Descobertas paleontológicas recentes têm surpreendido tanto o público geral quanto os pesquisadores da área. Foram encontrados em alguns fósseis de dinossauros – que não voavam – penas bem diferentes das que encontramos nas aves hoje em dia. Esses achados podem mudar o que sabemos sobre essas estruturas.
Uma dessas descobertas foi publicada na PNAS pela equipe de Uwe Bergmann, do laboratório de radiação síncrotron de Stanford, na Califórnia (EUA). A base para o artigo foi o exemplar de Archaeopteryx, que está no Centro de Dinossauros de Wyoming, nos Estados Unidos. Essa ave é tida como uma das mais primitivas que existiram.
Os pesquisadores empregaram equipamentos de última geração para a análise química dos fósseis e puderam determinar que as penas preservadas nesse exemplar não eram somente impressões, como se supunha.
Além das marcas que permaneceram indicando a sua existência passada, havia ainda material modificado da estrutura original. Ou seja, existia matéria onde se viam as penas, e tratava-se de algo com uma composição bem diferente da rocha onde o esqueleto está preservado. E isso em um fóssil de 160 milhões de anos!
Pelo que consta, esta é a primeira vez que uma análise química tão detalhada é feita em um exemplar de ave primitiva. Além da importância dos resultados, o trabalho de Bergmann e colegas abre a perspectiva para o emprego de técnicas e equipamentos sofisticados para entender o grau de preservação de tecidos ‘moles’.
Com essas técnicas, deve ser possível, no futuro, encontrar detalhes de estruturas que nem sequer se sabia estarem lá – e não apenas em aves primitivas. Novamente, uma demonstração de que o paleontólogo moderno não fica apenas debruçado sobre fósseis empoeirados…
Penas da China
Sensacional também foi o achado feito – mais uma vez – em terrenos chineses. Como já mencionado em diversas colunas anteriores, a região de Liaoning, na China – mais especificamente, os depósitos de 125 milhões de anos denominados Formação Yixian – continua surpreendendo pela excepcional qualidade de preservação dos seus fósseis.
Desta vez, foram encontrados dois exemplares de um dinossauro chamado de Similicaudipteryx – um oviraptorossauro descrito em 2008. A equipe coordenada por Xing Xu,do Instituto de Paleontologia de Vertebrados e Paleoantropologia de Pequim, concluiu, com base no grau de fusão de seus ossos, que os novos fósseis representam dois indivíduos juvenis. O menor, com um fêmur de 38 mm, seria bem jovem; o maior, com fêmur de 140 mm, já seria, digamos, um ‘adolescente’, prestes a virar adulto.
Ambos possuem estruturas preservadas em diferentes partes do corpo que podem ser identificadas como penas, apesar de diferirem em sua construção. Na forma mais jovem e de menor tamanho, as penas têm um aspecto mais compacto, pouco ramificado e com largas bandas (onde se imaginaria ver as barbas).
Já as do indivíduo mais velho e maior lembram plumas, e são mais ramificadas. A diferença na forma das penas sugere que o Similicaudipteryx teria pelo menos duas mudas de penas ao longo de seu desenvolvimento.
Aproveitando esses novos exemplares, Xu e seus colegas reviram tudo o que se conhecia sobre penas fossilizadas e chegaram à conclusão de que, no passado, existiram diversos tipos que não são encontradas nas aves atuais. Essa variedade incluía desde estruturas mais simples até algumas mais complexas. Não é à toa que o estudo acaba de ser publicado na Nature e teve repercussão mundial.
Pena ancestral
Baseando-se nessas novas descobertas, a hipótese mais aceita para a evolução das penas defende que, em dado momento, um dinossauro desenvolveu uma estrutura bem simples, filamentosa, que seria a ‘ancestral’ de todas as penas. Essa estrutura foi se modificando, tornando-se mais espessa e ganhando ramificações, até chegar às penas das aves atuais.
À medida que evoluíram, as penas ganharam novas funções. Inicialmente, acredita-se que essas estruturas tenham servido para diferenciar uma espécie da outra e desempenhado papel de isolamento térmico, ajudando o organismo a reter calor. Com o tempo, porém, a estrutura se modificou para auxiliar no voo.
Mas é importante frisar que os principais tipos de penas encontrados em aves recentes também estão presentes em aves primitivas, assim como em alguns dinossauros. Até no Brasil já foram encontradas penas fossilizadas, algumas mostrando um padrão de cor.
