O mais completo dos gigantes

Há seis anos uma estudante, participando de uma expedição às margens do lago Barreales, na Patagônia, encontrou um “pedaço de osso” nas rochas avermelhadas que formavam o chão perto de um pequeno cerro. Ela começou a escavar um pouco, sem muita convicção. Algum tempo depois, o que parecia ser um pequeno fragmento tomou a forma de uma vértebra cervical (do pescoço) de grande tamanho – estava descoberto o mais completo dos dinossauros gigantes já encontrado até hoje.

Naquele momento, o paleontólogo Jorge Calvo e sua equipe ainda não tinham a exata noção da importância do achado, mas eles sabiam que se tratava de algo extraordinário, já que a vértebra encontrada tinha perto de um metro de comprimento. A notícia chegou à imprensa e, mesmo antes da conclusão da escavação, se sabia da existência de um grande dinossauro naquela região.

Com a divulgação da descoberta, Jorge teve condições de fechar parcerias com empresas e novas vértebras foram encontradas. Resumos sobre o achado e notícias acerca do andamento dos trabalhos foram noticiados, particularmente na imprensa argentina. E agora acaba de ser publicado, nos Anais da Academia Brasileira de Ciências , o artigo no qual a nova espécie de dinossauro foi oficialmente descrita e batizada, com o nome de Futalognkosaurus dukei .

O nome do gênero do novo réptil – Futalognkosaurus – provém da língua mapuche, falada pelo grupo indígena que vive na região, e significa algo como ‘o chefe gigante dos sáurios’. Já o complemento do nome da espécie homenageia a empresa Duke Energy Argentina Company, que financiou a maior parte das escavações.

Um recorde paleontológico
O trabalho das escavações, aliás, foi árduo e realizado de forma intensa nos anos que se seguiram à descoberta. Houve inclusive a participação de uma equipe brasileira, que em duas temporadas ajudou nas escavações . Um dos blocos retirados de Futalognkosaurus dukei pesava nada menos do que 15 toneladas – um verdadeiro recorde!

Uma vez que toda área revelou ser tremendamente fossilífera, Jorge Calvo e sua equipe instalaram na região o Centro Paleontológico Lago Barreales (CePaLB). Este é um dos poucos centros destinados à pesquisa de fósseis localizados exatamente no local onde esse material é encontrado. Com isso, as atividades de escavação podem ser mantidas ao longo de todo o ano e os entusiasmados pela paleontologia podem vivenciar a atividade de um pesquisador de fósseis. Existe, inclusive, um projeto para se construir um museu nas imediações.

Hoje se sabe que o  Futalognkosaurus dukei é o mais completo dos dinossauros ditos “gigantes” encontrados até hoje, tendo atingido entre 32 e 34 metros de comprimento. Foram coletados desde a primeira vértebra do pescoço até a primeira vértebra caudal, além da pélvis. Porém, é bem possível que outros ossos desse mesmo dinossauro ainda estejam enterrados no solo e venham a ser encontrados no futuro, uma vez que os trabalhos não acabaram. O novo dinossauro é um titanossauro – herbívoro de grande porte – e pertence a uma linhagem distinta, que recebeu o nome de Lognkosauria.

Além dos ossos do dinossauro gigante, foram encontrados na mesma região até hoje cerca de mil fósseis. São restos de moluscos, plantas, peixes – os primeiros da região –, pelo menos duas espécies de crocodilomorfos e vários grupos de dinossauros (saurópodes, terópodes, ornitópodes). Até um pterossauro – réptil alado – foi encontrado ali.

Precisão sem precedentes
Como a grande maioria dos fósseis estava concentrada em uma área de 400 m 2 em uma camada de meio metro, é razoável supor que esses organismos representam espécies que formavam uma comunidade, permitindo a reconstrução de um ecossistema do Cretáceo Superior com uma precisão nunca antes registrada.

Destaque especial cabe às folhas, que indicam a predominância de angiospermas (grupo no qual são classificadas todas as plantas modernas) sobre gimnospermas, e sugerem que as primeiras formavam a base da dieta alimentar do Futalognkosaurus dukei e possivelmente também de outros dinossauros herbívoros da região.

