Os mamutes lanudos ( Mammuthus primigenius ) viveram nas regiões frias da América do Norte, Europa e Ásia (arte: Museus Nacionais da Escócia).
Ao lado dos dinossauros, os mamutes estão entre os animais extintos que mais mexem com o imaginário popular. Esses paquidermes me fascinam desde a infância, quando eu gostava de passear no zoológico de Belo Horizonte e ver seus parentes atuais, os elefantes africanos. Ultimamente, uma grande quantidade de descobertas científicas têm tornado os mamutes os animais pré-históricos mais conhecidos pela ciência.
Os antepassados das quatro espécies conhecidas de mamutes surgiram na África há 4,8 milhões de anos e posteriormente se dispersaram para a Europa, América do Norte e Ásia. Nas regiões frias desses continentes, esses mamíferos eram ornados com uma pelagem abundante e longa (em torno de 50 cm) – por isso, foram denominados mamutes lanudos ( Mammuthus primigenius ).
Apesar de terem se originado na África, os mamutes têm um parentesco maior com os elefantes indianos do que com seus primos africanos, como mostrou o seqüenciamento do DNA mitocondrial desses proboscídeos, finalizado em dezembro de 2005 por uma equipe comandada por Michael Hofreiter, do Instituto Max Planck em Leipzig (Alemanha). Isso acontece porque a divergência entre as linhagens de elefantes indianos e africanos só ocorreu entre 5,5 e 6,3 milhões de anos atrás.
Apesar do grande sucesso dos mamutes lanudos, que chegaram a alcançar uma densidade populacional bastante elevada, esses paquidermes se extinguiram ao final da última era glacial, há cerca de 11 mil anos, durante o Plestoceno, embora alguns relatos afirmem que os últimos mamutes resistiram até 3500 anos atrás em regiões isoladas.
Representação de um mamute encontrada na caverna de Lascaux, no sudoeste da França. As pinturas rupestres da caverna são datadas entre 18 mil e 15 mil anos atrás (foto: Universidade de Aberdeen).
As razões para a reviravolta na história desses animais são controversas. A maioria dos autores cita as mudanças climáticas como o principal fator responsável pelo desaparecimento dos mamutes – uma triste jornada em direção à extinção que foi retratada no filme A era do gelo 2 . Contudo, alguns pesquisadores afirmam que doenças ou a pressão de caça exercida por nossos antepassados pode ter, pelo menos, acelerado o ocaso desses animais (vou encerrando por aqui essa minha descrição paleontológica, para evitar que o Alexander Kellner puxe minha orelha caso eu fale alguma besteira!).
De volta à vida?
Os mamutes andam em evidência nos últimos tempos, pois diversos grupos de pesquisa têm se empenhado em desenvolver estratégias para “revivê-los”. Mas não espere ver esses cientistas extraindo DNA de pernilongos pré-históricos preservados em âmbar como no filme Jurassic Park . O material genético dos mamutes tem sido recuperado de fontes tão surpreendentes quanto essa e que contribuem para que esses animais sejam mais bem conhecidos.
Diferentemente do que acontece com a maioria dos animais extintos, as informações sobre a biologia dos mamutes têm sido obtidas diretamente a partir de tecidos preservados. Esse material é obtido de cadáveres desses animais conservados praticamente intactos sob o gelo da Sibéria. Um exemplo disso foi o relato feito em maio deste ano por grupos de pescadores de Novoselovo, no norte da Rússia, que encontraram uma carcaça bastante preservada de um mamute após o degelo causado por uma enchente.
Os cientistas estimam que um grande número de corpos ainda esteja por ser descoberto sob o gelo eterno da Sibéria. Historicamente, essas carcaças têm sido utilizadas como alimento por alguns habitantes dessa região inóspita. Conta-se inclusive que elas foram consumidas pelo exército russo durante a campanha contra as tropas de Napoleão Bonaparte (apesar de fontes afirmarem que a carne estava putrefata e que foi devorada apenas por cães). Além disso, as longas presas desses animais (com até 1,8 metro) têm sido comercializadas há milhares de anos por mercadores siberianos.
Reconstituição do esqueleto de um mamute (foto: J.C. Outrequin).
Uma das alternativas cogitadas para a clonagem desses animais consiste na retirada de óvulos e/ou espermatozóides de mamutes, que poderia levar à fertilização in vitro
e à gestação em fêmeas de elefante indiano que, assim, seriam empregadas como “barrigas de aluguel”. Contudo, isso depende de se encontrar gametas femininos e masculinos viáveis desses animais pré-históricos. Se forem encontrados apenas espermatozóides viáveis, poderia se tentar produzir um animal híbrido entre mamute e elefantes indianos. Cruzamentos selecionados poderiam posteriormente restabelecer algumas características genéticas dos mamutes.
Equipes de pesquisadores da Universidade de Kinki (Japão) e do Centro Viktor de Pesquisas em Virologia (Rússia) têm também tentado o isolamento do DNA de mamutes e a sua introdução (por transferência nuclear somática) em gametas anucleados de elefantes indianos. Porém, a degradação do material genético desses paquidermes, aliada às condições inadequadas de preservação, faz com que a maior parte do DNA das amostras coletadas esteja fragmentado, sendo assim inadequado para a essas tentativas de clonagem.
Desse modo, a clonagem dos mamutes continuará inviável até que um golpe de sorte mude tudo e esses animais possam ser “revividos” à semelhança do que ocorreu com o com o gauro indiano, primo dos búfalos ameaçado de extinção que foi clonado no ventre de uma vaca há seis anos.
O mais provável, no entanto, é que consigamos ter acesso apenas a alguns genes dos mamutes que tenham sido, por sorte, preservados após milhares de anos, e não a seu genoma integral. Assim, embora esses magníficos animais não possam provavelmente reviver como os dinossauros de Jurassic Park
, os cientistas terão acesso em seus tubos de ensaio a algumas das proteínas produzidas em suas células, que podem ser o começo de um “Parque Pleistocênico” molecular.
Jerry Carvalho Borges
Colunista da CH On-line
01/12/2006
SUGESTÕES PARA LEITURA
Artigos relacionados a esta coluna no blog Aventuras da Ciência ( http://aventurasdaciencia.blogspot.com ): “Extinções no Pleistoceno: nossos primeiros crimes?” e “Noé no olho do furacão”.
Cooper, A. (2006). The year of the mammoth. PLoS Biol . 4, e78.
Rogaev, E.I. et al. (2006). Complete mitochondrial genome and phylogeny of Pleistocene Mammoth Mammuthus primigenius . PLoS. Biol . 4, e73.
Cook, C.E., Jr., Sher, A.V., Baryshnikov, G.F., Lister, A.M. (1994). DNA from ancient mammoth bones. Nature 370, 333-334.