De qualquer forma, ainda faltam pedaços para completar esse enorme quebra-cabeças. Porém, com descobertas como as que estão sendo feitas na China e Alemanha (e também no Brasil), os pesquisadores vão aprendendo um pouco mais sobre como os dinossauros aprenderam a voar.
Quando falamos em ‘penas’, a maioria das pessoas não tem dúvida do que queremos dizer: são estruturas que revestem o corpo das aves. Basta olhar para um tucano, um sabiá ou mesmo uma galinha.
A forma de uma pena padrão também não causa muito espanto. Ela é composta por uma base oca, chamada de cálamo – trata-se da região em que a pena se conecta com a pele da ave. De lá sai a raque, o eixo central que dá origem a ramificações laterais, as barbas. Estas, por sua vez, possuem pequenas ramificações – as bárbulas.
Em se tratando de diversidade dessas estruturas, porém, a surpresa pode ser maior. Isso porque, dependendo da posição e da função, as penas podem assumir formas bem diferentes, todas elas bem distintas umas das outras.
Alexander Kellner
Museu Nacional/ UFRJ
Academia Brasileira de Ciências
Paleocurtas
As últimas do mundo da paleontologia
(clique nos links sublinhados para mais detalhes)
Foi um sucesso o lançamento do livro Mistério sob o gelo (Editora Rocco) no dia 29 de abril na Livraria da Travessa do Shopping Leblon! O colunista agradece aos leitores que puderam participar e aproveita para informar que a exposição Fósseis do continente gelado – o Museu Nacional na Antártica (no qual o livro é baseado) foi prorrogada para o segundo semestre deste ano. A mostra continua em cartaz no Museu Nacional da UFRJ (Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro). Em breve a CH On-line publicará uma resenha do livro.
Um novo dinossauro argentino foi descrito pela equipe de Martín Ezcurra, do Museo Argentino de Ciencias Naturales Bernardino Rivadavia, em Buenos Aires. Chamada de Austrocheirus isasii, a nova espécie foi encontrada em rochas com 70 milhões de anos. Ela surpreendeu por ser um Abelisauroidea que, ao contrário dos demais membros do grupo, possui os membros anteriores alongados. O estudo, publicado na Zootaxa, também sugere que a redução dos membros anteriores, tão marcantes no grupo, não está diretamente relacionada ao tamanho das formas, como havia sido sugerido anteriormente.
Acaba se ser lançado o livro Parques nacionais do Sul – cânions e cataratas, organizado pelo colega Wilson Teixeira (USP, São Paulo). Procurando reunir belíssimas fotos com informações científicas, a obra – a quarta da coleção Tempos do Brasil – possibilita aos interessados pela evolução do nosso planeta entender como se formaram algumas das mais belas paisagens de diversos parques nacionais brasileiros.
O Museu Field, em Chicago, foi o anfitrião do terceiro simpósio da preparação de fósseis e coleções paleontológicas. O evento, que teve como objetivo discutir problemas vinculados a preparação de fósseis e como os mesmos devem ser armazenados e protegidos para gerações futuras, contou com a participação dos principais técnicos e preparadores em atividade na América do Norte. Um encontro assim seria muito interessante também em nosso país: fica a dica para a Sociedade Brasileira de Paleontologia.
Outro evento importante deste ano é o Simpósio Latino-americano de Icnologia. Nessa reunião científica internacional, que será realizada de 30 de outubro a 7 de novembro na Unisinos, em São Leopoldo (RS), pesquisadores de todo mundo se reunirão para apresentar novas descobertas. Os temas tratados irão de pegadas de dinossauros a marcas de invertebrados preservados nas rochas, passando pela contribuição desses estudos para diversas áreas, inclusive na indústria do petróleo. Mais informações na página da Sociedade Brasileira de Paleontologia.
O colega Diogenes de Almeida Campos, diretor do Museu de Ciências da Terra (Urca, Rio de Janeiro) do DNPM, acaba de receber a medalha “Mérito da Personalidade Mineral”. A láurea, instituída em 2009, visa reconhecer o trabalho realizado por servidores públicos do DNPM pelos serviços prestados para o desenvolvimento da mineração brasileira. Entre as principais contribuições de Diógenes para o setor, estão várias iniciativas com o objetivo de proteger os depósitos fossilíferos brasileiros.