Paleobotânica Birbal Sahni (Lucknow, Índia) acabam de publicar na Paleoworld um estudo sobre restos de vegetais fósseis de um depósito de aproximadamente 55 milhões de anos da Índia. Analisando pólens, esporos, impressão de folhas e restos de troncos, os pesquisadores identificaram diversas espécies (incluindo uma nova) de angiospermas e gimnospermas, sugerindo que a região era bastante úmida no passado.