Espécies invasoras ameaçam litoral do RJ

Apesar de belos e impressionantes, corais exóticos encontrados na Ilha Grande podem ser uma ameaça ao equilíbrio dos ecossistemas do litoral do Rio de Janeiro. Originários do oceano Pacífico, esses organismos foram trazidos por plataformas de petróleo e outras embarcações provavelmente na década de 1980 e disputam com as espécies nativas elementos primordiais para a sobrevivência, como espaço e alimento.

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As espécies invasoras identificadas em Ilha Grande: Tubastraea tagusensis (amarela) e T. coccinea (laranja). Foto: Joel Creed.

O alerta foi dado por pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que mantém um campus na ilha. Um grupo do Laboratório de Ecologia Marinha Bêntica da universidade identificou as espécies invasoras e deu início a pesquisas que poderão resultar em projetos de preservação de ecossistemas da região.

 

A presença desses corais ’estrangeiros’ não é novidade: eles já haviam sido observados por cientistas há cerca de 25 anos, mas só recentemente foi possível identificá-los com precisão. Com contribuições do pesquisador norte-americano Stephen Cairns, os biólogos Joel Creed e Alline Figueira de Paula, ambos do Laboratório de Ecologia Marinha Bêntica, reconheceram e descreveram as duas espécies invasoras encontradas na Ilha Grande. Ambas pertencem ao já conhecido gênero Tubastraea Tubastraea coccineae T. tagusensis

.

 

A descrição foi publicada em janeiro de 2004 na revista Bulletin of Marine Science

. Desde 2000, esses corais têm sido estudados por pesquisadores da Uerj orientados por Creed. Em estudo feito com a colaboração de pesquisadores do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a doutoranda Alline Figueira de Paula avaliou como e com que freqüência os organismos se reproduzem. Em estágio avançado, a pesquisa já começou a desvendar a biologia reprodutiva e a abrangência geográfica das espécies. Os resultados preliminares indicam que elas têm picos reprodutivos anuais, crescem em média 1 cm por ano e espalham-se muito rapidamente.

 

Em outra pesquisa em curso, ainda em fase inicial, o doutorando Bruno Lages estuda os efeitos nocivos dos corais sobre as espécies nativas, como a produção de compostos químicos tóxicos. “Primeiramente, é preciso conhecer esses organismos, saber como crescem e se reproduzem para poder entender e então conter o processo de expansão das espécies”, afirma Creed.

 

Espécies invasoras

De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), organismos invasores são a segunda maior causa de perda de biodiversidade, superados somente pela destruição direta de hábitats pela ação do homem. “Ao entrar em uma comunidade biológica, as espécies invasoras acirram a competição e transformam a sobrevivência dos organismos nativos numa tarefa muito mais difícil”, explica Creed. “O ambiente não está preparado para recebê-las e o desequilíbrio é inevitável. Não há, por exemplo, um predador para controlar o crescimento da população da espécie. Ela cresce indefinidamente e ocupa o espaço de outros organismos.”

Recuperar a região afetada, no entanto, parece impossível. A única forma de expulsar os corais seria retirá-los um a um, mas a alta densidade dos organismos ‐ até mil colônias por metro quadrado ‐ inviabiliza a operação. A quantidade assusta e ressalta a necessidade de um plano de prevenção: “Raramente há espaço vazio embaixo d’água. O local ocupado por esses corais era o nicho de outra espécie, que ainda não conhecemos”, conta Creed. “É preciso descobri-la para poder chegar aos próximos alvos de invasão antes dos corais.”

 

O pesquisador preocupa-se sobretudo com as áreas recifais, como o arquipélago dos Abrolhos, no litoral da Bahia, onde estão os mais importantes recifes brasileiros. Para ele, o país deveria investir mais na preservação do meio ambiente e desenvolver uma campanha nacional para evitar a invasão dessas e outras espécies. “Não há, no Brasil, uma preocupação especial com o trânsito de embarcações”, denuncia. “Elas circulam sem a menor fiscalização e deslocam-se entre os mais diferentes ecossistemas.”


Isabel Levy
Ciência Hoje On-line
07/12/04