Até o presente momento, não se tem notícia de nenhum depósito do Cretáceo Superior que reúna tamanha diversidade de animais concentrados em um mesmo ponto, como foi revelado pelas escavações feitas às margens do Lago Barreales.

Além da importância científica do achado, vale a pena destacar o sucesso de uma parceria entre a iniciativa privada e uma atividade científica. Graças a essa associação, foi possível a produção de um resultado tão importante em relativamente pouco tempo. E ainda há muito mais para ser descoberto em Los Barreales…  

Alexander Kellner
Museu Nacional / UFRJ
Academia Brasileira de Ciências
15/10/2007

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Paleocurtas
As últimas do mundo da paleontologia

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Pesquisadores norte-americanos descreveram um novo dinossauro encontrado no estado de Utah. Chamada de Gryposaurus monumentensis , a espécie pertence ao grupo dos hadrossauros, que eram animais extremamente bem adaptados para se alimentar de plantas. O material encontrado por Terry Gates e Scott Sampson, do Museu de História Natural de Utah, é proveniente da Formação Kaiparowits, com aproximadamente 73 milhões de anos de idade, e amplia o registro geológico do gênero Gryposaurus em cerca de cinco milhões de anos. O trabalho foi publicado no Zoological Journal of the Linnean Society
Os paleontólogos argentinos Bernardo Riga e Ricardo Astini acabam de publicar no Journal of South American Earth Sciences um estudo detalhado do depósito fossilífero situado em Arroya Seco (Mendoza, Argentina) onde foram encontrados vários restos do dinossauro titanossaurídeo Mendozasaurus neguyelap . Eles analisaram os fósseis sob diversos aspectos e obtiveram dados sobre a exposição do material antes de ser fossilizado e as deformações sofridas pelos ossos após serem soterrados. O estudo, pioneiro na América do Sul, resultou em um novo modelo para a formação de depósitos fossilíferos e poderá auxiliar na descoberta de áreas com grande acumulação de fósseis. 
O Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul inaugurou a exposição Dinossauros: ciência e ficção . Com duração até 4 de maio de 2008, a mostra procura apresentar detalhes sobre a origem e extinção dos dinossauros. Entre as peças principais, está uma reconstituição de uma “luta pela vida” entre dois dinossauros encontrados na Mongólia. O museu se localiza na Rua Dr. Salvador França, 1427, Jardim Botânico – Porto Alegre/RS.
Um lembrete para os interessados por paleontologia: de 21 a 26 de outubro será realizado em Búzios, Rio de Janeiro, o XX Congresso Brasileiro de Paleontologia . Realizado a cada dois anos, o evento representa a ocasião em que os pesquisadores brasileiros apresentam os mais novos resultados de suas pesquisas.
Uma análise da microestrutura do esmalte dentário de cinodontes (grupo do qual fazem parte os mamíferos) foi publicada na Revista Brasileira de Paleontologia . Os autores são os pesquisadores Fernando Abdala, da Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo (África do Sul), e Maria Claudia Malabarba, da PUC do Rio Grande do Sul. Eles utilizaram formas pertencentes ao gênero Exaeretodon  encontradas no Brasil e na Argentina em rochas do Triássico Superior (~ 215 milhões de anos). O estudo contribui para melhor caracterizar a microestrutura de um grupo especial de cinodontes, os Traversodontidae, muito abundantes naquele tempo.
Acaba de prorrogada por mais 30 dias a exposição Sáurios – modelos de sucesso da evolução . Organizada pelo Museu Municipal de História Natural de Stuttgart , na Alemanha, a mostra exibe não apenas dinossauros, mas também uma grande diversidade de organismos que viveram no sul da Alemanha, sobretudo durante o Jurássico. Com um orçamento de 2 milhões de euros e a área da exposição de aproximadamente 2000 m 2 , a mostra atraiu 280 mil visitantes em seis meses.