Mesmo que o salário mínimo tenha o objetivo de garantir a satisfação das necessidades básicas dos trabalhadores em alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte, eles sentem no bolso que seu aumento nas últimas décadas foi apenas simbólico. O poder de compra do brasileiro tem diminuído, apesar do aumento da média de seus anos de estudo.
Para analisar o impacto do salário mínimo e da escolaridade na desigualdade social brasileira, o economista Eduardo Rodrigues avaliou a distribuição salarial em 1981, 1988 e 1999 em sua dissertação de mestrado defendida na Universidade de São Paulo (USP). Os dados usados foram retirados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), feita pelo IBGE.
Foram considerados quatro fatores para explicar a distribuição salarial: valor do salário mínimo real (calculado a partir da quantidade de cestas básicas que ele é capaz de comprar); grau de escolaridade dos trabalhadores; características individuais como idade, sexo, região metropolitana etc.; e mudanças residuais que não podem ser explicadas.
Rodrigues comparou o peso relativo de cada fator sobre a distribuição salarial do país e somente os dois primeiros tiveram uma importância significativa no aumento da desigualdade social. As mudanças residuais tiveram um efeito contrário, ou seja, suavizaram o impacto negativo do efeito do salário mínimo e da escolaridade.
O estudo apontou que a queda do salário mínimo real entre 1981 e 1999 serviu para aumentar a dispersão salarial. O salário mínimo real caiu 23,6% entre 1981 e 1988, e 8,6% entre 1988 e 1999. “A partir de 1994 ele subiu em todos os anos, talvez hoje já tenha chegado ao nível de 1988, mas certamente ainda é pior que o de 1981”, disse Rodrigues. Foi possível observar também que essa queda afetou sobretudo aqueles que recebem pouco mais que um salário mínimo. O impacto da queda até se estende para os outros salários, mas é menor para quem ganha mais.
“Se os brasileiros tivessem o mesmo poder de compra do salário mínimo de 1981 em 1999, a distribuição de salários teria sido menos desigual”, diz o economista. Rodrigues ressalta ainda que outros estudos já tinham tirado conclusões similares, mas com métodos analíticos diferentes.
Segundo o índice de Gini (um dos parâmetros usados no estudo), o salário mínimo teve uma influência de 73,55% no aumento da dispersão salarial. Já o grau da escolaridade dos brasileiros (que passou de 5,37 anos em 1981 para 7,07 anos em 1999, segundo o IBGE) foi responsável por 55,94% desse aumento. As mudanças residuais não-explicadas, por outro lado, diminuíram a dispersão salarial (variação de -32,53%).
O aumento da escolaridade teve peso significativo porque as pessoas com mais anos de formação passaram a ganhar mais e a se distanciar em termos de salário das outras. Porém, segundo Rodrigues, esse quadro tende a mudar quando a escolaridade média do cidadão atinge sete anos, o que já é realidade no Brasil. “Estamos entrando no processo de inversão”, disse Rodrigues. “A tendência agora é diminuir a desigualdade salarial.”
Liza Albuquerque
Ciência Hoje On-line
19/11/03