Eletromagnetismo contra a depressão

 

O tratamento convencional da depressão é baseado em medicamentos e apoio psicológico. Porém, cerca de 30 % dos pacientes não reagem a esse tipo de abordagem. Na busca de uma solução para essas pessoas, o psiquiatra Raphael Boechat, professor da Universidade de Brasília (UnB), estudou, em seu doutorado, uma técnica recém-introduzida no Brasil, que combate a depressão por meio da estimulação magnética do cérebro. Os resultados mostraram efeitos positivos consideráveis no combate à doença, que deixam animados os cientistas quanto ao desenvolvimento de uma forma de tratamento da depressão menos agressiva ao corpo humano.

Caracterizada por sintomas como desânimo, apatia, alterações no sono e na alimentação, perda de desejo sexual, a depressão sempre existiu, mas só agora é encarada como uma enfermidade. Até hoje, os pacientes refratários ao tratamento convencional só tinham uma alternativa: a eletroconvulsoterapia – conhecida entre os leigos como eletrochoque –, método muito caro e desconfortável para o paciente.
 
Os cientistas descobriram que, durante o episódio depressivo, a atividade cerebral se desequilibra: a do lobo frontal esquerdo diminui, enquanto a do direito se mantém ou até aumenta. “Não se sabe qual é exatamente a relação disso com a depressão”, afirma Boechat. O novo tratamento pode utilizar aparelhos de baixa freqüência, que aumentam a atividade do lobo frontal esquerdo do cérebro, ou de alta freqüência, que diminui a atividade do lobo frontal direito e aumenta ligeiramente a do esquerdo.
 
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A estimulação magnética do cérebro é feita por meio de um dispositivo que gera uma corrente elétrica e um campo magnético. O dispositivo é aproximado da cabeça do paciente e estimula a atividade do cérebro (imagem: reprodução)

Boechat realizou testes com aparelhos de baixa freqüência em 17 pacientes que não respondiam satisfatoriamente ao tratamento convencional ou não toleravam os antidepressivos. Os pacientes foram divididos em dois grupos: um submetido à estimulação magnética em duas sessões semanais de sete minutos, durante um mês; e o outro em cinco sessões semanais com o mesmo tempo, por duas semanas. Onze dos pacientes deixaram de apresentar sintomas depressivos, com uma ligeira vantagem para o segundo grupo.

 
O aparelho, que já era utilizado na neurofisiologia, é formado por uma base, onde a energia elétrica é armazenada em capacitores, e por uma bobina, que é aproximada da cabeça dos pacientes, mais especificamente do lobo pré-frontal, área ligada às emoções. Quando a energia é liberada, gera um pulso elétrico de cerca de 300 microssegundos e um campo magnético 40 mil vezes mais intenso que o da Terra. Durante cada sessão da terapia, são emitidos cerca de 300 pulsos iguais a esse. Esse campo produz uma pequena corrente elétrica no cérebro, que afeta sua atividade, formada por impulsos elétricos entre os neurônios.
 
Embora os aparelhos de baixa freqüência, testados por Boechat, não tenham apresentado efeitos colaterais, os campos magnéticos de alta freqüência podem levar a crises convulsivas. O uso do aparelho se restringe ao ambiente ambulatorial, sob o comando de um profissional. Grávidas, pessoas com implantes metálicos cerebrais ou cardíacos e pacientes que sofram de outra doença neurológica não podem se submeter ao tratamento.
 
Hoje, a técnica já é utilizada em países como Canadá e Israel, conjugada ou não com o uso de medicamentos. “O tratamento ainda não deveria ser usado isoladamente”, ressalta Boechat. “Ele leva o paciente a sair da crise, mas é preciso utilizar remédios para acompanhamento, durante seis a doze meses após o episódio.”
 

Apesar de utilizada apenas em pacientes refratários, a terapia é vista pela comunidade científica como um primeiro passo para o desenvolvimento de um tratamento para a depressão menos agressivo ao corpo humano, sem a utilização de remédios. Com alterações de freqüência, intensidade e número de disparos, ela também começa a ser testada no combate a outras enfermidades, como mal de Parkinson e epilepsia.


Marcelo Garcia

Ciência Hoje On-line
04/08/05