Decodificar para combater

A esquistossomose do aparelho urinário, causada pelo Schistossoma haematobium, é uma das mais perigosas formas da doença, podendo evoluir para o câncer de bexiga e até mesmo facilitar a contaminação pelo vírus HIV. A boa notícia é que o genoma do parasita acaba de ser sequenciado, abrindo caminho para novas pesquisas e medicamentos mais eficazes.

Pesquisadores de consórcio internacional que inclui cientistas australianos, chineses e brasileiros utilizaram um par de vermes femininos do S. haematobium e tecnologia de última geração para realizar o sequenciamento.

“Embora digamos que todo o genoma foi identificado, ele ainda contém gaps ou falhas”

A partir das sequências geradas, produziram o genoma do parasita em duas etapas. Na primeira, fizeram uma montagem incluindo todas as sequências. Em seguida, realizaram montagens locais para ligar os fragmentos gerados na primeira rodada. Depois, compararam o material com os genomas já disponíveis do S. mansoni e do S. japonicum, outros dois parasitas causadores da esquistossomose e similares ao S. haematobium.

“Embora digamos que todo o genoma foi identificado, ele ainda contém gaps ou falhas”, explica Guilherme Oliveira, biologista molecular da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Belo Horizonte e coautor do estudo, publicado na edição atual da revista Nature Genetics.

Tão importante quanto decifrar o genoma da espécie, é levar em conta a expressão dos genes em todas as suas fases de vida – a larval, de verme adulto e de ovo. A equipe analisou os diversos genes expressos em cada um desses estágios. “Não adianta termos um alvo para novas drogas se o gene não é expresso e a proteína produzida na fase de vida de interesse”, ressalta Oliveira, lembrando que os estágios em que a espécie deve ser atacada são o larval e o de verme adulto.

Formas adultas do Schistosoma mansoni
Formas adultas do ‘Schistosoma mansoni’, parasita causador da esquistossomose, presente na América do Sul, inclusive no Brasil, e na África. Par de macho e fêmea na esquerda, fêmea ao centro e macho à direita. (foto: Wikimedia Commons)

Remédio único

“O sequenciamento do genoma é a apenas o começo”, garante o biologista molecular. Atualmente, o único tratamento conhecido contra a esquistossomose é o comprimido praziquantel. “Com essa pesquisa procuramos encontrar novos medicamentos, já que se a população adquirir resistência a essa droga, estaremos sem nada.”

Procuramos encontrar novos medicamentos, já que se a população adquirir resistência ao praziquantel, estaremos sem nada

Além disso, com os genomas dos maiores causadores da esquistossomose – o S. mansoni, o S. japonicum e S. haematobium – decifrados, pretende-se agora gerar um amplo material para a produção de medicamentos eficientes contra as três espécies de importância médica.

O genoma dos três parasitas responsáveis pela disseminação da doença pode ser acessado no banco de dados disponibilizado pelo grupo de pesquisadores por meio do site do Centro de Excelência em Bioinformática da Fiocruz.


Ana Carolina Correia
Ciência Hoje On-line