Na Antiguidade, as diferentes civilizações buscavam no céu explicações para as suas origens e procuravam conexões entre as milhares de estrelas para representar seus deuses e mitos. Assim como em uma grande tela, imaginava-se que as estrelas eram pontos que, conectados uns aos outros, formavam desenhos – as constelações.
Naquela época, havia a noção de que o céu era imutável, já que as estrelas aparentemente não mudam de posição entre si – hoje se sabe que as estrelas fazem uma trajetória ao redor da galáxia. Entretanto, percebiam-se entre as estrelas alguns objetos brilhantes mudando constantemente de posição em relação a elas.
Esses pontos luminosos (cinco, no total) foram identificados há cerca de 5 mil anos pelos mesopotâmios (povo que vivia onde atualmente está o Iraque) e denominados planetas, palavra de origem grega que quer dizer ‘corpo errante’. O Sol e a Lua também eram considerados planetas, uma vez que modificavam suas posições em relação às constelações.
Em homenagem a esses corpos celestes, os mesopotâmios criaram a semana com sete dias e consagraram cada dia a um planeta. Em muitos idiomas ainda é possível perceber essa associação. Por exemplo: segunda-feira em inglês é Monday (algo como ‘dia da Lua’), em espanhol é lunes e em italiano é lunedi.
Os povos antigos identificavam os planetas como divindades. Por isso, deram a esses astros os nomes de deuses da mitologia greco-romana.
Ao planeta que se desloca mais rapidamente no céu foi atribuído o nome do deus romano Mercúrio (Hermes, na mitologia grega), que era o mensageiro dos deuses. Mercúrio retorna à mesma posição no céu em apenas 88 dias. O planeta mais brilhante e bonito de se observar recebeu o nome da deusa da beleza, Vênus (Afrodite, para os gregos).
O planeta vermelho, que nos lembra sangue, foi batizado com o nome do deus da guerra, Marte (Ares, para os gregos). Para o brilhante planeta que se move lentamente, com imponência e majestade, foi dado o nome de Júpiter (Zeus, para os gregos), o rei dos deuses. Finalmente, o planeta que se move mais devagar, gastando quase 30 anos para voltar ao mesmo lugar no céu, como se fosse muito velho, foi chamado de Saturno (Chronos, para os gregos), considerado a personificação do tempo.
Universo revelado pelas lentes
O uso de instrumentos óticos revolucionou a observação do céu. Essa mudança teve início com o físico e matemático italiano Galileu Galilei (1564-1642). Em 1610, por meio de uma luneta com lente de apenas 4 cm de diâmetro, Galileu realizou inúmeras descobertas, entre elas, a da presença ao redor de Júpiter de quatro “planetas”. Galileu chamou de planetas os satélites Io, Europa, Ganimedes e Calisto. A denominação de satélite veio somente com o físico e matemático inglês Isaac Newton (1642-1727).
A descoberta de novos planetas em nosso Sistema Solar somente foi possível com a construção de telescópios maiores e mais precisos. Em 1781, foi descoberto o planeta Urano (o deus dos céus) pelo astrônomo inglês William Herschel (1738-1822), que usou um telescópio com um espelho de aproximadamente 15 cm de diâmetro.
Em 1846, o astrônomo alemão Johann Gottfried Galle (1812-1910) observou o planeta Netuno (Poseidon, para os gregos), o deus dos mares, por meio de uma luneta com uma lente de 23 cm de diâmetro. Galle encontrou Netuno a partir de cálculos da órbita do planeta realizados pelo astrônomo francês Urbain Jean Joseph Le Verrier (1811-1877). Esses cálculos foram feitos porque a órbita do planeta Urano sofria desvios que pareciam não obedecer às leis da mecânica newtoniana e esse efeito poderia ser explicado se houvesse um planeta além da órbita de Urano. Portanto, a descoberta de Netuno é considerada um dos maiores resultados da mecânica newtoniana.
