Pés inchados, dormentes e com formigamentos; feridas nos pés e pernas que podem levar à amputação. Esses problemas podem estar ligados à síndrome do pé diabético, complicação causada pelo diabetes melito, doença caracterizada por uma deficiência do hormônio insulina no organismo. Além da falta de informação sobre o problema, os doentes enfrentam outro obstáculo: podem ser obrigados a desembolsar até R$ 500,00 para comprar calçados especiais, mais confortáveis e fundamentais para prevenir as complicações associadas à síndrome.
Pensando em uma forma de proteger os pés dos portadores da síndrome e tornar os calçados acessíveis, a fisioterapeuta Lígia Loiola, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concebeu um modelo econômico, com preço de custo médio de R$ 60,00. Os protótipos foram desenvolvidos como parte de seu doutorado, concluído em 2005.
Após oito meses de desenvolvimento de dois protótipos, foram produzidos 200 pares de calçados, em parceria com o Senai do Rio Grande do Sul. Eles foram testados em diabéticos em um posto de saúde de Porto Alegre. Para se adequar às medidas dos pés dos pacientes, foram feitas três larguras para cada número. A pesquisadora utilizou o couro em sua fabricação, escolhido por ser um material natural com boa capacidade termorreguladora, além de palmilhas e solados adequados para proporcionar uma caminhada segura e fácil, com menor risco de lesões nos pés.
A experiência, que durou três anos, foi um sucesso: houve pouquíssimos casos de rejeição e nenhum ferimento foi registrado. O tratamento dos pés não foi o único benefício: os voluntários também ganharam auto-estima. Lígia afirma que a preocupação em criar um modelo aberto e outro fechado foi fundamental para a utilização dos calçados: “Com mais opções, muitos passaram a cuidar mais da aparência e a se vestir melhor”.
A síndrome do pé diabético
O “pé diabético” é conseqüência da evolução do diabetes no organismo. Após 10 anos com a doença, incurável, fatores como a neuropatia (perda de sensibilidade nos pés) favorecem o surgimento de deformações e machucados que podem levar a um quadro mais grave, quando associados a problemas vasculares e infecções. O tratamento desse mal foi apontado em 2005 como uma das prioridades do Ministério da Saúde, já que o diabetes atinge 10% da população brasileira com mais de 40 anos.
A melhor estratégia de combate é detectar o risco. “O diabetes é uma doença silenciosa”, conta Lígia. “É difícil saber há quanto tempo existe o problema e, portanto, prever as chances de surgimento de complicações nos pés.” O ideal é que os médicos informem os diabéticos e seus familiares e avaliem regularmente os pés dos pacientes em busca de indícios: “Com a perda da sensibilidade, a pessoa se machuca sem perceber e só relata o problema quando a situação é muito grave, irreversível”, explica a pesquisadora.
Ao término do doutorado de Lígia, essa iniciativa pioneira teve de ser interrompida. A pesquisadora lamenta a falta de financiamento para aprimorar a produção dos calçados e disponibilizá-los comercialmente no Brasil: “Infelizmente, as grandes empresas do setor não têm interesse em investir em pesquisa tecnológica, e as pequenas não têm recursos”. No entanto, a busca por apoio continua. “Basta encontrar uma empresa que já esteja no ramo dos calçados, que possa contribuir com sua estrutura de produção para levar adiante essa iniciativa em parceria com a UFMG.”
Enquanto a sonhada parceria não vem, Lígia alerta para o erro que os pacientes costumam cometer ao comprar sapatos de numeração maior para adequar às medidas dos pés, afetadas pelo inchaço e pelas deformidades: enquanto números menores apertam os pés e causam lesões, números maiores deixam o pé solto dentro do sapato, o que pode provocar atrito e levar às mesmas lesões. “O ideal é buscar modelos com medidas adequadas à altura, largura e comprimento dos seus pés, sem costuras internas ou adereços que possam machucar os pés”, ensina a fisioterapeuta.
Simone Evangelista
Especial para a CH On-line
06/02/2006
Especial para a CH On-line
06/02/2006