Esperança no combate ao alcoolismo

Além de reduzir a vontade de ingerir álcool, a proteína GDNF é capaz de prevenir recaídas, comuns em tratamentos contra dependência, sem interferir em desejos normais.

Uma proteína conhecida como GDNF pode ser a chave para o desenvolvimento de uma nova droga para combater o alcoolismo. Seus efeitos no cérebro de ratos eliminam o desejo de consumir álcool, além de prevenir recaídas, comuns em tratamentos contra dependência. Como as áreas do cérebro que controlam o vício em homens e animais são similares, a proteína poderá ter o mesmo efeito em seres humanos.

Os efeitos da GDNF no cérebro em relação ao consumo de álcool são conhecidos desde 2005, mas é a primeira vez que a proteína se mostra capaz de impedir a recaída sem interferir em desejos normais. A pesquisa, liderada por Sebastien Carnicella, da Universidade da Califórnia em São Francisco (Estados Unidos), foi publicada esta semana na revista PNAS.

A equipe estudou a ação da GDNF na Área Tegmental Ventral (VTA, na sigla em inglês), região cerebral ligada ao vício. Ao injetar GDNF diretamente nessa área do cérebro de ratos anteriormente viciados em álcool, os pesquisadores observaram que a motivação para beber caiu de maneira significativa em apenas 10 minutos. Além disso, os efeitos duraram ao menos por mais três horas.

Prevenção de recaídas
Outro efeito significativo foi que os ratos não voltaram a sentir desejo por álcool e evitaram a reincidência depois da injeção, mesmo com o fácil acesso à bebida. “A GDNF é capaz de prevenir as recaídas, que são o maior problema em relação ao alcoolismo”, afirma Carnicella. E ressalta: “Cerca de 70% dos alcoólatras reincidem depois do tratamento.”

O estudo constatou ainda que a GDNF não bloqueia o desejo por outras substâncias prazerosas, problema gerado por outras drogas desenvolvidas para o tratamento do alcoolismo. Os pesquisadores ofereceram água com açúcar aos ratos logo após o tratamento com a proteína e verificaram que o consumo de açúcar pelos animais não foi alterado. Além disso, a proteína também não pareceu causar qualquer efeito secundário na química cerebral.

Eficácia sem efeitos colaterais
Segundo Carnicella, há poucos medicamentos no mercado para tratar o alcoolismo. “Além disso, eles atingem o resultado esperado em apenas uma pequena parcela das pessoas e muitas abandonam o tratamento por causa dos vários efeitos colaterais”, acrescenta.

Entre os efeitos não desejados dos medicamentos atuais está a redução da sensação de prazer, até mesmo por coisas que não causam vício, como comida ou açúcar. “Também há o problema de se reduzir o prazer em pacientes que podem estar deprimidos, pois é bastante comum a relação entre alcoolismo e depressão”, diz. “Nossos resultados indicam que a GDNF é mais seletiva e evita esses efeitos colaterais.”
Mas o pesquisador ressalta que ainda serão necessários alguns anos de pesquisa para que a GDNF possa dar origem a novos medicamentos. “Essa proteína é muito grande para circular na corrente sangüínea; logo, será impossível administrá-la oralmente em pílulas”, explica. “A estratégia mais adequada pode ser o desenvolvimento de compostos menores que estimulem a atividade da GDNF, que é produzida naturalmente pelo organismo, ou imitem seus efeitos sobre os receptores cerebrais”, aponta.

Igor Waltz
Ciência Hoje On-line
10/06/2008