Descoberto maior primo conhecido

 Embora não saibam apontar ao certo a aplicação prática dessa descoberta, matemáticos ao redor do mundo comemoraram a identificação de um número primo com 6.320.430 dígitos, o maior conhecido até hoje e apenas o quadragésimo primo de Mersenne. O responsável pela novidade é Michael Shafer, um estudante de pós-graduação em engenharia química da Universidade de Michigan (EUA), um dos 60 mil voluntários que fazem parte do projeto Gimps (sigla em inglês para Grande Busca na Internet por Primos de Mersenne).

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Michael Shafer ao lado do computador que identificou o maior primo conhecido (foto: Michigan State University)

 

Os primos são números positivos inteiros divisíveis apenas por um e por eles mesmos. Embora sejam estudados desde a Grécia Antiga, até hoje matemáticos não entendem como são distribuídos. Já que não é possível saber previamente se um número é primo, vários projetos testam o universo numérico em busca de novos exemplos: o Gimps é um deles.

Esse projeto lança mão de uma rede de 211 mil computadores, que funcionam como uma supermáquina capaz de nove trilhões de cálculos por segundo — ela fez em dois anos o que um PC comum levaria 25 mil anos. O Gimps busca especificamente primos de Mersenne, um tipo raro de primo expresso pela fórmula 2 p – 1, na qual p também é primo. O novo número pode ser representado como 2 20.996.011 – 1 (escrito por extenso, ele ocuparia 1087 páginas de tamanho A4, sem margem).

 

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O monge francês Marin Mersenne (1588-1648) foi o primeiro a se interessar pela classe de números primos que hoje leva seu nome

Mas o que leva alguém a integrar o projeto? Alguns por curiosidade matemática, outros por um lugar na história. Mas pelo visto a fama não subiu à cabeça de Shafer. Questionado pela imprensa sobre a descoberta, ele reconhece que ela não irá revolucionar a matemática. “O crédito é meu e daqueles que desenvolveram o software. Qualquer um poderia ter achado o número.”

 

O estudante se refere ao fato de qualquer um poder participar do projeto. Basta acessar seu site e baixar de graça o programa responsável pelos testes. “O software funciona sozinho e não afeta a eficiência do computador. Faço meus trabalhos e contribuo para o Gimps ao mesmo tempo”. Assim, o crédito da descoberta talvez não seja do estudante, mas do seu PC Pentium 4 Dell Dimension de 2GHz.

Há ainda outro motivo: um prêmio de US$ 100 mil é oferecido pela fundação norte-americana Eletronic Frontier a quem encontrar o primeiro primo com dez milhões de dígitos. O Gimps ganhou o último prêmio oferecido pela entidade, no valor de US$ 50 mil, pela descoberta do primeiro primo com um milhão de dígitos.

Mas talvez a melhor razão para se voluntariar seja testar o potencial do próprio computador. Especialistas afirmam que o único dado relevante dessa descoberta é ser um bom exemplo do que os computadores modernos são capazes quando reunidos em torno de um só objetivo. “Um dia alguma pesquisa poderá usar essa tecnologia para algo mais relevante”, espera Shafer.

“Como é difícil descobrir tais números, novas técnicas são necessárias e elas, por sua vez, levam a desenvolvimentos surpreendentes e úteis”, explica o matemático Fábio Chalub. Mas, segundo ele, esse não é o motivo da excitação dos matemáticos. “Eles vêem uma beleza nas estruturas matemáticas que outras pessoas acham estranhas. A questão matemática passa a ter um valor dissociado do mundo real. Por isso muitos acham que fazem algo mais próximo da arte que da ciência.”

Rafael Barifouse
Ciência Hoje On-line
22/12/03