Nos séculos 19 e 20, outros objetos descobertos no Sistema Solar foram classificados como planetas: Ceres, identificado em 1801; Plutão, em 1936; e Eris, em 2005. Contudo, em 2006, a União Astronômica Internacional redefiniu o conceito de planeta, classificando esses astros como planetas anões.
Essa classificação surgiu devido ao fato de que novos objetos celestes, como Haumea e Makemake, começaram a ser descobertos no Sistema Solar, principalmente próximos ao chamado Cinturão de Kuiper (localizado após a órbita de Netuno). Então ficou determinado que, para um corpo celeste ser considerado um planeta, ele deve ser o objeto dominante em sua órbita. No caso de Plutão, por exemplo, a sua lua Caronte tem quase metade do seu diâmetro e ele tem mais três luas (uma ainda não confirmada).
Para além do nosso Sol
No final da década de 1980, começaram a surgir as primeiras evidências de que deveria haver planetas orbitando outras estrelas. A comprovação direta da existência de planetas extrassolares só aconteceu em 1993, quando o astrônomo polonês Aleksander Wolszczan (1946-) observou indícios de planetas ao redor de um pulsar (estrela de nêutrons muito pequena e densa), o PSR B1257+12.
Até o fechamento desta coluna (16/09), já foi confirmada a existência de 686 planetas extrassolares. Praticamente todas as semanas há anúncios de novas descobertas. Estas são realizadas a partir de telescópios gigantes, com espelhos de quase 10 metros de diâmetro, e por satélites especialmente projetados para procurar esses planetas, como o Corot (da Agência Espacial Europeia – ESA) e o Kepler (da Nasa).
Nesta semana, em particular, o Observatório Europeu do Sul (ESO, na sigla em inglês) anunciou a descoberta de 50 planetas fora do Sistema Solar. Entre eles, está uma ‘super-Terra’ que tem aproximadamente 3,6 massas terrestres e orbita uma estrela semelhante ao Sol. Esse planeta fica a uma distância dessa estrela que, a princípio, pode permitir a existência de água no estado líquido, mas ainda não existe nenhuma evidência disso.
A grande maioria dos planetas extrassolares detectados até agora estão apenas a algumas dezenas de anos-luz de nós (um ano-luz equivale a aproximadamente 10 trilhões de quilômetros) e são planetas gigantes, com massas semelhantes à de Júpiter. Esse é o caso do planeta 51 Pegasi B, o primeiro confirmado em volta de uma estrela semelhante ao Sol. Ele tem metade da massa de Júpiter, completa uma volta ao redor da sua estrela em aproximadamente quatro dias e está apenas a 7,8 milhões de quilômetros dela.
Nos próximos anos, se a ESA aprovar o projeto Plato (sigla em inglês para ‘trânsitos planetários e oscilações de estrelas’), que prevê a construção de uma versão aperfeiçoada dos satélites caçadores de planetas, será possível mapear cerca de 300 mil estrelas, quase 10 vezes mais que a capacidade dos satélites atuais. Vale ressaltar que esse número, embora muito grande, é apenas uma pequena parte das centenas de bilhões de estrelas que existem na Via Láctea.
Além disso, o Plato terá resolução suficiente para identificar planetas com dimensões semelhantes à da Terra, o que pode aumentar a expectativa de encontrar planetas capazes de suportar formas de vida.
Com a velocidade dos avanços tecnológicos, talvez consigamos, nas próximas décadas, viajar pessoalmente para alguns dos planetas do nosso Sistema Solar e até descobrir algum planeta extrassolar no qual a vida também tenha surgido. Esses mundos distantes, que já foram divindades para nós, se tornarão mais próximos. E a Terra deixará de ser, como disse o astrônomo estadunidense Carl Sagan (1934-1996), apenas “um pálido ponto azul”, “um grão solitário na grande e envolvente escuridão cósmica”.
Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos
Este texto foi atualizado para incluir a seguinte alteração:
O planeta 51 Pegasi B está a 7,8 milhões de quilômetros da estrela que orbita, e não da Terra, como dito anteriormente. (21/09/2011)